1) A partir da Lei 9.437, de 20/02/1997, e mais recentemente com a Lei 10.826, de 22/12/2003, regulamentada pelo Decreto 5.123, de 01/07/2004, está muito difícil uma pessoa adquirir uma arma no Brasil e quase impossível obter porte de arma.
2) Assim, no Brasil, para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: (a) comprovar no pedido de aquisição e em cada renovação do registro, idoneidade e inexistência de inquérito policial ou processo criminal, por meio de certidões de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral; (b) apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; (c) comprovar, quando da aquisição e em cada renovação de registro, a capacidade técnica para o manuseio de arma de fogo atestada por empresa de instrução de tiro registrada no Comando do Exército por instrutor de armamento e tiro das Forças Armadas, das Forças Auxiliares ou do quadro da Polícia Federal, ou por esta habilitado; (d) ter no mínimo 25 anos e (e) comprovar aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestada em laudo conclusivo fornecido por psicólogo do quadro da Polícia Federal ou por esta credenciado.
3) Por sua vez, o artigo 6.º da Lei 10.826 prevê que é proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os integrantes das Forças Armadas, policiais, guardas municipais nos municípios com mais de 50 mil habitantes, empresas de segurança privada e transporte de valores, caçadores, colecionadores ou praticantes do tiro desportivo. Outros interessados somente poderão obter porte de arma, a ainda por determinado tempo e para uso em determinadas partes do país, desde que, além de preencher os requisitos referidos no parágrafo anterior, demonstrar efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física.
4) Se, no entanto, qualquer pessoa possuir, detiver, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal, nos termos do artigo 16 da Lei 10.826, ficará sujeito a prisão de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
5) A mesma lei prevê no artigo 35 que ficará proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para aqueles referidos acima, se isso for objeto de aprovação através do referendo popular, cuja votação ocorrerá no próximo dia 23 de outubro.
6) Essa a razão do presente artigo, principalmente depois de ver publicado em jornal artigo sobre a questão do referendo popular sobre o desarmamento, cuja autoria foi inicialmente a mim atribuída, o que foi retificado na seqüência, eis que eu não o escrevi. No entanto, referido artigo passou a circular pela internet e desde então tenho recebido manifestações das mais diversas partes do Brasil me cumprimentando pela firmeza do posicionamento e dos argumentos utilizados contra o desarmamento.
7) Realmente me posiciono entre aqueles que irão votar NÃO, ou seja, contra a proibição da comercialização legal de armas no Brasil, pois entendo que isso em nada reduzirá a criminalidade, não fará com que o crime organizado recue e não retirará do povo brasileiro a insegurança que atinge a todos.
8) Na campanha pelo desarmamento vende-se a falsa idéia de que ele será um poderoso fator de redução da criminalidade, o que não é verdade, pois a experiência de outros países como EUA, Suíça, Canadá e Austrália, nos comprova claramente que a proibição de venda de armas acarretou o aumento da criminalidade e da crueldade dos bandidos. Isso somente não ocorreu quando o governo fez investimentos na área social, aumentou o número de empregos, combateu a corrupção e puniu exemplarmente os criminosos, colocando-os na cadeia e não pelo simples fato da proibição da comercialização de armas. Isso é pura ilusão.
9) Dados divulgados pela imprensa dão conta que a maioria das armas que circulam no Brasil não possui registro e entraram no país sob a forma de contrabando, estando em sua grande parte nas mãos de criminosos que, com certeza, permanecerão com as mesmas. Retirando o direito do cidadão brasileiro em adquirir uma arma, estará lhe sendo retirado o direito de se proteger, de proteger sua família e seu patrimônio, enquanto os criminosos continuarão de posse das armas clandestinas e tendo acesso a novas armas por meios ilegais.
10) Se o Estado não se mostrasse incapaz e incompetente de exercer sua função prevista na Constituição Federal, que é dar segurança à população, as pessoas não precisariam de armas em suas casas. É que, afora os discursos dos governantes e da propaganda enganosa por eles realizada em jornais, revistas, programas de TV e rádios, tentando iludir os cidadãos com a informação de que se está ganhando a luta contra o crime, a realidade é que nada ou muito pouco é feito de forma efetiva para combater a criminalidade e suas causas.
