No campo do sistema eminentemente punitivo, a Política preconizada se cinge a conceber o “Direito Penal como última instância de controle social”, e isto por razões óbvias.
É assente que a imposição de uma pena se apresenta como a mais grave situação prevista no ordenamento jurídico, máxime quando o direito penal, como resposta básica, traz a privação da liberdade e esta, conforme a experiência e a história demonstra, não tem sido eficaz aos propósitos delineados.
Com efeito, a dramática e lamentável situação do sistema penitenciário brasileiro é a demonstração inequívoca da propalada falência do sistema carcerário. O que se observa no Brasil como um todo (e a prerrogativa, diga-se, não é só nossa), é que as prisões transformaram-se em verdadeiros depósitos de seres humanos, apresentando-se o quadro nacional com um déficit que se aproxima de 200.000 (duzentas mil vagas). Acresça-se a isto a “demanda reprimida”, representada pelos mandados de prisão expedidos e não cumpridos, cuja estimativa ultrapassa a cifra de mais de 500.000 (quinhentos mil), vale dizer, demanda superior àquela que se encontra “recolhida”, daí a afirmação de que há mais criminosos soltos do que presos.
Os fatos em questão se sucedem, mesmo porque a política de criminalização e privação da liberdade, sem qualquer lastro de cientificidade é proclamada pela sociedade, insuflada que é pelos meios de informação, e por fatos lamentáveis que ocorrem. Já assinalamos entretanto, que a resposta passional, imediata, com característica de mera vindita social é totalmente ineficaz. A reincidência, lamentavelmente, é uma constante. Basta que se verifique, no cotidiano, quem são os “novos” criminosos, e ver-se-á que já passaram pelo “sistema”.
Nesta linha, preconizando por respostas racionais frente aos crimes praticados, proclamam-se medidas tendentes a orientar nossos legisladores, os quais, entretanto, permanecem dissociados dos avanços em sede de direito penal. O que se vê é um verdadeiro furor legislativo com a ilusão de que mais e mais respostas penais a fatos que se procuram incriminar atende os reclamos da sociedade. Assim, no que concerne a uma racionalidade, impõe-se a “descriminalização e despenalização de condutas à luz da concepção de intervenção mínima do Direito Penal”.
Situações recentes em termos de reformas penais (contudo, tardias como reforma propriamente dita) fizeram com que alguns ilícitos deixassem de constar no ordenamento punitivo, a exemplo dos crimes de sedução e adultério. Os operadores do direito, entretanto, sabem que inúmeras outras condutas existentes não encontram justificativa para continuar sendo incriminadas, quando outros meios podem solucionar diferentes situações.
Felizmente, em que pese algumas resistências, as denominadas “penas alternativas” vêm ganhando espaço, e isto se justifica plenamente.
Um dos primeiros levantamentos feitos quanto a aplicação de penas e medidas alternativas, isto em 1997, demonstrava não mais do que 2.000 (dois mil) casos/ano. Hoje, todavia, o número se aproxima de 500.000 (quinhentos mil) casos/ano.
Estudos os mais diversos efetivados estão a demonstrar que a resposta contida nas situações passíveis de “despenalização” se apresentam como racionais, econômicas, de amplo alcance social e permitem afirmar que a reincidência se situa em patamares perfeitamente suportáveis.
De há muito o CNPCP vem incentivando o instituto das alternativas, e demonstração eloqüente desta assertiva foi a edição da Lei nº 9.714/98, cujos trabalhos de confecção se deram, exatamente, no seio daquele órgão. Não sem outra razão, pois, a continuidade na defesa do instituto das penas alternativas, como forma de evitar a privação de liberdade, que deve ser imposta excepcionalmente, qual ultima ratio.
Também como política sempre defendida é a questão relacionada ao sistema progressivo no que se refere ao cumprimento das penas privativas de liberdade. Não se adotando a privação em caráter perpétuo, e tendo a pena como forma de possibilitar a futura integração social do condenado, nada mais coerente, justo, legal e racional é a adoção do sistema progressivo, possibilitando ao condenado galgar regimes mais brandos no cumprimento da reprimenda imposta. Acorde com a política assim preconizada, o Supremo Tribunal Federal, em que pese resistências havidas, entendeu que a vedação quanto à progressividade prevista na Lei dos Crimes Hediondos era inconstitucional, e assim foi reconhecido. Desta forma, impõe-se como racional medida a manutenção do regime progressivo de cumprimento de penas, independentemente da natureza do crime praticado.
Outra questão sumamente preocupante se refere aos presos provisórios. Em algumas unidades da federação o número destes que se encontram a responder processo suplanta, em muito, os condenados, demonstrando total desequilíbrio no sistema punitivo. Evidente que situações tais estão a ensejar “oposição ao alargamento das hipóteses de incidência da prisão sem condenação”, medida sempre excepcional que, infelizmente, para muitos magistrados (embora minoria) é verdadeira regra.
Fatores desencadeantes à criminalidade também são coibidos, daí porque incentiva o CNPCP a adoção de medidas que objetivem o desarmamento.
Não são esquecidos a proteção e amparo às vítimas e testemunhas de crimes, mesmo porque não pode haver preocupação apenas àquele que delinqüiu.
Como se observa, os princípios colacionados e norteadores das Diretrizes acaso sejam observados, tenderão a trazer melhores dias à situação que enfrentamos. Outros aspectos, ainda, serão salientados.
Maurício Kuehne é professor de Direito Penal e Execução Penal da Faculdade de Direito de Curitiba – Unicuritiba. Ex-diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional – Ministério da Justiça. Membro do Conselho Penitenciário do Estado do Paraná.