Foto: Agência Brasil |
![]() |
Lula com Jintao, na China: proteção de interesses. |
O governo brasileiro adota um peso e duas medidas quando a questão é criticar parceiros comerciais. Ao contrário do que tem feito em relação às barreiras americanas e européias ao comércio, o Brasil irá poupar a China de críticas. A partir de hoje, a Organização Mundial do Comércio (OMC) inicia a revisão da política comercial chinesa, em uma espécie de sabatina em que os governos terão a ocasião de criticar e questionar Pequim. Mas, por uma decisão política de Brasília, o Itamaraty já decidiu que não usará a oportunidade para atacar os chineses a fim de não criar atritos na relação bilateral. Representantes do setor privado não ficaram satisfeitos ao saber da atitude brasileira.
A revisão da política chinesa é a primeira desde que Pequim passou a fazer parte da OMC, há cinco anos. Para muitos diplomatas, essa será a chance de atacar Pequim e mostrar que o governo chinês nem sempre tem sido justo em suas práticas comerciais. Coincidentemente, a sabatina ocorre no momento em que o primeiro-ministro chinês, Hu Jintao, faz uma visita ao presidente americano George W. Bush para tratar de vários temas, inclusive contenciosos comerciais.
Um dos temas será a moeda chinesa, que diante da sua relação com o dólar, favorece as exportações de Pequim ao mercado mundial, contribuindo para o déficit de vários países. A OMC sugere em seu relatório sobre Pequim que a moeda local seja revista, o que contribuiria para um equilíbrio internacional.
Americanos e europeus concentrarão suas críticas na falta de transparência dos chineses, além do suposto dumping na venda de produtos como têxteis e calçados. A questão do respeito pela propriedade intelectual também será alvo de críticas dos países ricos. Americanos e europeus apontam que a pirataria na China está causando graves prejuízos às suas empresas e que Pequim precisa começar a aplicar as leis de patentes. Outro foco do ataque dos países ricos será as barreiras criadas pelos chineses para a importação de autopeças.
Apesar de todo o mundo concentrar suas críticas sobre a China, o Brasil optou por uma posição bem diferente. O governo usará a revisão da política de Pequim apenas para pedir esclarecimentos sobre alguns pontos específicos das leis comerciais do país. Alguns questionamentos serão feitos, como na questão fitossanitária. O País indicará que as práticas de Pequim não estão sendo satisfatórias. Mas temas explosivos, como a entrada da soja brasileira na China e a acusação de inundação do mercado nacional por alguns produtos de Pequim, ficarão de fora da agenda da reunião.
Questionado se o Brasil iria poupar a China, o embaixador do País na OMC, Clodoaldo Hugueney, desconversou. Os produtores de soja, por exemplo, querem que o governo levante o tema de um imposto de 13% que são obrigados a pagar para vender o produto no mercado chinês, enquanto os produtores locais são isentos da taxa. Para o Itamaraty, o Brasil conta com outros canais para tratar desses problemas e seria desnecessário ?lavar roupa suja? em público, ou seja, na presença de outros governos.
Mas, em Brasília, funcionários admitem que o motivo é outro. Um deles é o de não aparentar estar ao lado de americanos e europeus em um ataque a um país emergente. No ano passado, Pequim chegou a dizer que o Brasil promoveria uma ?traição? se atacasse as exportações chinesas de produtos têxteis.
Outro motivo é não criar um mal-estar com a China, um membro do G-20 (grupo de países emergentes), em um momento crucial das negociações da OMC. O debate sobre o processo de liberalização entra em sua fase decisiva e o Brasil quer o apoio dos chineses em sua luta contra os subsídios americanos e europeus à agricultura e para evitar que os países emergentes sejam obrigados a abrir seus mercados para produtos industriais.
Se a orientação é poupar a China, o mesmo não ocorreu há duas semanas, quando o Brasil atacou a política comercial americana. Além disso, na sabatina brasileira, nos últimos anos, nem americanos nem europeus têm poupado o País de críticas às altas barreiras para alguns produtos industriais, à falta de transparência em algumas práticas aduaneiras e até a subsídios ao açúcar.
