São Paulo (AE) – Em mais uma decisão que atinge a indústria moageira do Brasil, a Argentina deixou de fora das medidas de restrição à exportação a farinha de trigo e a pré-mistura. Apenas as vendas de trigo em grão estão sendo desestimuladas. Para inibir a exportação de um volume de trigo superior ao já registrado na Secretaria de Agricultura, cerca de 6 milhões de toneladas, o governo argentino decidiu na sexta-feira que, para novos registros de venda ao exterior, o exportador terá de recolher imposto de 20% sobre um preço de referência de US$ 183 a tonelada e não mais US$ 156/t, cotação projetada até aquela data.
?A medida nos pegou de surpresa. Se a justificativa, ao reter a exportação, é evitar a alta da inflação, por que deixar de fora a farinha e a pré-mistura??, questiona o presidente do Sindicato das Indústrias do Trigo de São Paulo, Luiz Martins. O diretor-presidente do Moinho Pacífico, Lawrence Pih, também ressalta a contradição da medida. ?Não entendemos a estratégia. Se o governo quer frear a exportação de trigo para conter a inflação, precisa abranger a cadeia toda.?
A reação dos moinhos paulistas, que respondem por 30% da moagem nacional, deve-se ao fato de que a indústria argentina já vinha se valendo de uma brecha tributária para vender ao Brasil mais pré-mistura, produto que, segundo a indústria, não passa de farinha de trigo misturada a sal. É que sobre as exportações argentinas de trigo em grão e farinha de trigo incide imposto de 20%, enquanto as de pré-mistura pagam 5%. Em 2001, conforme dados da indústria, o Brasil importou 166,3 mil t de farinha de trigo da Argentina e apenas 10,5 mil t de pré-mistura.
No ano seguinte, quando a legislação já tinha mudado, entraram no Brasil 95,5 mil t de farinha de trigo e 107,4 mil t de pré-mistura. Em 2005, os volumes foram de 28,1 mil t de farinha e 251 mil t de pré-mistura. No mês passado, ingressaram no País 22,688 mil toneladas de pré-mistura, sendo 22,605 mil t da Argentina, contra 1,557 mil t de farinha de trigo.
?Os moinhos brasileiros vão virar depósito de farinha argentina?, diz Martins. ?É mais barato importar farinha do que o grão para moer no Brasil.? Os preços dos dois produtos desembarcados em São Paulo são quase equivalentes. Ainda segundo a indústria, a pré-mistura chegaria em São Paulo a um preço em torno de R$ 476 a tonelada enquanto o trigo em grão ainda a processar chegaria no mesmo local a um preço a R$ 475 a tonelada.
O Sindicato do Trigo de São Paulo recorrerá ao Ministério da Indústria e Comércio por meio da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) para pleitear uma medida compensatória contra a pré-mistura, como um imposto de importação de 15%, e a possível retirada da Tarifa Externa Comum (TEC) para as importações de trigo de fora do Mercosul. Hoje, a Argentina, além de ter os preços mais competitivos para o trigo, é o principal fornecedor do produto ao Brasil graças a TEC, de 10%.
Pih diz que, ao aumentar o valor de base para cálculo do imposto de exportação para o trigo em grão, a Argentina já conseguiu reduzir os preços internos do trigo. Os preços do cereal para os moinhos locais caiu de 355 pesos por tonelada na sexta-feira para 320 pesos/t ontem. Segundo ele, ao comprar matéria-prima mais barata, os moinhos argentinos passam a ter mais uma vantagem sobre os concorrentes brasileiros e mais facilidade dentro do mercado brasileiro.