Dinheiro fala alto

De bolsos cheios, os parlamentares federais começarão a trabalhar só no dia 16. As casas do Congresso estão às moscas, embora os deputados e senadores tenham se autoconvocado para fazer agora o que já deveriam ter feito durante o ano de 2005. Talvez o motivo inconfessável da autoconvocação seja, efetivamente, embolsar cerca de R$ 100 milhões do dinheiro do povo em salários extras que a lei permite e a moral abomina. O pretexto é a necessidade de cumprir uma pauta que inclui a votação atrasada do Orçamento, o prosseguimento das atividades da CPMI dos Correios, da Comissão de Ética e outros temas que tinham e têm importância, mas que estão sendo esquecidos nas longas férias duplamente remuneradas que os parlamentares teimam em gozar. O Congresso está às moscas, não só porque não comparecem deputados e senadores, mas também porque o mau cheiro atrai os insetos.

O ano corrente e que se finda foi o de menor produção legislativa da última década. O Congresso mal cumpriu 40% do mínimo de produção legislativa que lhe era exigível.

O dinheiro no bolso está falando mais alto e não enrubesce nem os falsos moralistas do PT. O estatuto do partido de Lula diz, textualmente: ?Art. 69: Desde o pedido de indicação como pré-candidato a cargo legislativo, o filiado comprometer-se-á rigorosamente a: (…)

III – se eleito, combater rigorosamente qualquer privilégio ou regalia em termos de vencimentos normais e extraordinários, jetons, verbas especiais pessoais, subvenções sociais, concessão de bolsas de estudo e outros auxílios, convocações extraordinárias ou sessões extraordinárias injustificadas nas Casas Legislativas e demais subterfúgios que possam gerar, mesmo involuntariamente, desvio de recursos públicos para proveito pessoal, próprio ou de terceiros, ou ações de caráter eleitoreiro ou clientelista?.

Apesar dessa proibição expressa, os parlamentares das bancadas petistas na Câmara e no Senado embolsaram dois salários adicionais de R$ 25.649,40, pagos durante o período de autoconvocação extraordinária. Mas os deputados e senadores não apareceram ao serviço.

Ao todo, doze senadores e 80 deputados petistas ignoraram o próprio estatuto do partido. Não titubearam, entretanto, em expulsar do partido, exigindo ?fidelidade partidária?, os deputados e a senadora que votaram de acordo com as teses historicamente defendidas pela agremiação em favor dos trabalhadores, na reforma da Previdência. Não seria o caso, agora, de serem expulsos todos esses oitenta deputados e doze senadores petistas que, contrariando o estatuto da agremiação, embolsaram o dinheiro da convocação extraordinária e foram para casa, para as praias, para o campo ou empreenderam viagens de recreação, ignorando a convocação do Congresso?

Há exceções, raras, mas honrosas. Os deputados Dr. Rosinha e Dra. Clair, do Paraná, e Vicentinho, de São Paulo, se negaram a receber, pois para eles o dinheiro não falou mais alto e, sim, a dignidade de representantes do povo. O paranaense Dr. Rosinha foi mais longe, enviando ao presidente nacional do PT, deputado Ricardo Berzoini, um dos transgressores do estatuto da agremiação que dirige, um ofício exigindo a aplicação das normas da legenda. E o PT terá de responder-lhe e, assim, responder ao povo. Ou enfiar a viola no saco. No saco de gatos onde se empanturram e se engalfinham parlamentares do PT e de todos os outros partidos.

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