A chamada safrinha cresceu, foi batendo recordes, tornou-se uma supersafra que, pela primeira vez, beirou os 100 milhões de toneladas de milho. São tantos grãos que, quando se anda pelas principais regiões produtoras do Mato Grosso, é difícil não encontrá-los armazenados ao ar livre ou em silo bags – sacos feitos de um plástico especial – com até 90 metros de comprimento, nos quais o cereal pode ficar guardado por até um ano.

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O cenário não é novo, mas em Lucas do Rio Verde (MT), ele começa a mudar. Seis quilômetro depois da Preciosa, a estátua de uma galinha de 10 metros de altura, no trevo da rodovia MT-449 com a avenida da Fé, deverá ser inaugurada esta semana a primeira usina de etanol feito exclusivamente de milho do Brasil, a FS Bioenergia. Até então, o etanol de milho produzido no País saía de usinas flex, que fabricam tanto etanol de cana, quanto do grão.

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A fábrica da FS é apenas a primeira, do que promete se tornar uma alternativa importante para o beneficiamento e o escoamento de safras que tendem a ficar maiores. “Para nós, é ótimo”, diz Elso Pozzobon, 62 anos de idade, produtor e vice-presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja-MT). “Ainda temos potencial de produzir muito mais milho na região, sobretudo com o ganho de produtividade trazido pela integração de culturas.”

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Investimento estrangeiro

Joint venture entre a brasileira Fiagril e a gestora americana Summit Agricultural Group, a FS Bioenergia recebeu investimentos de R$ 450 milhões para ser erguida. Prevista para ser inaugurada na sexta-feira, ela produzirá 180 mil toneladas de farelo, 6 mil toneladas de óleo de milho e energia. Além, é claro, do etanol. Inicialmente serão 240 milhões de litros por ano, que consumirão 600 mil toneladas de milho. Essa capacidade pode ser duplicada.

Pouco, para as quase 30 milhões de toneladas produzidas apenas no Mato Grosso. Mas é expectativa é que ela não seja a única da FS Bioenergia – e muito provavelmente, nem de outros investidores interessados nesse tipo de combustível. Além da usina em Lucas do Rio Verde, a FS estaria planejando mais duas unidades, sendo que uma delas uma ficaria em Sinop (MT), de acordo com os produtores da região.

Os próprios agricultores também estão começando a estudar a possibilidade de se organizar para beneficiar o milho. “Temos discutido a viabilidade de investir numa usina, em nossa cooperativa”, afirma Pozzobon.

Essas iniciativas esparsas de empreendedores, porém, devem ganhar uma dimensão maior com as perspectivas criadas com o RenovaBio. O programa pretende aumentar a produção de biocombustíveis para atingir as metas de redução de emissão de poluentes, estabelecidas pela COP-21. Primeira iniciativa que juntou os ministérios da Agricultura, Energia e Meio Ambiente, o RenovaBio já passou por consulta pública e espera definições do governo. Não há uma previsão de data de lançamento.

Outro patamar

“Enquanto não houver um marco regulatório que estabeleça para onde vai a política energética, a expansão da produção (do etanol de milho) será localizada e feita por iniciativas individuais”, diz Marlon Arraes Jardim, coordenador geral do departamento de biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME). “Estamos exatamente discutindo essa política, para dar previsibilidade ao produtor, à indústria e ao investidor.”

Dar também uma perspectiva de ganho de escala, além de outros estímulos para a realização de investimentos. Deverão ser estabelecidos benefícios para os empreendimentos que tiverem menor pegada de carbono, ligados a instrumentos financeiros, ainda em discussão. Segundo Jardim, não estão previstos subsídios governamentais para o projeto.

“O RenovaBio não faz distinção em relação à origem da matéria-prima ou ao produto: se ele for biocombustível e tiver baixa pegada de carbono participará do programa”, diz ele. Quanto menor essa pegada, maior será esse benefício ainda em discussão.

“Sabemos que o etanol de milho na composição da oferta será inexorável”, afirma Jardim. “Ao contrário da cana, o milho pode ser estocado e há uma boa brecha para que esse tipo de combustível ganhe mercado na entressafra.”

Uma boa notícia para os produtores, já que a supersafra de 100 milhões deverá parecer pequena, no médio prazo. “Entre seis a oito anos, a expectativa é que a produção chegue a 200 milhões de toneladas”, diz Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro. “O preço na origem vai continuar baixo, criando uma grande oportunidade para o beneficiamento.”

Nas projeções da Datagro, a produção de etanol de milho, que na safra de 2015/2016 foi de 141 milhões de litros, chegará a 750 milhões de litros na colheita de 2018/2019. Pouquíssimo, quando comparado aos 24,7 bilhões de litros de etanol de cana de açúcar que devem ser produzidos na safra de 2017/2018, segundo a Única, entidade que representa os produtores. Mas a tendência é de alta.

“Tudo o que puder ser transformado em produto acabado será uma boa saída”, diz Carlos Simon, 54 anos, produtor e presidente do Sindicato Rural de Lucas do Rio Verde. “A produção tem crescido tanto que o preço só tem melhorado graças aos leilões do governo.”

Cortes

Exatamente por isso, os agricultores têm trabalhado para diminuir a produção no curto prazo. Segundo Pozzobon, a ideia é incentivar que os produtores a usar apenas as melhores áreas de suas propriedades e deixar sem cultivo as partes dos terrenos que precisam de mais investimento em adubação e correção de solo.

Quando as usinas de etanol de milho tornarem-se uma realidade, porém, ele poderão se beneficiar de ainda mais uma vantagem. Como na FS, elas também poderão produzir o DDGS, sigla em inglês para grãos secos por destilação. Com alto teor de proteína, esse subproduto beneficiado do grão é usado para ração animal e tende a criar uma oportunidade de diversificação.

Procuradas, a JS Bioenergia, a Summit Agricultural Group e a ICM, fornecedora dos equipamentos da fábrica, não concederam entrevista.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.