Brasília (AE) – O ministro das Relações Exteriores da Argentina, Rafael Bielsa, reconheceu que seu país "é um sócio incômodo e pouco confortável" do Brasil. "Mas não é um sócio caprichoso", ressalvou. Segundo ele, as reivindicações da Argentina correspondem às necessidades da sua população. "Não há irracionalidade na posição argentina. Há necessidades. E o Brasil compreende isso", disse. Ele fez esse comentário ao ser insistentemente questionado se a Argentina se comprometeria a não adotar medidas protecionistas (salvaguardas) contra o país, enquanto durarem as discussões, iniciadas na sexta-feira, para pôr fim às disputas comerciais entre os dois países.
Bielsa passou o dia em Brasília e, após reunir-se com o ministro Celso Amorim, anunciou "um programa ambicioso de aprofundamento" da integração das economias. Esse programa veio uma semana após a crise evidenciada na Cúpula América do Sul – Países Árabes. Irritado, o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, deixou a reunião antes do final.
Oficialmente, os protocolos que permitirão estreitar o relacionamento serão assinados pelos presidentes dos dois países somente dia 30 de novembro e tratarão de temas específicos como cooperação nuclear, espacial, militar, integração produtiva e infra-estrutura e energia. Até lá, porém, não há nenhuma garantia de que os argentinos – que desembarcaram em Brasília, com uma lista de 45 pontos para discutir – não irão barrar a entrada de produtos brasileiros no mercado local.
O chanceler brasileiro não quis comentar quais foram as reivindicações feitas pelos argentinos nesta visita, limitando-se a dizer que Bielsa ficou de detalhar cada um dos 45 pontos apresentados. "Eles fizeram um levantamento das questões, que não significam necessariamente problemas. Não vi o papel. Ele (Bielsa) foi só citando pontos e pedi que nos entregasse uma versão no papel para nosso uso e entregaremos também a nossa", afirmou, ressaltando que é preciso dar atenção especial à relação com a Argentina. Segundo Amorim, não há que se falar em trégua porque "não há guerra".
Classificando como "mais sistêmica" a proposta encaminhada anteriormente pelo ministro da Economia argentina, Roberto Lavagna, e que prevê a adoção de salvaguardas automáticas toda vez que as exportações brasileiras prejudicarem determinados setores produtivos argentinos, Amorim disse que essas questões específicas que afetam o setor empresarial serão tratadas em paralelo às discussões para integração das cadeias produtivas dos dois países.
"Ninguém vai desconhecer que existem as propostas do ministro Lavagna, mas vamos discuti-las e ver se encontramos uma solução sem entrar nessa questão de saber se é salvaguarda ou não", disse Amorim. "A visita foi muito proveitosa não só pelo momento como pelo conteúdo e será um marco na preparação para virada das relações Brasil-Argentina", disse o chanceler brasileiro.
Para Amorim, para que as duas economias tenham lugar num mercado mundial caracterizado por grandes blocos comerciais, é necessária competitividade e, para isso, é preciso o Mercosul. "Não existe Mercosul sem uma relação sólida do Brasil com a Argentina", defendeu, argumentando que "numa relação do tipo do Brasil com a Argentina não cabem rivalidades".