A agenda do novo governo vai além da futura Lei de Responsabilidade Monetária. Segundo o senador Aloízio Mercadante (PT-SP), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer que o governo dê atenção especial ao projeto que trata da Carta de Responsabilidade Econômica e Social. Mercadante, que ficou encarregado de preparar e apresentar o projeto ao Congresso, explicou que a idéia é estabelecer metas sociais e econômicas a serem cumpridas durante os quatro anos de mandato de Lula. Antes mesmo de o projeto ser encaminhado, o presidente já determinou a todos os ministros que, nas próximas semanas, apresentem metas para suas áreas, cujo cumprimento será avaliado e cobrado periodicamente.
Brasília
e Rio ? O governo planeja não só a área econômica, mas as metas sociais nas áreas de saúde, educação e emprego. Por exemplo: quantos leitos hospitalares, quantas vacinas, quantas matrículas escolares e taxas de crescimento das vagas do ensino ? disse Mercadante.Ele afirmou que todos esses indicadores sociais farão parte do planejamento das políticas públicas, que serão acompanhadas e monitoradas pelo Congresso. Do lado da economia, enfatizou, as metas não serão somente macroeconômicas.
? Também haverá metas de crescimento, produção, investimentos, infra-estrutura e desenvolvimento ? afirmou o senador.
Segundo Mercadante, a mudança do modelo de desenvolvimento do novo governo significa pôr o social como eixo de estrutura do econômico. Ele explicou que, ao contrário do que ocorria antes, os ministérios da área social passarão a ser mais valorizados, ganhando luz própria.
? É a desprivatização da agenda nacional, que não pode ser ditada apenas pelas forças de mercado. Ela tem que ser ditada por um projeto de desenvolvimento do País ? disse Mercadante.
Ele salientou que a idéia é reforçar, no debate nacional, temas como educação, saúde e os programas sociais em andamento. E o papel do Estado, acrescentou, será fundamental na elaboração das políticas públicas.
? O Estado não é mais prisioneiro da lógica do mercado. O mercado é uma instituição importante numa economia contemporânea, mas ele não pode ser a instituição hegemônica, que estabelece todas as políticas e define todas as prioridades ? enfatizou o senador.
Na avaliação de consultores e empresários, no entanto, o novo governo só terá sucesso em seu projeto de inclusão social se conseguir dar um choque de credibilidade na condução da política econômica do país. Mas é consenso que os sinais emitidos pelo ministro da Fazenda, Antônio Palocci, até o momento, tranqüilizaram o mercado.
Para o cientista político Christopher Garman, da consultoria Tendências, a administração do presidente Lula poderá ser caracterizada como aquela que teve maior empenho na área social. Mas as chances de êxito dependerão do sucesso da equipe econômica.
? Se a área econômica conseguir dar um choque de credibilidade, criam-se as condições para um crescimento econômico sustentável ? disse.
O presidente da Federação Brasileira das Associações de Bancos (Febraban), Gabriel Ferreira, também não acredita em soluções de curto prazo. Ele destacou que um dado positivo consiste na redução da volatilidade no mercado financeiro.
? Sabemos que isso não será fácil, mas o novo governo demonstrou que tem um objetivo a seguir ? afirmou o empresário Jorge Gerdau.
Esta também é a opinião do ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola. Segundo ele, Palocci já deixou claro que vai existir continuidade na política econômica.
? O ministro Palocci sinalizou que existe continuidade, elogiou o ex-ministro Pedro Malan e mostrou que a tônica do novo governo é mudança sem rupturas ? disse Loyola.
O economista José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central, atualmente na MCM Consultores, não vê continuidade na política econômica a ser conduzida por Palocci. Para ele, embora o ministro tenha avisado que manterá as atuais políticas fiscal, monetária e cambial, já está claro que haverá mudanças profundas na execução dos gastos públicos.
Semelhanças com Tony Blair
As primeiras ações do governo Lula guardam semelhanças com o começo da gestão do primeiro-ministro da Inglaterra, Tony Blair, em 1997. Os ingleses abraçaram o Trabalhismo depois de serem governados pelo Partido Conservador por duas décadas. Tal como no governo petista, a desconfiança dos investidores em relação à condução da política econômica era do tamanho da expectativa da população pelo investimento social.
? Tão logo assumiu, Blair anunciou uma postura macroeconômica conservadora, mas desenvolveu ações sociais interessantes. O novo governo parece estar se pautando no Trabalhismo inglês ? compara o economista Lauro Faria, da (FGV).
O conservadorismo macroeconômico nas declarações do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, é aplaudido pelos especialistas como um sinal de amadurecimento do PT. As críticas contundentes ao modelo do ex-ministro Pedro Malan deram lugar ao reconhecimento pela conquista da responsabilidade fiscal. Mas sem abrir mão do discurso agressivo de combate à desigualdade e à miséria.
O exemplo inglês mostra que é possível melhorar a área social ? e também o desempenho econômico ? sem esquecer do equilíbrio macro. A Inglaterra está entre os países de maior crescimento e sua taxa de desemprego é a menor da Europa.