Em 2013, a captação da caderneta de poupança foi recorde: R$ 71 bilhões. Ganhou de muitos fundos de renda fixa, mesmo com o ciclo de alta dos juros básicos (taxa Selic). Neste começo de ano, no entanto, o cenário é outro: a volta da Selic aos dois dígitos e a perspectiva de inflação próxima ao teto da meta do governo, de 6,5% ao ano, parecem minar parte da atratividade da aplicação mais popular do Brasil.
De acordo com o Banco Central, de janeiro a março a diferença entre aplicações e resgates das poupanças (a chamada captação líquida) foi 49% inferior à registrada no mesmo período de 2013. Se comparada aos últimos três meses do ano passado, o tombo é ainda maior: 76%.
No atual panorama macroeconômico, o retorno da poupança tende a empatar ou até ficar abaixo da inflação. “A poupança renderá cerca de 6,5% ao ano e a inflação já está girando em torno disso”, alerta o diretor da Easyinvest Título Corretora, Amerson Magalhães.
Caso o cenário se mantenha, haverá perdas do poder de compra dessas aplicações. Quem investiu qualquer quantia na poupança em 1º janeiro, por exemplo, já está perdendo. “No acumulado de 2014, a caderneta rendeu 1,73% ante uma inflação de 2,17%”, compara o pesquisador do Instituto Assaf, Fabiano Guasti Lima.
A regra da poupança mudou em 2012. Hoje, quando a taxa Selic está em 8,5% ao ano ou abaixo desse nível, a caderneta rende 70% do juro básico mais a variação da Taxa Referencial (TR). Acima disso – caso do atual momento – a poupança rende 0,5% ao mês ou 6,38% ao ano, fora a TR.
Em 12 meses, a Selic subiu 3,5 pontos, para 11% ao ano, o que ajuda a aumentar um pouco o rendimento da TR. Ainda não há consenso no mercado sobre a continuidade da alta do juro básico, mas, de todo modo, novas elevações não devem ter impacto significativo na TR a ponto de melhorar a situação da poupança.
A estimativa é que fundos DI com taxa de administração de até 1% já superem os rendimentos da caderneta. Pelos dados da Associação Brasileira de Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), a taxa média dos fundos referenciados DI em janeiro era de 0,73% (para qualquer cliente). Só para varejo a média era maior: 1,17%. Aplicações atreladas à inflação também vivem uma boa fase e ajudam a tirar o brilho da poupança.
Alternativas
Com preços e juros subindo, especialistas indicam produtos que ofereçam maiores possibilidades de ganho. “Com o aumento da inflação, o investidor precisa tomar bastante cuidado”, diz Magalhães, da Easyinvest.
Ele destaca a segurança trazida por carteiras mais diversificadas de investimento. “O ideal é fazer um mix, comparando liquidez e rentabilidade”. Mas, caso os preços se mantenham em alta, a tática pode não adiantar. “Não há garantia de bater a inflação mesmo diversificando as aplicações”, diz o administrador de investimentos, Fábio Colombo.
De uma forma ou de outra, entre as alternativas à poupança está o Tesouro Direto. Os títulos públicos atrelados à inflação – Notas do Tesouro Nacional Série B (NTN-B) e Série B Principal (NTN-B Principal) – atualmente pagam juro fixo a partir de 6% ao ano mais a variação do IPCA. Ou seja, o investidor fica protegido do aumento dos preços e tem um ganho real de 6% ou mais.
No Tesouro Direto, o investimento mínimo é de uma fração de 10% do valor do título inteiro. Portanto, como o papel mais barato custa pouco mais de R$ 600, a aplicação mínima é de R$ 60. Quanto à liquidez, o governo promove leilões de recompra dos papéis todas as quartas-feiras, mas o indicado é permanecer até o vencimento. É importante ressaltar também que os títulos públicos, assim como os fundos de investimento, sofrem cobrança de Imposto de Renda.
“A lista de produtos do mercado hoje é muito vasta. Devem ser observados dois pontos na escolha: o prazo que se pretende investir, para saber quanto de imposto será pago, e a taxa de administração”, diz Lima.
Entre as aplicações que não possuem IR nem taxa de administração, como a poupança, há as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA). Nesses casos, as desvantagens são a baixa liquidez e o alto valor inicial para as aplicações (em torno de R$ 30 mil).
Pequenas economias
Apesar do cenário mais desfavorável, a poupança não deixou de ser indicada para certos casos. “Se uma pessoa tem um compromisso próximo, como uma viagem ou o pagamento de parcelas de um carro, a poupança ainda é uma boa escolha. O dinheiro rende, mas rende pouco”, diz Lima.
Mais do que um investimento, a poupança é uma “proteção contra a pobreza” na compreensão do brasileiro, diz o coordenador do Centro de Estudos em Finanças da FGV/SP, William Eid Júnior. “Mesmo que perca rentabilidade, estudos comportamentais mostram que não necessariamente o brasileiro trocará a modalidade de investimento.”
Para o professor de finanças do Insper, Ricardo Rocha, trata-se de uma boa porta de entrada no mercado financeiro. “A caderneta serve para iniciar o processo de acumulação de recursos com uma liquidez de curto prazo”, explica. A partir de R$ 10 mil e prazos mais longos (de dois anos), já é possível migrar para fundos DI ou de renda fixa ou ainda para Tesouro Direto, defende Rocha.
Em 2013, 55,5% das aplicações da poupança eram de até R$ 100, segundo balanço do Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Estendendo o universo para até R$ 20 mil, chega-se ao porcentual de 95% do total de investidores da caderneta. (Hugo Passarelli, Mariana Congo e Yolanda Fordelone) As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.