Rio e São Paulo  – Iniciado após a desvalorização cambial de 1999, o processo de substituição de importações cresceu nos últimos anos e, ainda que de forma desordenada, já beneficia vários setores da economia. Estudo inédito do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) identifica pelo menos 12 segmentos em que a queda contínua das importações mostra que as empresas estão trocando os produtos estrangeiros por nacionais.

No setor de bens de consumo, a substituição vem ocorrendo de forma generalizada. Entre os segmentos listados pelo Iedi estão o de papel e papelão, vestuário, calçados e alimentos como laticínios e carne bovina. No de bens intermediários, grande vilão da balança comercial, matérias-primas e insumos estratégicos começam a ser trocados por produção local. É o caso de minerais não-metálicos e metalúrgicos, fios têxteis e papel e celulose. Também houve queda firme nas importações de bens de capital.

O objetivo do estudo é analisar a variação da pauta de importações brasileiras desde 1995 e identificar os setores mais sensíveis à desvalorização de 1999. Mas, no fim, o instituto foi além, ao apontar ainda os gargalos para o processo de substituição de importações. O Iedi conclui que esse processo está esgotado no setor de bens de consumo -mais fácil de substituir por produção doméstica, dada a baixa exigência tecnológica. A exceção seria carros.

Nos setores de bens intermediários e de capital (exceto equipamentos eletrônicos), há perspectiva de maiores avanços, sem depender exclusivamente do câmbio. O estudo deixa clara a necessidade de investir e atrair empresas.

– A condição fundamental continua sendo a realização de investimentos, a atração de empresas globais e a execução de políticas setoriais – diz o diretor-executivo do Iedi, Júlio Gomes de Almeida.

Em outro estudo, o economista Fernando Barbosa, do BBV Banco, acredita que, mesmo com uma retomada da atividade em 2003, as importações não devem crescer tanto como em outros períodos de aceleração econômica. Ele trabalha com uma projeção de superávit da balança comercial de US$ 14 bilhões em 2003.

“Superávits ao redor de US$ 10 bilhões podem conviver com um crescimento doméstico maior, desde que se evite uma forte apreciação do câmbio real”, escreveu ele.

No setor de bens de capital, um dos primeiros a sentir a recuperação ou a queda de ritmo da economia, o movimento de substituição de importações também é forte. Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), as importações de bens de capital registraram queda de 13,5% de janeiro a setembro deste ano. Passaram de US$ 5,57 bilhões para US$ 4,82 bilhões. No mesmo período, a participação de máquinas e equipamentos nacionais no total das vendas internas foi de 55% para 61%.

– Os investidores não levam em conta apenas os preços, mas também o desempenho do equipamento – diz o presidente da Abimaq, Luiz Carlos Delben Leite.

Mais pessimista, o coordenador de análise econômica da FGV, Salomão Quadros, acha que a substituição de importações tende a ser um movimento passageiro, embalado pela desvalorização do câmbio.

– Vejo esses casos como um movimento efêmero – afirma Quadros, explicando que certos setores têm dificuldade de estabelecer uma produção em escala, de forma a atender aos pedidos das indústrias.

Luciana de Sá, economista da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), acredita que o processo de substituição de importações é lento:

– Por enquanto, não vimos nenhuma mudança estrutural, mas, sim, a uma reação à alta do câmbio – diz Luciana.

Matéria-prima obrigatória

A dependência da matéria-prima produzida no Brasil que também é exportada está obrigando a indústria brasileira a aceitar aumentos estratosféricos ou ficar sem o produto, o que acaba provocando desabastecimento. Para Walter Schalka, presidente da Dixie-Toga, gigante do setor de embalagens, a pressão maior vem das resinas plásticas, que subiram entre 40% e 50% este ano:

– A queda recente na cotação do dólar (3,46% em outubro) só evitará aumentos futuros. Para haver redução, só se a cotação voltar a R$ 3.

Segundo Schalka, a formação de preços, principalmente pelos fornecedores de papel e celulose, se baseia no valor que seria pago pelo produto importado. De janeiro a setembro, a celulose subiu 40,29%, pelo Índice de Preços do Atacado (IPA) da Fundação Getúlio Vargas.

– No valor para importação, eles descontam de 2% a 5% – conta Schalka.

Outra forma é adotar a cotação do produto no exterior (preço para exportação), aplicando-se os mesmos percentuais de desconto. No setor de resinas e filmes, segundo o executivo, os fornecedores adotam a mesma prática.

A indústria que utiliza aço e derivados na produção também foi atingida – e, conseqüentemente, o bolso do consumidor. No mercado internacional, a tonelada do aço passou de US$ 154 no início do ano para US$ 235 neste trimestre. Segundo o vice-presidente da GM, José Carlos Pinheiro Neto, a alta do aço foi um dos principais motivos para o reajuste de 4% a 5% nos automóveis. Este ano, as placas de aço comum subiram 56,27% pelo IPA.

Joaquim Vilaça, dono da Fornos Capital, viu a fatura quinzenal de suas compras de aço inoxidável passar de R$ 1.100 em maio para R$ 1.700 em outubro (alta de 35%):

– Mesmo produzindo no Brasil, aumentou desse jeito. A desculpa é sempre o dólar.

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