É difícil para o homem comum, eleitor e ligado, mesmo que frouxamente, aos acontecimentos administrativos e políticos deste País, entender toda essa discussão sobre se a listagem montada pela Casa Civil de despesas na gestão Fernando Henrique Cardoso é ou não um dossiê.
As coisas foram postas da seguinte maneira: se é dossiê e lista despesas de FHC, da primeira-dama dona Ruth e outras figuras do governo anterior, é um documento ilegal. Foi montado para chantagear a oposição, prometendo troco se investigarem a fundo as despesas com cartões corporativos da cúpula do atual governo via CPI Mista ou outra de senadores. Se é uma listagem que não merece o nome de dossiê e caracteriza-se como documento comum, uma listagem que, embora secreta, pode e deve ser legitimamente organizada na Presidência da República, nada a reclamar. Nada a reclamar, salvo o fato de haver vazado, chegado ao conhecimento da imprensa e dos parlamentares.
Os da oposição receberam a informação da existência do dossiê como armação para chantagem. Se a oposição insistir nos inquéritos parlamentares e, principalmente, na convocação da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para depor no Senado Federal, como principal responsável pelo dossiê e pela manobra escusa para o qual serviria, o governo traria a público o que se passou em matéria de uso de cartões corporativos no governo FHC.
Lula fechou questão: não é dossiê, não é crime fazê-lo e crime sim é sua divulgação através de vazamento. Se alguém tem de ser punido, deve ser quem promoveu o vazamento. A oposição esperneou e está às voltas com a montagem de mais uma CPI, esta só de senadores, aproveitando que na Câmara Alta o governo não goza da maioria fácil que tem na Câmara dos Deputados.
Para o povo, o que importa é saber o que os governantes fazem com o seu dinheiro, principalmente quando usam um instrumento fácil como o cartão corporativo, um cartão de crédito em que a conta é paga pelos cofres públicos. E espantam-se todos ao verificar a natureza de certas despesas pagas com esse instrumento, dentre elas aluguéis de carros, despesas de ?duty free shops?, presentes, churrascadas e outros gastos que, além de parecerem supérfluos, não guardam nenhuma relação visível com o exercício de cargos públicos, sejam de presidente, primeira dama ou de ministros, chefes de repartições e até reitores. Bem da verdade, o povo nem sabia que existia essa mamata de pagar com cartão de crédito corporativo do governo.
Como de parte do grupo situacionista insiste-se que não foi montado um dossiê e, portanto, não existiu tentativa de chantagem, e que o essencial é descobrir quem vazou as informações, pois aí está o crime, a Polícia Federal entrou na ciranda.
O inquérito foi aberto sob a chefia do delegado Sérgio Menezes concluiu: é dossiê mesmo e sua montagem e divulgação conflitam com decreto presidencial de 2002.
O decreto dispõe sobre a ?salvaguarda de dados, informações, documentos e materiais sigilosos de interesse da segurança da sociedade e do Estado, no âmbito da administração pública?. Difícil a gente entender que aí haja matéria de interesse da segurança do Estado. Um ministro pagando com cartão corporativo uma tapioca pode ser um ato de consumo inocente e mesmo não punível. Daí a confundir algo como tal com sigilo de interesse da segurança da sociedade e do Estado há uma incomensurável distância.
Quanto ao vazamento dos dados do dossiê, de parte de FHC nada a reclamar. Ele até exige que tudo o que se passou na sua administração seja devidamente divulgado.
Quanto ao governo Lula, continua esperneando, embora assegure que nada de escandaloso se passou em suas gestões. Se não, por que não divulgar?
