Brasil, Alemanha e Índia mostram projeto de reforma do CS

Brasil, Alemanha e Índia, abandonados pelo Japão, apresentaram, formalmente, uma proposta comum de reforma do Conselho de Segurança (CS) da Organização das Nações Unidas (ONU), três dias depois de o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter autorizado a quitação da dívida de US$ 135 milhões (R$ 308,61 milhões) com o organismo.

A iniciativa seguiu a estratégia de manter o tema na agenda da Assembléia-Geral da ONU e de impedir que o fracasso das discussões em 2005 enterre de vez o objetivo de reformar o CS – de não dar por vencida a idéia de atualizar a composição da mais importante instância de poder mundial, que ainda reflete o cenário do final da 2.ª Guerra Mundial.

O projeto de resolução prevê a criação de seis assentos permanentes, com poder de veto às decisões apenas depois de 15 anos, e mais quatro cadeiras não-permanentes.O conselho, ainda hoje, é composto por apenas cinco permanentes – Estados Unidos, China, França, Inglaterra e Rússia – e dez não-permanentes.

A ausência do Japão causou estranheza por indicar a possibilidade de uma aliança de Tóquio com Washington em favor de uma proposta mais modesta de reforma, que envolveria o aumento de "cerca de dois membros permanentes". A rigor, pode ser lida como o esfacelamento do G-4, o grupo criado em 2005 pela Alemanha, Brasil, Índia e Japão para promover o apoio mútuo visando o acesso ao clube mais restrito do CS e que elaborou a mesma proposição formalizada nesta semana.

O governo japonês, entretanto, tomou os cuidados. Durante a sessão da Assembléia-Geral de ontem, os representantes afirmaram que não se tratava de uma ruptura do G-4 e que a cooperação de Tóquio com o Brasil, Alemanha e Índia continuará. O objetivo de expandir o número de membros contínuos e não-contínuos no órgão, afirmam, será mantido por Tóquio.

Em seguida, a delegação da França expôs a análise dessa atitude como uma divisão de responsabilidades – no entanto, os três sócios do G-4 formalizam o plano e o Japão negociaria com a China e os Estados Unidos o apoio a esse intento de reforma.

A tese francesa foi respaldada por especialistas no Itamaraty. Primeiro, porque o Japão tornou-se, em 2005, o impedimento mais forte à aprovação da proposta do G-4, que contava com a maioria dos votos dos 148 membros da ONU – mais de cem, excluindo a África.

De um lado, a China opôs-se, ruidosamente, ao ingresso do Japão entre os membros constantes e assinou que, com a exclusão de Tóquio, poderia apoiar o projeto de mudança do CS. De outro, os EUA deram respaldo público ao ingresso no conselho apenas a um país – o Japão -, mas resistiram em firmar o texto do grupo.

Diplomatas brasileiros assinalaram que o distanciamento do Japão do G-4 poderia abrandar esse antagonismo entre os dois mais pesados membros do CS – os EUA e a China – e facilitar a aprovação da proposição do G-4. Indiretamente, essa estratégia de Tóquio traria vantagens também ao Japão. Uma vez que a idéia de modificação passe na assembléia, com mais de dois terços dos votos, caberá a cada país-candidato angariar os mais de 128 votos exigidos para ingressar no restrito clube dos membros duradouros.

Outros analistas, no mesmo Itamaraty, anteviram que o Japão poderia alçar um vôo próprio logo depois da reunião da ONU em setembro. Na ocasião, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, declarara-se "decepcionado com a China". Amorim completou que Pequim poderia ter permitido o início do processo da reforma e, depois, bloqueado o ingresso do Japão. Diplomatas brasileiros temeram, naquele momento, que o Japão tomasse a declaração como um ato de má-fé do Brasil.

Outros diplomatas acreditam que nenhuma reforma acontecerá se os EUA não alterarem a posição sobre o tema. Caso a proposta Washington-Tóquio seja formalmente apresentada, o jogo tornar-se-ia ainda mais difícil, dado o domínio norte-americano na ONU. Além do plano do G-4, estão em campo o intento da União Africana, que propõe a criação de 26 membros – seis inalteráveis, com poder de veto, e cinco não permanentes.

Há ainda a posição do Coffee Club, formado por nações como a Argentina, Colômbia e México (contra o Brasil), a Coréia do Sul (contra o Japão), o Paquistão (contra a Índia) e a Argélia (contra a Nigéria). O objetivo é obstruir o acesso de vizinhos/adversários ao conselho.

A cúpula do Itamaraty, entretanto, mantém a certeza de que a reforma será aprovada e que, seja qual for o número de novos membros permanentes, o Brasil estará entre eles. Nas contas do ministério, o País conseguiu os dois terços dos votos necessários para a aprovação pela Assembléia-Geral. Ontem, enquanto a proposta do G-4 era tabulada na ONU, o ministro das Relações Exteriores repetia a convicção de que a "reforma virá", seja neste ano ou no futuro próximo.

"Não pode continuar a haver uma ONU com a estrutura de 1945. Isso é de reconhecimento geral. A luta continua. Não quero ser pretensioso, mas posso dizer que nossa vitória é certa", afirmou.

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