Direitos da personalidade (II)

Vejam que ainda agora o Brasil e o mundo perplexos vêem desfilar pela televisão e pelas manchetes dos jornais o lamentável episódio ocorrido em São Paulo com o assassinato daquela família que todos nós sabemos, e também do caso “Pedrinho”. Tudo isso a imprensa está ávida por desvendar, por colocar todas as intimidades a respeito das pessoas, de maneira que essa é uma sociedade invasora, que nos constrange quando nós adentramos num estabelecimento comercial, quando adentramos até mesmo em elevadores e há uma placa dizendo “Sorria, você está sendo filmado”. Afora essa situação, o que não dizer das câmeras do Estado fiscalizando a nossa circulação pelas vias públicas? Que tem por objetivo dar segurança ao cidadão, mas nem por isso nós nos sentimos invadidos no nosso direito ao recato, no nosso direito à privacidade. Mas a despeito de toda essa situação há uma construção de valores que nós vamos observar no curso da história da civilização e ela se inicia, e eu não quero adentrar mais profundamente e tecer considerações históricas, mas certamente o cristianismo trouxe a nova mensagem de respeito à pessoa, “não façais aos outros o que não quereis que os outros vos façam”, como princípio de reciprocidade e, a partir daí, todas as construções filosóficas, mas que culminou em 1948 com a Declaração Universal dos Direitos Humanos pela ONU e nós estamos comemorando agora os 50 anos dessa declaração. O que não dizer da Revolução Francesa, que primou, sobretudo, pela valorização da pessoa humana como uma entidade extraordinária no campo do direito, afinal de contas não é o homem que gira em torno do direito, é o direito que existe para o homem e que gira por conseqüência em torno dele. É o homem, a pessoa humana, como eu disse, o epicentro de todo esse sistema galáctico, que faz com que a pessoa seja o ponto central de toda atividade social, política, econômica, ideológica e assim por diante. E nesse particular as constituições federais destacaram esse ponto determinante ao ponto de o artigo 1.º da Constituição da República Federal da Alemanha proclamar: “A dignidade do homem é sagrada e constitui dever de todas as autoridades do Estado seu respeito e proteção”. O povo alemão reconhece os direitos invioláveis e inalienáveis do homem, como fundamento de toda comunidade humana da paz e da justiça do mundo. Os direitos fundamentais que se anunciam a seguir vinculam o Poder Legislativo e os tribunais a título de direito diretamente aplicado. Não menos diferente foi o artigo 11, inciso 3.º de nossa Carta Magna de 1988, que proclamou como elemento fundamental do poder da República a dignidade da pessoa; no mesmo esteio, na mesma orientação seguiu o artigo 10, número um, da Constituição Federal da República Espanhola: “A dignidade da pessoa, os direitos invioláveis que são inerentes ao livre desenvolvimento pessoal, o respeito à lei e os direitos dos demais são fundamentos da ordem política e da paz social. Toda essa publicação vem direcionada, vem centralizada em torno da dignidade e da personalidade. Ominu causa, omini jus est. Por causa do homem é que se constitui todo o direito, já o dizia Justiniano, de maneira que dentro dessa linha de conduta nós vamos perceber que o preceito maior está, sem dúvida, alicerçada na pessoa e foi nessa perspectiva que vários códigos civis e, eu chamo a atenção, em especial, dos códigos em particular, o Código Civil Italiano, nos seus artigos 5.º e 6.º, e o Código Civil Português nos artigos 70 a 79, que tratam especificamente de direito da personalidade.

Clayton Reis

é professor da Faculdade de Direito de Curitiba e da Universidade Estadual de Maringá.

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