Discurso contraditório

José Dirceu, ex-ministro-chefe da Casa Civil no primeiro governo Lula e conhecido como homem-forte daquela gestão, sempre foi considerado o principal líder da equipe petista. Político com longa e aventurosa história de militância de extrema-esquerda, inclusive um exílio em Cuba, onde teria passado por uma operação plástica para não ser reconhecido, deu a volta por cima e, regressando ao Brasil, foi eleito deputado federal, transformando-se numa das mais reverenciadas lideranças do grupo que, com Lula, chegou ao governo da República.

Ao estourar o escândalo do mensalão, tornou-se uma pessoa visada. Visada de fora e até mesmo no meio de suas próprias hostes. Foi apontado pela oposição como chefe do esquema que visava juntar recursos por meios escusos e de origem até hoje não explicada para montar uma base de sustentação para o governo, para o próprio PT e todo o heterogêneo grupo que dominou o poder.

Foi cassado, embora insistentemente declarasse sua inocência. Esperneou e continua esperneando agora que o Supremo Tribunal Federal, ao aceitar a denúncia contra quarenta suspeitos das negociatas do mensalão e dos Correios, que resultaram em conclusiva CPI que no Congresso deu em praticamente nada, o inclui no rol dos réus. Essa capacidade de luta e a insistência de que é inocente e vítima de manobras políticas evidencia que é um homem que não vai deixar barato a sua defenestração da vida pública brasileira.

No afã de defender-se e defender o governo Lula, o PT e todo o grupo que pretende manter no poder, esperançoso de que faça um dia um governo de esquerda, socialista, na realidade está se opondo ao presidente e ao seu próprio partido. Senão, vejamos! Em nota veiculada em seu blog, José Dirceu disse estar sendo vítima de ?uma disputa política? iniciada com a sua saída da Casa Civil de Lula, no final de 2005. ?O que está em jogo?, anotou, ?não é apenas minha vida política e minha história, mas o projeto político que o PT e o presidente Lula representam.? Para ele, a ?elementar realidade? evidencia que por trás da tentativa de incriminá-lo escondem-se ?as tentativas da oposição conservadora e da elite de inviabilizar o governo Lula a todo custo?. Resume tudo em uma ?disputa política?.

Pois esta mesma análise ele repete agora, depois de indiciado pelo Supremo Tribunal Federal. Trata como instrumentos ou partícipes da ?elite conservadora? os ministros do Supremo que o incluíram no processo, muito embora seis dos onze magistrados tenham sido indicados para os cargos pelo próprio presidente Lula. Dirceu acentua que o que está acontecendo é a insistência das ?tentativas da oposição conservadora e da elite de inviabilizar o governo Lula a todo custo?.

Coloca-se contra o discurso do próprio presidente Lula e de seus atuais porta-vozes. O presidente, depois do julgamento do STF que colocou suspeitos de corrupção ativa e passiva, além de outros crimes, no banco dos réus, em curto pronunciamento, disse que são pessoas que estão sendo julgadas e ainda não foram condenadas. Não o seu governo. Assim, como aceitar que estariam tentando inviabilizar sua administração? Só se admitirmos que o escândalo do mensalão foi o que até agora está provado: um conluio para comprar votos e apoios ao governo, manobra em si só ilegítima. E mais ilegítimos os caminhos para isso percorridos e que agora estão sendo esmiuçados pela mais alta corte de Justiça do País. Dirceu se encarrega de colocar Lula e o governo na briga que se diz ter acontecido sem o conhecimento do presidente. E que dela Lula nada sabia, mesmo sendo coordenada de dentro do Palácio do Planalto e da sede do seu partido, o PT.

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