Necessidade de exames complementares

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Denise Damo Comel

Diagnóstico refere-se a discernimento, ação e faculdade de discernir, conhecer(1). A expressão é mais utilizada pela medicina e diz respeito ao ato em que o médico procura a natureza e causa da afecção apresentada pelo paciente. É o conhecimento ou determinação de uma doença pelo sintoma ou mediante exames diversos(2). O termo foi utilizado pela OAB, Seção do Paraná, para dar nome a pesquisa feita recentemente com os advogados do Estado em face do Poder Judiciário, veiculada sob o título ?Diagnóstico do Poder Judiciário 2007?. Pelo propósito, segundo entendemos, o paciente seria o Poder Judiciário; o médico – aquele que interpreta o sintoma e diagnostica a doença – seriam os advogados; o objetivo, conhecer o Poder Judiciário a partir do sintoma (queixas) do advogado.

Ocorre que, chegada a termo a indigitada pesquisa, tem-se que os resultados obtidos não podem se prestar para os fins propostos. E isto, a nosso ver, devido a duas questões principais. A primeira, é que somente foram ouvidos os advogados, quando sabido é que o Poder Judiciário assenta em três pilares fundamentais: o Juiz, o Ministério Público e o Advogado. Parcial, portanto, a sintomatologia analisada para fins de diagnóstico do Poder Judiciário como um todo. A segunda, é que do total de 29.447 advogados inscritos na OAB/PR, apenas 8.270 responderam a pesquisa, o que representa apenas 28,08% dos profissionais inscritos. Em Ponta Grossa, Comarca em que atuamos, o percentual foi ainda menor, restrito a 24,74% dos profissionais.

Assim, sem entrar no mérito da pesquisa ou dos resultados obtidos, também sem formar juízo de valor a respeito da natureza das questões que integraram o questionário submetido aos advogados (se aptas ou não a informar a respeito do objeto pesquisado), a evidência de a pesquisa ter sido realizada apenas com advogados e conter a opinião de tão somente 28,08% dos profissionais inscritos na OAB/PR permite concluir que os resultados são insuficientes, além de provavelmente subjetivos, deles não se podendo fazer, objetivamente, um diagnóstico do Poder Judiciário.

Como exemplo, o artigo ?A verdade sobre a Justiça Estadual?, do e. colega Marcel Guimarães Rotoli de Macedo, divulgado neste mesmo Caderno, no domingo passado (23/12/2007), dando conta dos equívocos constatados na pesquisa no que tange à 1.a Vara da Fazenda Pública, Falência e Concordata da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central.

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Não há mesmo como fazer diagnóstico de um paciente que parece acometido de males tão graves como os atribuídos ao Poder Judiciário, com a análise de tão poucas queixas e sintomas, advindos de apenas um de seus segmentos, de modo que se deve tratar com especial reserva e comedimento as conclusões levadas a público.

De outro lado, a par do questionamento da validade dos resultados da Seccional, parece necessário refletir sobre o significativo número de abstenções verificado. É que não responderam a pesquisa 71,92% dos advogados inscritos. Seria este um dado relevante? Teria algum significado o fato de mais de dois terços dos advogados não terem se manifestado? Porque a maioria dos advogados do Paraná não respondeu? Incidiria aqui a regra ?quem cala consente?, ou seja, seria válido estender aos advogados silentes a opinião dos que responderam a pesquisa? Haveria algum problema na formulação das questões ou critérios de avaliação propostos a justificar tamanho índice de abstenção? Em síntese, qual seria o significado deste fato e suas implicações nas conclusões divulgadas?

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Seja como for, diagnóstico do Poder Judiciário no Estado do Paraná, com rigor e técnica científicos, não se fez. Fez-se, antes, uma pesquisa de opinião, com a adesão de pequeno número de profissionais, e que como tal (pesquisa de opinião) deveria ser considerada e divulgada, até mesmo para que não levasse a interpretações distorcidas ou equivocadas de seus resultados.

Todos sabemos que o Poder Judiciário enfrenta uma série de problemas, mas que não se resumem nem se esgotam naqueles que foram constatados na recente pesquisa da OAB/PR. Há muito a se perquirir acerca da natureza e causa da afecção apresentada pelo paciente. Insta que se procure diagnosticar, mas com o devido rigor científico, os males que acometem o Poder Judiciário, para que se possa buscar soluções efetivas não somente para contenção dos sintomas que mais o incomodam, mas em especial para a cura definitiva de suas deficiências, estabelecendo-se um estado de saúde geral e o equilíbrio de todo o sistema. Talvez devêssemos pensar em fazer alguns exames complementares…, antes de pretender dar um diagnóstico sobre questão tão complexa e relevante.

Notas:

(1)     HOUAISS, Antônio e VILAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro : Objetiva, 2001. p. 1030.

(2)     FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2.ed. Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1.986. p. 584.

Denise Damo Comel é doutora em Direito, juíza de Direito da 1.ª Vara da Família da Comarca de Ponta Grossa, professora na Escola da Magistratura do Paraná, Núcleo de Ponta Grossa.