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O governo federal encaminhou ao Congresso Nacional, em setembro de 2004, o projeto de lei complementar que, na Câmara dos Deputados, tramita com o n.º 210/2004, instituindo o Supersimples, regime tributário, previdenciário e trabalhista especial à microempresas com receita bruta anual de até R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais)… Foi constituída Comissão Especial de Deputados Federais, que está colhendo sugestões das entidades sindicais de empregadores e trabalhadores como contribuição ao debate. No texto anterior sobre matéria, publicamos parte do estudo do Dieese no qual aponta questões básicas do projeto de lei. Destacamos, nesta segunda parte, alguns comentários do Dieese sobre pontos importantes do projeto de lei.

1) "Fórum Nacional do Trabalho: Do ponto de vista sindical, os aspectos trabalhistas do projeto de lei não foram discutidos e negociados preliminarmente no Fórum Nacional do Trabalho. No início dos trabalhos deste órgão, em 2003, Governo e representações de empresários e de trabalhadores entraram em acordo de que medidas que promovessem alterações na legislação trabalhista seriam objetos de discussão e negociação naquele Fórum. O envio pelo Governo de um Projeto de Lei – que estabelece, mesmo que para somente uma parcela das empresas (renda bruta anual de até R$ 36.000,00), mudanças significativas na área trabalhista e previdenciária – pode enfraquecer aquele espaço de discussão tripartite.

2) FGTS: Para o movimento sindical, um dos itens mais polêmicos do projeto reside na redução do depósito do FGTS para 0,5% sobre a remuneração do empregado, ao invés dos 8% regulamentares. Os que se opõem a esta redução argumentam que se trata de mais um retrocesso nos direitos dos trabalhadores, no contexto da flexibilização trabalhista. Aqueles que o defendem, justificam que hoje os trabalhadores de empresas informais já não têm acesso a estes direitos, como é o caso do FGTS. Portanto, trata-se de incorporá-los à formalidade, com o direito a previdência, férias, 13.º salário e outros. Duas alternativas podem ser discutidas para eliminar ou reduzir a controvérsia em torno desta questão. (1) A supressão deste ponto específico do projeto de lei (2) A inclusão de algum mecanismo de estabilidade para o empregado, tendo em vista que a criação do FGTS objetivou exatamente substituir a estabilidade dos empregados de acordo com o "tempo de casa" do empregado. De forma a tornar eficaz este mecanismo, a lei deverá fortalecer explicitamente o papel dos Sindicatos na fiscalização visando o efetivo cumprimento do disposto na lei.

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3) Terceirização: Um outro elemento de grande preocupação por parte do movimento sindical refere-se ao possível incentivo à terceirização que poderá gerar o projeto. A partir dele, a empresa já constituída pode decidir por sua fragmentação em várias unidades e, na forma de microempresa, contratar seus antigos trabalhadores (após demiti-los provavelmente), mas agora com pagamento menor de impostos e encargos trabalhistas, inclusive o FGTS de apenas 0,5%. As alternativas poderiam ser (1) Deixar expresso no texto que empresas já constituídas não poderão se valer da fragmentação para unicamente usufruir os incentivos fiscais (2) Reforçar, na própria lei, o poder dos sindicatos para apontar, ao Ministério do Trabalho e à Justiça de Trabalho, processos de terceirização dessa natureza, de forma que sejam analisadas as medidas cabíveis em cada caso. Esta alternativa não é excludente com a alternativa 1.

4) Contribuição Sindical: O projeto prevê que o empresário e o empregado, sob este regime especial, estão dispensados do pagamento das contribuições sindicais. Este é outro item que gera debate no interior do movimento sindical. Como alternativa, introduzir algum mecanismo de incentivo à sindicalização no projeto.

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5) Impostos e Contribuições: No que se refere ao aspecto tributário, a constituição de um "supersimples" – que busque reduzir e unificar impostos e contribuições (mais precisamente: IRPJ, PIS-Pasep; CSLL; Cofins; IPI; ICMS; ISS e INSS pessoa jurídica) – é em si mesmo um fato positivo, tendo em vista a atual complexidade tributária no Brasil. A Reforma Tributária, encaminhada pelo Governo ao Congresso, e ali discutida e votada em 2003, praticamente não atingiu este objetivo. Contudo, uma consideração de ordem geral, no que trata o projeto, é a seguinte: a fixação de um patamar máximo de receita bruta (R$ 36.000,00 ao ano), sem a construção de novas escalas de receita, não seria um "desincentivo" ao crescimento da empresa? Em outras palavras, as empresas que têm faturamentos de R$ 36.001,00, ou R$ 70.000, ou ainda R$ 100,000,00 também não deveriam ser alvo de apoio do ponto de vista fiscal e previdenciário, seja na linha da redução tributária, seja na desburocratização? A alternativa poderia ser construir uma grade de transição da empresa, que vai da informalidade, passando por etapas gradativas de formalização, sem que isto signifique o desestímulo ao seu crescimento.

6) Empresas de receita bruta superior a R$ 36.000,00 e até R$ 60.000,00 – O projeto de lei abre a possibilidade de o empresário, cuja receita bruta "exceder" a R$ 36.000,00 ao ano (R$ 3.000,00 ao mês) até o limite de R$ 60.000,00 ao ano (R$ 5.000,00 ao mês), poder inserir-se no programa, porém pagando um volume maior de impostos e contribuições comparativamente ao empresário de receita até R$ 36.000,00.

7) Questão Previdenciária: É positiva a diretriz da unificação do pagamento da contribuição previdenciária (pessoa jurídica) com os impostos e contribuições anteriormente citados. No entanto, a redação sobre a contribuição para a Seguridade Social dos empregados é confusa e deixa dúvidas. Neste caso, propõem-se esclarecimentos de especialistas no tema, e depois, se necessário, esclarecimentos ao elaborador do projeto.

8) Desburocratização: De forma geral, o objetivo da desburocratização, manifesto no Projeto de Lei, deve ser considerado positivo. De fato, conforme relatam as representações empresariais, a burocracia constitui-se em forte empecilho à formalização dos pequenos empreendimentos. No entanto, é preciso que estejam previamente apontadas as eventuais dificuldades que derivam das medidas adotadas e suas respectivas soluções. Um dos problemas, por exemplo, refere-se à dispensa do livro de inspeção do trabalho. Sabe-se da importância deste livro nos atos de fiscalização do Ministério de Trabalho. Portanto, com a dispensa do livro de registro, qual será a partir de agora o procedimento dos fiscais? Note-se, ainda, que algumas medidas podem não ter impacto direto sobre os empreendimentos que se constituem no público-alvo do Projeto de Lei. É o caso da dispensa do cartão de ponto, conforme determina a CLT, para as empresas que têm mais de 10 trabalhadores. Como visto anteriormente, a ampla maioria dos micro-empreendimentos de receita anual até R$ 36 mil emprega 1,4 pessoa por empreendimento. Assim, é pertinente perguntar se esta medida não foi introduzida apenas com o objetivo de incorporar mais um elemento de mudança em direção à reforma trabalhista mais ampla almejada pelo Governo.

9) Redação do texto pouco acessível: O texto da lei é burocrático demais. Será preciso "traduzi-lo" em formato acessível ao pequeno empreendedor, pois seu formato jurídico atual é extremamente complexo e de difícil leitura".

E-mail: edesiopassos@terra.com.br