Os bancos públicos e o fundo de investimento do FGTS (FI-FGTS) são os maiores credores do Grupo Odebrecht S.A. sem garantias reais, como ações e imóveis. Essas instituições detêm quase R$ 17 bilhões de dívidas nessa categoria dentro da recuperação judicial da companhia, que foi aceita ontem pela Justiça. O processo da Odebrecht, que tem dívidas de R$ 98,5 bilhões, é considerado o maior da história.
Sem garantias, os bancos públicos vão para o fim da fila de pagamento dos credores, na frente apenas dos acionistas. Além disso, deverão ter um desconto grande sobre o valor principal, dependendo das negociações na assembleia. Nessa categoria de empréstimos, o maior credor é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A instituição tem cerca de R$ 7 bilhões em créditos da Odebrecht. Em seguida, aparece o Banco do Brasil, com R$ 4,75 bilhões; e a Caixa, com R$ 4,13 bilhões. O crédito do FI-FGTS é de R$ 902 milhões.
Na outra ponta, estão os bancos privados – Bradesco, Santander e Itaú. Juntos, eles têm uma dívida a receber de R$ 1,3 bilhão, sem garantias. Em contrapartida, detêm um crédito de R$ 8,4 bilhões, com garantias, sobretudo em ações da Braskem. No caso de Bradesco e Itaú, que têm o maior montante segurado com os papéis da petroquímica, o valor foi elevado em 2018, quando os dois bancos aceitaram fazer um novo aporte de R$ 2,6 bilhões no grupo.
Do total de R$ 14,5 bilhões de dívidas com garantias, que não entraram na recuperação judicial, os bancos públicos possuem fatia de apenas R$ 6 bilhões.
Contestação. O BNDES contesta as informações do processo judicial. Em nota, o banco de fomento afirmou que todas as operações firmadas com a Odebrecht têm garantias reais e pessoais. “O banco apresentará sua manifestação no âmbito da recuperação judicial de modo a obter o correto reconhecimento do valor, classificação dos seus créditos.” A Caixa informou que a operação é protegida por sigilo bancário, e, por isso, não se manifestaria. BB e bancos privados não comentaram.
Segundo especialistas, a prática de conceder crédito sem garantias não é incomum. Em muitos casos, os bancos avaliam o risco da empresa e, em vez de exigir garantias, incluem nos contratos os chamados covenants – cláusulas com indicadores financeiros que não podem ser descumpridos sob pena de o vencimento de dívidas ser antecipado. Vale e Petrobrás, por exemplo, têm boa parte da dívida atrelada apenas a esses mecanismos, segundo um especialista em estruturação de dívida.
A Odebrecht fazia parte desse rol de empresas. Em determinado momento, com o forte crescimento econômico e a expansão dos negócios do grupo, as instituições estavam “confortáveis com o risco da empresa”, disse um executivo de um grande banco. A companhia dava garantias específicas para alguns projetos, mas pegava muita dívida corporativa sem garantia. Exemplo disso, é que entre 2008 e 2015, o endividamento do grupo saltou de R$ 18 bilhões para R$ 110 bilhões.
No caso do BNDES, há um agravante: além de conceder financiamentos para projetos específicos, como hidrelétricas e rodovias, que tinham como garantia a própria receita do negócio, o banco também dava garantias para contratos da empresa com terceiros. Ou seja, se hoje a Odebrecht não pagar um determinado contrato, quem pagará a conta é o BNDES, afirma um advogado.
Impacto. Apesar da dívida bilionária, a recuperação judicial da Odebrecht deve ter impacto limitado nos grandes bancos, segundo a casa de análise financeira Eleven Financial. Isso porque as instituições já separaram recursos para eventuais calotes. “Hoje, eles apresentam níveis de provisionamento mais elevados em relação aos patamares de 2015-2016, período em que sofreram impactado de alguns casos decorrentes da Lava Jato”, diz a analista Tatiana Brandt, em relatório ao mercado.
Os empréstimos da Odebrecht com bancos brasileiros totalizam cerca de R$ 32 bilhões. Segundo Tatiana, o BB deve ser o principal prejudicado, já que detém a maior exposição, com menor garantia e sem reserva de provisão adicional. Segundo ela, seus pares privados guardaram recurso em excesso para ser absorvido: Bradesco tem R$ 6,9 bilhões, Itaú, R$ 5,9 bilhões, e Santander, R$ 1,6 bilhão.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.