Quando o povo elegeu Lula, esperava que o Brasil ficasse de mal com o Fundo Monetário Internacional. Afinal de contas, o PT e o presidente eleito passaram quase um quarto de século xingando o Fundo, chamando os que com ele se relacionavam de entreguistas e apontando aquele organismo financeiro internacional como um dos tentáculos do imperialismo norte-americano a tentar estrangular as economias dos países pobres e em desenvolvimento. E o Brasil é certamente pobre, embora sob certas óticas mais otimistas chegue a merecer o apelido de ?em desenvolvimento?.
Mas, como confessou o próprio Lula, é muito diferente ser oposição e ser governo. E são distintas as visões de quem está de fora, atirando pedras e quem, eleito, vira vidraça.
Empossado, Lula, seu PT e demais partidos que passaram a participar do ?forró? do poder, continuaram a amizade com o FMI e até a estreitaram, obtendo novos empréstimos. Não passava um mês sem que alguns gringos chegassem de Washington, aqui discutissem as nossas contas e saíssem fazendo largos elogios à política econômica do ministro Palocci. O superávit primário, ou seja, a economia que o País faz para pagar os juros da dívida, no governo Lula foi sempre maior do que o do governo FHC. Isso para desgosto até de muitos petistas e do empresariado nacional, que entendia devesse ser menor para sobrar dinheiro para investir no desenvolvimento econômico do País.
De repente, o governo Lula anunciou que iria pagar antecipadamente a dívida do Brasil com o FMI. E pagou US$ 15,6 bilhões, para alegria dos credores, espanto dos brasileiros e orgulho do nosso governo. Na época, algumas críticas tímidas foram feitas. Mas nada que abafasse a euforia. Afinal, o Brasil estava pronto para caminhar com as próprias pernas, sem a tutela estrangeira. As críticas tímidas diziam que talvez não fosse tão conveniente esse pagamento antecipado. A dívida poderia ser paga no vencimento ou mesmo ser rolada, para pagamento futuro.
Mas não precisávamos mais pagar juros ao Fundo e isso foi motivo de regozijo.
Agora o assunto do pagamento da dívida com o FMI e, de lambuja, com o Clube de Paris, grupo de países ricos que empresta dinheiro aos primos pobres, volta a ser objeto de discussões. E, como estamos em ano eleitoral, a linguagem chega a ser desaforada. O candidato da oposição, Geraldo Alckmin, tachou o pagamento antecipado da dívida com o FMI e com o Clube de Paris de ?burrice?. E, como quem faz burrice é burro, existem leves suspeitas de que duvidou da inteligência de Palocci e da do próprio presidente.
O ex-ministro da Fazenda fez de conta que não era com ele, mas Lula respondeu. Disse que ?O Brasil vivia com o seu ministro da Fazenda correndo para Washington todo final de ano para poder fechar as contas aqui. Hoje, nós devolvemos ao FMI, não pagamos, nós devolvemos ao FMI US$ 15,6 bilhões que estavam aí e que a gente estava pagando juros?. Uma resposta bem respeitosa diante de tão ferino ataque.
Alckmin havia acrescentado à sua crítica que trocamos uma dívida a juros baratos por outra, a interna, de juros caros. E criticou a política de juros do Banco Central.
Finjamos que não percebemos os motivos político-eleitorais desta discussão. Mas não ignoremos que efetivamente há dúvidas sobre a dívida. Os juros internos são muito mais altos do que os cobrados pelo FMI. E o governo pega empréstimos internos gigantescos todos os dias.