Rio – Irritado com a postura do líder do Governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), durante a crise do mensalão, o ex-deputado federal José Dirceu quer que o parlamentar deixe o Campo Majoritário, grupo de correntes moderadas que dirige o PT desde 1995. Mesmo depois de ser seu mandato cassado pela Câmara dos Deputados, Dirceu deixou clara sua disposição contra Mercadante, um dos pré-candidatos ao governo paulista, no recente período que passou no Rio de Janeiro para produzir, com o escritor Fernando Morais, um livro sobre sua participação no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O ex-deputado também demonstrou disposição de participar da campanha eleitoral de 2006, apoiando candidatos da sua escolha. "Se o Mercadante tem tantas críticas assim, deveria ir para outra corrente", comentou Dirceu, em conversa reservada, na qual demonstrou que pretende continuar militando no petismo.
Em meio à crise do mensalão, com as revelações sobre a influência do publicitário Marcos Valério de Souza no PT e no governo, o senador petista chegou a se declarar decepcionado com o PT e até ameaçou deixar o partido se os petistas culpados não fossem punidos. Essa posição irritou Dirceu, que considera que, no pior momento dos ataques do PFL e do PSDB, Mercadante não foi firme na defesa do partido e do governo, sua função como líder da legenda no Senado.
A avaliação leva o ex-parlamentar, provavelmente, a trabalhar contra a pré-candidatura de Mercadante – ele disputa a indicação com a ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy, numa briga que divide o partido e provavelmente será resolvida numa prévia entre os militantes.
Em sua temporada carioca, entre as entrevistas a Morais e "esticadas" em pontos de boemia, como o bar Jobi, em Ipanema, na zona sul, Dirceu foi cortejado por petistas que ainda vêem nele um importante líder. "O Zé é uma figura muito emblemática", disse o representante do MEC no Rio, William Campos. "Aposto que ele vai para o Diretório Nacional (onde é suplente) Vão abrir mão para ele. O Zé não vive sem isso."
Candidatos a deputado pelo PT no ano que vem, como o próprio Campos, demonstraram que o querem em seus palanques. O que não deve ser difícil. Só no Rio, o grupo de Dirceu deverá ter três candidatos a deputado federal – Luís Sérgio Nóbrega, Edson Santos e Marcelo Sereno – e não é improvável que ele também apóie Jorge Bittar.
Sereno, aliás, ex-assessor do ex-deputado na Casa Civil e um dos acusados de envolvimento no caso do mensalão, por supostamente ter nomeado dirigentes em fundos de pensão nos quais a CPI dos Correios investiga irregularidades, retomou o projeto de concorrer a uma vaga na Câmara, idéia que fora arquivada por causa do escândalo. Já circula entre os petistas uma lista de 15 candidatos a deputado estadual que apoiariam Sereno e poderiam ter o apoio do próprio Dirceu. Os dois, contudo, andaram de relações estremecidas.
Almoço
No encerramento de sua passagem pelo Rio, Dirceu, em almoço com amigos no apartamento da escritora Leilah Assunção, no Leblon, na zona sul, no sábado, disse que, se disputar a presidência em 2006 pelo PSDB, o prefeito de São Paulo, José Serra, não conseguirá assumir o cargo.
"Vocês acham que o establishment, o sistema, a Fiesp, a Febraban e a elite vão deixar o Serra ser presidente?", perguntou ele, em conversa com convidados. "Serra é muito independente. Eles querem um pau-mandado, um presidente dócil às regras do capital. Eles não querem o Serra presidente muito mais pelas suas virtudes que pelos defeitos."
O ex-deputado disse ainda que o presidente Lula tem que dizer o que pretende com a reeleição. "Ninguém vai votar nele só porque é o Lula", destacou o ex-parlamentar, que também disse que a boa colocação de Orestes Quércia (PMDB) na disputa em São Paulo mostra que a corrida presidencial será "imprevisível".
Poucas pessoas presentes se dispuseram a falar sobre o almoço. "Talvez porque não tenha ocorrido nada de extraordinário, nenhuma revelação bombástica, nenhuma novidade", comentou hoje a cantora e diretora de Música Popular da Fundação Nacional de Arte, Ana de Holanda. "Todo mundo queria saber com ele e o Fernando em que pé está o livro. O Fernando contou que o Zé Dirceu fala muito, mas praticamente emudece quando se liga o gravador. Por isso, o trabalho ainda está no meio."
O ex-deputado Vladimir Palmeira jurou que não conversou sobre política com Dirceu no encontro. "Eu e ele já sabemos onde concordamos e onde discordamos", declarou ele, amigo do ex-deputado desde o movimento estudantil dos anos 60.
