Brasil e Argentina devem negociar sem dólar

Foto: Agência Brasil

Guido Mantega: medida eliminaria parte da intermediação financeira e reduziria custos.

Brasil e Argentina pretendem eliminar a intermediação do dólar nas operações comerciais entre os dois países, que passaria a ser feita em reais e pesos. O anúncio foi feito ontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. A iniciativa teria o objetivo de fortalecer as moedas locais e, especialmente, aliviar a pressão dos ingressos de dólares resultantes do comércio bilateral nas taxas de câmbio de cada país. Ou seja, tenderia a conter os movimentos de valorização cambial.

A proposta de adoção dessa nova ?arquitetura financeira?, assegurou Mantega, foi apresentada durante a reunião de ministros de Economia do Mercosul, na manhã de ontem, e será analisada particularmente pelos dois sócios maiores. ?Essa medida seria boa porque eliminaria parte da intermediação financeira e reduziria os custos das operações comerciais. Também seria bom para a Argentina e o Brasil, que têm ingresso excessivo de dólares, e ajudaria nos nossos problemas cambiais?, animou-se Mantega. ?Isso não existe em outras partes do mundo. Mas seria uma maneira de fortalecer nossas moedas.?

No ano passado, o Brasil recebeu US$ 9,9 bilhões como resultado de importações feitas pela Argentina, enquanto o país vizinho recebeu US$ 6,2 bilhões em vendas feitas ao Brasil. Com o mecanismo, todo esse dinheiro teria sido movimentado em moeda local e não em dólares. Em 2003, essa mesma proposta já havia sido encaminhada pelo governo argentino ao brasileiro, sem sucesso.

Os ministros Mantega e Felisa Miceli, da Argentina, não definiram se essa ?arquitetura financeira? pode ser adicionada ao Convênio de Créditos Recíprocos (CCR), mecanismo de países latino-americanos de compensação das operações comerciais, com garantia dos respectivos Bancos Centrais.

A comunhão de idéias entre Mantega e Miceli, entretanto, não passou desse ponto na reunião de ministros de Economia. Diplomaticamente, Mantega afirmou à imprensa ter considerado ?positiva? a proposta de sua colega de afinar as posições dos países do Mercosul e outros vizinhos para a próxima Assembléia Anual do Fundo Monetário Internacional (FMI), a ser realizada em setembro, em Cingapura, e nos encontros seguintes da organização. Ele lembrou que essa idéia já vinha sendo adotada.

Mantega, entretanto, foi cuidadoso ao reiterar que isso não significará negociação em conjunto com o FMI, como sugeriu a proposta argentina.

O ministro igualmente foi cauteloso ao avaliar outra sugestão argentina – a criação do Banco de Desenvolvimento do Mercosul, uma espécie de BNDES para financiamento de obras de infra-estrutura na região, com sede no país vizinho. Com o cuidado de não trombar diretamente com Miceli, afirmou que teme ver construída mais uma estrutura burocrática, pouco ágil e que seria implementada apenas em longo prazo. Acrescentou que prefere a criação de uma agência de fomento, para a qual o BNDES poderia aportar recursos e que poderia ser operada pela Corporação Andina de Fomento (CAF), que já conta com uma estrutura adequada.

Brasil vai atender parte das reivindicações do Paraguai

Córdoba (Argentina) – O governo brasileiro deve atender parte dos pedidos paraguaios para resolver o impasse sobre a dívida paraguaia com o Brasil, adquirida durante a construção da usina hidrelétrica de Itaipu. A informação foi dada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, após se reunir com o ministro da Economia paraguayo em Cordoba, na Argentina. A cidade sedia a 30.ª reunião do Conselho do Mercado Comum e Cúpula dos Presidentes do Mercosul.

O Paraguai sustenta que não tem como pagar os juros cobrados pelo Brasil e vem pressionando o país para abaixá-los. ?Há uma disposição, não de rever o tratado, mas de atender parte das reivindicações do Paraguai.? O ministro não quis adiantar quais seriam. ?Depois que fizermos a negociação, eu poderei anunciar.?

Mantega adiantou apenas que, na próxima semana, os dois países se reúnem novamente para tentar chegar a uma solução. O primeiro encontro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao chegar em Córdoba, foi ontem no final da tarde, com o presidente paraguaio, Nicanor Duarte. A pauta da reunião não foi adiantada, mas os presidentes devem voltar a conversar sobre a dívida.

Governo vai cobrar CPMF sobre as exportações

Córdoba (AE) – O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que a equipe econômica conseguiu chegar a uma fórmula que permitirá o anúncio, no início da próxima semana, das medidas cambiais pleiteadas pelos setores produtivos. Conforme adiantou, a cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) incidente sobre os pagamentos de exportações brasileiras será mantida. Mas haverá benefício para o setor exportador. ?Nós encontramos a fórmula. Ela não vai acarretar perdas de arrecadação. Mesmo porque nós temos de manter nossas finanças públicas equilibradas. Vocês me cobram isso a todo momento?, afirmou.

A equipe econômica analisa há pelo menos dois meses a possibilidade de alterar a legislação vigente para permitir que os dólares resultantes de operações de exportações não precisem, necessariamente, ingressar no País. No exterior, facilitariam a vida do exportador, ao permitir a rápida cobertura de desembolsos com importações e de pagamentos de débitos. Dessa forma, não haveria injeções de recursos no mercado de dólares brasileiro, o que reduziria as pressões que provocam a valorização do real. Com isso, os setores exportadores manteriam alguma margem adicional de competitividade, garantida pelo câmbio.

A dificuldade até o momento, acentuada por Mantega, está no interesse do governo em manter o recolhimento de CPMF sobre os resultados das operações de exportação, ou seja, dos dólares convertidos em reais. ?Nós não pretendemos abrir mão de aumento de receitas. Já estão nas nossas contas tributárias?, afirmou Mantega. A alternativa a esse dilema seria a cobrança da CPMF sobre os resultados das vendas ao exterior, mesmo sem a internalização dos dólares no País. Mas, como os recursos não ingressariam no Brasil, não haveria ?fato gerador? para a aplicação da alíquota da CPMF.

Pela indicação de Mantega, a solução encontrada pela Fazenda estaria nesse tópico. Questionado se a alta carga tributária incidente sobre o setor produtivo brasileiro não é também um fator contrário ao desempenho das exportações, Mantega concordou. Mas, ainda assim, alegou que a arrecadação do governo e o equilíbrio das contas públicas são as suas prioridades.

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