11) Como visto acima, nossa legislação é restritiva e suficientemente boa para impedir a venda de grande quantidade de armas, mesmo para as pessoas que pretendem mantê-las em suas residências. Da mesma forma, no Brasil, como vimos acima, para obter um porte de arma e poder circular com a mesma é quase impossível, seja em razão das restrições da lei, do custo das taxas ou da burocracia para se conseguir o porte. Os bandidos, no entanto, pela falta de estrutura e talvez até pela incompetência de nossos órgãos de segurança, conseguem circular facilmente com armas e talvez com menor custo possa obter ilegalmente uma arma.
12) Se as pessoas usam indevidamente as armas, ou deixam que crianças tenham acesso a elas, que sejam punidas com a prisão na forma da lei. Da mesma forma deveria ocorrer em relação aos bandidos. O polícia deveria prendê-los e impedir que eles mantivessem armas. Com isso as pessoas não precisariam de armas.
13) O problema é que nossos governantes mudam o foco do debate para fugir de suas responsabilidades, pois não conseguem proporcionar segurança aos cidadãos que precisam se defender sozinhos. De outro lado encontramos artistas e políticos se manifestando a favor do desarmamento, mas esquecem de dizer à população que eles não precisam de armas porque circulam cercados de seguranças e residem em condomínios que possuem forte esquema de segurança.
14) No entanto, se o entendimento é de que os requisitos existentes para a comercialização das armas de fogo não são suficientemente rígidos, que se estabeleçam novos critérios, mas não se pode impedir as pessoas de possuí-las e usá-las em legítima defesa para proteção de sua vida, de sua família ou de seus bens, direitos esses garantidos em nossa Constituição Federal.
15) Se o Estado não cumpre sua função pública de dar segurança aos seus cidadãos, estes não devem conformar-se, sem qualquer reação, quando forem vítimas de assalto, estupro, seqüestro ou assassinato. Os próprios criminosos se sentem desestimulados ao crime ante a possibilidade de reação da vítima. Se o resultado do referendo for pela proibição da venda de armas, sabendo os bandidos que a vítima sempre estará indefesa, certamente aumentará a ocorrência de crimes.
16) Os que defendem a proibição da venda de armas de fogo o fazem em razão do grande número de homicídios praticados com as mesmas. Esse argumento somente reforça a tese de que a proibição de venda de armas não diminuirá a criminalidade, pois a comercialização de armas é proibida para menores de 25 anos, e os dados estatísticos demonstram que a maioria dos homicídios é praticada por pessoas com idade entre 13 e 26 anos e com armas ilegais, ou seja, não são armas que foram compradas em lojas.
17) Para os que defendem o desarmamento sob a alegação de que isso diminuirá o homicídio fortuito, decorrente de brigas de rua, no bar, no trânsito ou mesmo fruto de violência doméstica, entendemos que um policiamento preventivo seria mais eficiente, ao lado da punição dos criminosos. Além disso, devemos lembrar que o que predomina na violência doméstica não é o uso de arma de fogo, mas a agressão física, muitas vezes utilizando-se de pedaços de madeira, barras de ferro, facas etc. Então, seria o caso de proibir a venda destes materiais?
18) O mesmo ocorre com os veículos. São dezenas de milhares de pessoas que morrem anualmente em decorrência de acidentes. Assim, como a legislação que somente autoriza vender armas para determinadas pessoas, a lei somente autoriza que pessoas habilitadas dirijam os veículos. Seria o caso, então, em razão dos acidentes, de se proibir a venda de veículos?
19) A história nos mostra que proibir a venda de armas é uma das primeiras medidas de governos totalitaristas, ou seja, governos de países em que um grupo centraliza todos os poderes políticos e administrativos, não permitindo a existência de outros grupos ou partidos políticos, como aconteceu com Hitler, Stalin, Fidel Castro e Mussolini.
20) Retirado o direito de o cidadão adquirir uma arma estará se violando o artigo 5.º da Constituição Federal que prevê a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país a garantia da inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, afora o fato de que estará aberto um sério precedente para violação de outros direitos constitucionais.
21) Portanto, no dia 23 de outubro vote NÃO contra a proibição da comercialização de armas no Brasil. Você não precisa possuir uma arma, mas não pode deixar que tirem o direito constitucional daqueles cidadãos de bem de se defender, principalmente em razão da omissão do Estado, que não proporciona ao povo o direito constitucional de ter segurança.
José Eli Salamacha é advogado, mestre em Direito Econômico e Social e sócio da WSW Advogados Associados.