O risco crescente de o governo brasileiro ter de adotar um racionamento de energia elétrica este ano ou no próximo já aparece nos cenários do mercado financeiro para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014 e 2015. Economistas afirmam que a possibilidade de racionamento é nada desprezível e, se for confirmada, pode levar a economia a crescer menos de 1% em 2014 e até zero em 2015. A data do anúncio e o perfil de um possível racionamento é que devem definir o tamanho do estrago.

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A redução do nível de chuvas este ano colocou o setor elétrico em situação delicada, obrigando, por exemplo, ao uso prolongado da energia das usinas termelétricas, que custa mais caro e que, em condições normais, seria utilizada apenas de forma pontual. Na quinta-feira, 10, a presidente Dilma Rousseff reuniu-se com autoridades do setor elétrico justamente para avaliar o quadro do abastecimento, uma vez que os reservatórios estão em níveis cada vez mais críticos. Em entrevista ao The Wall Street Journal, o presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto, disse que o racionamento não será necessário, mas que os preços precisam subir mais rapidamente para que o consumo seja reduzido, o que traria consequências também para a já pressionada inflação.

O mercado trabalha com alguma possibilidade da adoção do racionamento em maio, após o fim do chamado período úmido. Contudo, neste caso, os riscos para a realização da Copa do Mundo e o custo político eleitoral seriam elevados, o que amplia a chance de o anúncio ser postergado para depois da eleição presidencial. Nesta hipótese, os prejuízos para a economia seriam grandes, principalmente em 2015. Enquanto isso, uma opção seria adotar o chamado “racionamento branco”, que compreende medidas como redução da iluminação pública e cortes de energia em momentos de pico de consumo, ou até mesmo apelar à redução voluntária do consumo pela população e pela indústria.

Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, dificilmente o governo Dilma deve anunciar um racionamento antes das eleições de outubro e, por isso, prevê que o impacto ficaria mais para 2015. “O racionamento parece cada vez mais evidente, só não vai ser anunciado claramente pelo governo antes da eleição, o que aumenta o risco de um apagão. De qualquer maneira, os riscos maiores estão todos ficando concentrados para 2015, quando o PIB tenderá a 0% de expansão”, afirmou. Para 2014, sua previsão é de PIB de, no máximo, 1,6%.

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Para o economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira, os impactos de um eventual racionamento de energia no País este ano dependerão, em boa medida, justamente do timing do anúncio pelo governo federal. “Isso é fundamental. Quanto mais demorarem para anunciar, pior será o efeito sobre a atividade e a inflação”, disse.

No cenário base do Banco Fibra, que não contempla o racionamento, a previsão para o PIB em 2014 é de crescimento de 1,5% e em 2015, de 1,1%. Em estudos preliminares, Oliveira calcula que uma redução da demanda por energia de 5%, caso o racionamento seja adotado em maio, teria impacto de 0,6 ponto porcentual no PIB deste ano e o crescimento em 2015 pode ser zero. “Caso o anúncio seja feito, por exemplo, depois das eleições, poderemos até ter retração do PIB em 2015”, alertou. O economista destaca que estes cálculos também não consideram ajuste de preço, “que, no fundo, é o limitador do consumo”, que se fará necessário diante do uso mais prolongado das usinas termelétricas.

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Em relatório divulgado hoje, o Deutsche Bank reduziu sua estimativa para o PIB de 2015, de 1,7% para 1,4%, citando, entre outros fatores, o risco de racionamento. “A persistência da escassez de chuvas combinada com a vigorosa demanda por eletricidade reduziu a capacidade dos reservatórios a níveis críticos em muitas regiões. Seria recomendável a adoção de um racionamento como medida cautelar, mas o governo tentará a todo custo evitar os potenciais efeitos nas eleições de outubro. Entretanto, é uma estratégia arriscada, na medida em que a persistência da falta de chuvas pode esgotar os reservatórios e demandar um racionamento mais forte em 2015”, afirma o texto, assinado pelo economista José Carlos de Faria.

O HSBC foi além ao afirmar que a economia pode ficar estagnada em 2014, caso o racionamento de energia seja similar ao de 2001. Em um cenário de racionamento parecido com o que houve em 2001 “o crescimento este ano poderia cair a zero”, segundo o relatório. “Existe ainda o risco fiscal envolvido, já que o governo pode ter que subsidiar parte do custo de acionamento das usinas termelétricas”, disseram os economistas da instituição.

Na avaliação da LCA, o risco de haver racionamento é maior para 2015 do que para 2014. Nos cálculos da consultoria, “um eventual racionamento neste ano teria um impacto negativo entre 0,5 a 1,9 ponto porcentual sobre o PIB”, afirma texto da consultoria. “Um racionamento somente em 2015 provavelmente teria impactos mais severos, pois seria bastante provável que os reservatórios encerrariam 2014 em níveis ainda mais baixos do que encerraram 2013 – o que exigiria um corte de carga mais elevado no ano que vem”, complementaram.

Sérgio Vale, da MB, destaca algumas diferenças entre a situação atual e a do racionamento de 2001. “Em 2001 o governo assumiu que havia um problema e foi atrás de solucioná-lo. Hoje houve um conjunto de falta de planejamento, seca inesperada e falta de assumir os erros por parte do governo Federal. A negação de que há um problema necessariamente fará com que o custo fique maior mais à frente para a sociedade”, afirmou.

Já na opinião de Cristiano Oliveira, do Banco Fibra, os efeitos de um eventual racionamento desta vez devem ser menos graves para a atividade em relação ao apagão ocorrido há 13 anos, quando a redução da demanda era da ordem de 20%. “Hoje, a interligação dos sistemas é mais eficiente e o uso da energia por parte das indústrias e consumidores é mais racional do que naquela época, com menor nível de desperdício”, avaliou o economista. Além disso, prosseguiu, a economia hoje é muito menos dependente da indústria do que naquela época, dado o grande avanço da participação dos serviços no PIB.