Dívida espetacular

Que o novo acordo com o FMI – Fundo Monetário Internacional, elaborado em tempo recorde e em volume não esperado, foi um breque na onda especulativa que estava ameaçando a economia brasileira restam poucas dúvidas. Que ele possa ter reflexos benéficos de duração mais longa, inclusive no resultado das próximas eleições, é, também, uma possibilidade. Mas daí a admitir sem reação a exagerada euforia do sempre, até aqui circunspecto, presidente do Banco Central, Armínio Fraga, há que se pensar um pouco. A imagem de um acordo “espetacular e sem custo” não corresponde à verdade, pois nenhum acordo desse tipo (leia-se dívida) é espetacular, a menos que o espetáculo – e qual seria? – ainda esteja por vir.

Dizem os exegetas dessa complicada e geralmente imprevisível atuação dos mercados financeiros que, com o volume de dinheiro (trinta bilhões de dólares, fora outras ajudas já anunciadas) prometido pelo FMI, o nosso Banco Central haverá de colocar o mercado em teste. Em vez de correr atrás do prejuízo de uma posição defensiva, passará a dar as cartas até encontrar um ponto de equilíbrio cambial que reflita as reais condições da economia brasileira, lastreada no lombo desse gigante adormecido que o hino canta. Em outras palavras, inverte-se o jogo-de-braço: o mercado especulador, que estava testando até onde o governo brasileiro teria suporte e caixa, passará a ser testado pelo Banco Central que, assim, desafia de morte os nunca identificados fazedores de palpites sobre o risco-Brasil.

Talvez o espetáculo a que alude Fraga tenha a ver com a história do bode na sala: sem o acordo, o custo de tudo seria muito mais alto, com taxas de crescimento menores, mais desemprego, aumento de nossa miséria, mais degradação da vida, violência crescente e sempre maiores dificuldades na obtenção de recursos externos. Mas, apesar da euforia manifestada pelo presidente do BC, é inegável que o acordo aumentou nossa dívida, mesmo que uma parte dela seja ainda apenas uma promessa e dependa do próximo cidadão brasileiro que sentar na cadeira de presidente da República a partir do começo do ano que vem.

Agora que o Brasil provou ao mundo que tem crédito internacional (predicado que o Planalto reivindica à imagem pessoal do presidente Fernando Henrique Cardoso, uma espécie de avalista do negócio), precisa provar também que tem capacidade de inverter os papéis internamente. Talvez essa seja a parte mais difícil do acordo que – ao contrário do que diz Fraga – não veio sem custo. E as dificuldades decorrem, não apenas do comportamento dos agentes econômicos, mas principalmente do quadro que vemos delinear-se no horizonte imediato de nossa política. Fazer o Brasil produzir em todos os setores, eis um caminho cheio de curvas e bifurcações, que alguns querem seja aplainado de muitas formas. De Garotinho a Lula, cada um profetiza fórmulas e catástrofes a seu modo. Nenhuma delas, entretanto, prescindirá de uma reforma tributária que desonere a produção e o trabalho, criando empregos, aumentando exportações, gerando bens de consumo, aumentando a renda e, conseqüentemente, fazendo crescer também a arrecadação para a geração do exigido superávit por parte do… FMI.

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