A apresentação do título deste artigo, nos traz a necessidade de uma breve exposição da interdependência entre as palavras expressas em seu conteúdo.
Tempos atrás (mais precisamente em 1999), verificamos uma iniciativa de extrema importância desencadeada pelos países desenvolvidos, que implicava na necessidade de criação de uma “Terceira Via” para os países em desenvolvimento, calcada no maior equilíbrio entre os blocos econômicos mais e menos abastados. Isso teve um impacto importante em termos políticos e de estratégia de mídia para os líderes mundiais que participavam de um encontro na Itália. Porém, na prática, continuam sendo foco dos debates e de relativa revolta aos menos desenvolvidos, as constantes manobras para a manutenção dos subsídios por parte daqueles que ditam as regras do desenvolvimento mundial.
Àquela época, produzimos um artigo intitulado: “Da terceira via às vias de fato”, publicado em jornal de ampla circulação no Paraná, que levantava dúvidas sobre a eficácia da propalada sensibilidade das nações desenvolvidas sobre os problemas da pobreza de grande parte da população mundial, como se, dividir riquezas, fosse interesse real do ser humano de forma geral. Também evidenciamos exigências que deveriam ser cumpridas para que houvesse tendência real de mudanças nas relações comerciais e humanitárias entre as nações no mundo globalizado, devendo-se destacar:
I) Questionar as barreiras sanitárias e sociais impostas aos produtos dos menos privilegiados – realmente isso tem sido feito pelos nossos governantes. Mas, na realidade, estamos mais nos adaptando às condições impostas (o que é um avanço importante para nós mesmos, em termos qualitativos, na medida em que mostramos ao mundo que somos competentes e versáteis) do que repudiando a forma pela qual tais barreiras continuam sendo insistentemente estabelecidas;
II) Exigir o pagamento de tarifas internacionais pela preservação do nosso patrimônio natural, no sentido de financiarmos, com competência e idoneidade, o desenvolvimento sustentável – isso, em parte tem sido tentado. Contudo, as medidas até então estabelecidas, principalmente depois da assinatura do protocolo de Kyoto não têm tido pleno êxito, uma vez que falta “alguém” que não tem interesse no assunto. Que por sinal, é quem mais causa danos à nossa sustentabilidade e à atmosfera que também é global muito antes da economia existir como tal;
III) Indagar sobre a manutenção de elevados níveis de subsídios dos produtos dos países desenvolvidos – estamos realmente indagando … e eles: subsidiando. E não adianta espernear, é fato constatado a oferta de 18 bilhões de dólares por ano (nos próximos dez anos), aos agricultores da Terra do Tio Sam. Também é declarado pelo comissário de comércio da união européia que: “Se eliminarmos totalmente os subsídios agrícolas na Europa, o resultado será desastroso”, frase de grande impacto publicada em veículo de imprensa de circulação nacional e que dará margem aos discursos sempre inflamados dos nossos dirigentes de plantão.
Pois bem, diante de fatos comprovados não podem existir versões e a conclusão é tácita: Temos que tomar medidas que impliquem em maiores vantagens competitivas para a nossa agricultura, caso queiramos continuar com o objetivo de sermos os maiores exportadores destes produtos no mundo. O uso do termo: “temos que tomar medidas”, tem endereço certo: estamos nos referindo aos governos, que têm se privilegiado da extrema capacidade de adaptação dos nossos produtores, para tirar proveito político da situação, com medidas centradas na edição de normas e na articulação da sociedade produtiva (em que pese o brilhantismo e competência do nosso atual Ministro da Agricultura, a quem devemos aplaudir pela clareza como trata o assunto). Ora, isso pode ser feito com competência pelas organizações não governamentais, apenas sob a coordenação do governo para o encaminhamento das ações legais.
Colocando em prática a nossa simplória opinião, precisamos para a nossa agropecuária, basicamente de:
a) mais agilidade na liberação dos recursos destinados ao setor com menos independência, por exemplo do Banco do Brasil, que quando analisa a liberação de crédito, impõe restrições que tornam complicado o acesso por aqueles que realmente necessitam;
b) um volume de recursos mais expressivo destinado aos investimentos, para que possamos modernizar nosso parque de máquinas, equipamentos e implementos, em propriedades de diferentes extratos, adotando inclusive tecnologias alternativas, ambientalmente mais adequadas;
c) um amplo programa de adoção e adaptação de tecnologia, envolvendo as instituições de ensino, pesquisa e extensão do país, com o aporte de recursos condizentes com as reais necessidades;
d) condições de crédito realmente diferenciadas, não só para as pequenas propriedades (aliás, diga-se de passagem, o crédito diferenciado tem sido de extremo valor para a melhoria das condições das famílias que dependem exclusivamente da agricultura), mas para o negócio agrícola como um todo, nos setores antes, dentro e depois da porteira.
Algumas dessas medidas podem ser entendidas como subsídio à nossa produção local e rechaçadas pelos nossos credores internacionais? Pois que sejam; a nossa realidade tem que ser expressa como tal, doa a quem doer !!!
Alguns poderão dizer: o governo faz o que pode e é melhor isso do que nada ou do que ser paternalista – e pasmem os senhores: ser paternalista é dar apoio a quem necessita. Evidentemente não devemos levar isso em conta, pois as dívidas são pagas pela sociedade e todos temos o direito de cobrar as medidas que promovam o nosso bem-estar-geral.
Enfim, mais uma vez assistimos espantados à forma pela qual o mundo moderno nos tem tratado e devemos estar atentos aos movimentos protecionistas, encarando de frente o problema e imaginando que temos um mercado consumidor invejável, que sempre é posto em segundo plano em nome da nossa necessidade de exportar cada vez mais. Temos que ampliar a nossa base de consumo interno, que vinha despontando como promissora nestes anos de plano real, e projetar a agricultura como peça fundamental à realidade do nosso pleno desenvolvimento.
Marcos Elias da Silva Traad é zootecnista, presidente da Associação Brasileira de Zootecnistas – ABZ