Com onze anos de antecedência, já é possível prever que a safra de grãos brasileira de 2020 estará em situação vulnerável devido às alterações climáticas ocasionadas pelo aquecimento global. A estimativa de perdas financeiras para aquele ano é da ordem de R$ 7,4 bilhões, podendo chegar aos R$ 14 bilhões em 2070. A soja deve ser a cultura mais afetada, alcançando prejuízos de cerca de R$ 4 bilhões e perdas superiores a 20% na produção.

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Os dados são da pesquisa “Aquecimento Global e a Nova Geografia de Produção”, realizada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O estudo deixa claro que a agricultura, o aquecimento global e os danos que as mudanças climáticas devem causar na produção agrícola mundial compõem um importante ciclo de causas e efeitos relacionados. Além das perdas calculadas para a soja, o café terá uma redução de quase 10% de área em 12 anos, tornando inviável a sobrevivência na região sudeste, enquanto a mandioca pode desaparecer da região do semiárido.

Dessa forma, as mudanças climáticas devem projetar nova configuração da geografia agrícola do País. A região Sul, por exemplo, restrita a culturas adaptadas ao clima tropical por causa do alto risco de geadas, deverá experimentar uma redução desse evento extremo, tornando-se propícia ao plantio de mandioca, café e cana-de-açúcar, e não mais ao da soja, uma vez que a região deve ficar mais sujeita a estresses hídricos. E a cana-de-açúcar pode se espalhar pelo País a ponto de dobrar a área de ocorrência, passando dos atuais seis milhões para 17 milhões de hectares, rendendo R$ 27 bilhões mais que a safra de 2006.

Nesse cenário, que parece desolador, o Brasil ainda não está em risco, mas o modo de plantio precisa ser mudado. Algumas perdas podem ser inevitáveis, afinal, o País só agora começou a se atentar para a vulnerabilidade e ainda não tomou as atitudes para evitar os impactos. Se não forem tomadas ações para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e adaptar as culturas à nova situação, deve ocorrer uma migração de plantas para regiões em busca de condições climáticas favoráveis. Áreas que atualmente são as maiores produtoras de grãos podem não estar mais aptas ao plantio bem antes do fim deste século.

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Pesquisa

Para o pesquisador da Embrapa e autor do estudo, Eduardo Assad, o mais importante é investir em pesquisa. “Sem isso, não adianta querer mudar simplesmente de um local para outro. É preciso planejamento”, afirma. Pesquisas da Embrapa, de empresas estaduais de pesquisa e de universidades brasileiras vêm buscando soluções. Em termos de adaptação, variantes genéticas de soja, milho, feijão, café, mandioca e algumas frutas mais tolerantes às altas temperaturas e escassez de água estão sendo desenvolvidas em laboratório. Simultaneamente são pesquisadas medidas preventivas de mitigação do problema.

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Diversas práticas agrícolas conhecidas podem diminuir as emissões de carbono e aumentar o sequestro de gás da atmosfera, como a integração lavoura e pecuária, a utilização de sistemas agroflorestais e o plantio direto. A idéia é otimizar o solo e melhorar o manejo das culturas e das áreas de pastagens.

Eduardo Assad alerta que o objetivo do estudo é mostrar a vulnerabilidade do País. “Tudo está perdido? Não”, explica. “Fechar os olhos para isso é que não podemos, pois temos como evitar. Não teremos um p,roblema de segurança alimentar por irresponsabilidade.”

Biotecnologia será arma para adaptação

Uma das armas que devem ajudar o Brasil a enfrentar os efeitos do aquecimento global na agricultura durante as próximas décadas é a biotecnologia. É o que acredita o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Reinhold Stephanes, confiante na capacidade do setor de pesquisa, que já contribuiu para a expansão da fronteira agrícola, incorporando o cerrado brasileiro. Para o ministro, a adaptação de variedades, aliada ao melhor uso da água, é a chave para que o País conviva com os efeitos das mudanças climáticas e garanta o abastecimento de alimentos até o século 22. “Se o Brasil agir com inteligência, terá sua produção garantida neste século”, declara.

Stephanes encara a situação de maneira positiva. “O País tem condições de se adaptar ao problema porque está estudando o cenário”, comenta. Segundo o ministro, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) vem desenvolvendo estudos de adaptação genética nos quais as plantas se tornarão mais resistentes. Desta maneira, genes de plantas típicas do cerrado brasileiro poderão ser transferidos, permitindo que culturas como a da soja, por exemplo, sobrevivam longos períodos sem chuva.

O ministro da Agricultura acredita que as mudanças climáticas terão início no Sul do Brasil e que o Centro-Oeste não será atingido pelo aquecimento neste século, pois tem potencial para a irrigação. “No cerrado é possível até quadruplicar a produção, utilizando corretamente a água”, afirma. Ainda de acordo com Stephanes, o perfil da produção agrícola não sofrerá grandes mudanças pela alteração do clima, assim como o modelo das propriedades rurais. Mas ele prevê que será preciso desenvolver mais tecnologias para aumentar as variedades plantadas em áreas menores e com maior rendimento por unidade.