Democracia de araque

Vivemos uma democracia de araque, para não dizer uma ditadura camuflada. No Brasil não há, como é regra básica do regime democrático, harmonia e independência entre os poderes da República, e sim subordinação, principalmente do Poder Legislativo ao Executivo. Tal fato não significa que Lula, FHC ou outros presidentes tenham sido ditadores camuflados em presidentes de um regime democraticamente organizado. O foram, sem dúvida, os presidentes militares na ditadura. O problema não está na formação política do presidente, embora possamos ter o azar de, neste sistema distorcido, ainda ter de agüentar um tirano no Planalto que não se pejaria em usar os instrumentos antidemocráticos que um sistema político equivocado põe à sua disposição.

Na Câmara dos Deputados, de cada lote de 59 projetos apresentados, só um vira lei. Levantamento revela que dentre os mais eficientes deputados, estão os paranaenses. A nossa bancada é uma das melhores, mas, mesmo assim, está muito próxima da inação em que vivem todos os deputados. Em geral, a Câmara só aprova o que o governo manda. Mesmo os deputados independentes não logram muito sucesso, pois apresentam projetos de real importância e podem vê-los rejeitados ou vetados porque o governo, honesta ou desonestamente, sempre mantém maioria. Ele tem a caneta na mão, nomeia e desnomeia, solta ou segura verbas e este arsenal é irresistível para os parlamentares.

Segundo o deputado Gustavo Fruet (PSDB), um dos destaques da Câmara, ?somos o Congresso da não-decisão, da submissão aos interesses de quem está na Presidência?. Ele, que é um dos parlamentares de maior prestígio e o que mais trabalha no Congresso, já no segundo mandato, ainda não conseguiu ver aprovada nenhuma das leis que propôs. Ele já havia denunciado essa situação de submissão quando foi candidato de protesto à presidência da Câmara. Entende o jovem parlamentar que o mais grave é a cooptação do Executivo. Refere, como exemplo, à declaração do presidente Lula a três mil prefeitos, em Brasília, prometendo aumentar a verba do Fundo de Participação dos Municípios, mandando a bancada situacionista aprovar o projeto. Agiu o presidente como se ele mandasse. Os deputados obedecem e ponto final.

Há, por exceção, uma ou duas leis aprovadas por deputados, inclusive paranaenses. Um nosso conterrâneo conseguiu, por exemplo, uma lei que dá o nome Governador José Richa a uma rodovia. Já outro deputado paranaense de descendência japonesa conseguiu a aprovação de uma lei que cria o Dia da Imigração Japonesa. Destacaríamos, pela operosidade e até mesmo pelos poucos, mas importantes resultados conseguidos, deputados como Osmar Serraglio, Luiz Carlos Hauly e Max Rosenmann. Mas suas vitórias legislativas, como a de outros colegas operosos (e eles existem), são gotas num oceano de leis que jorram do Palácio do Planalto em medidas provisórias e projetos de lei, e só são aprovados porque o Executivo quer.

Trata-se de uma situação dura e que perdura. O Congresso custa ao povo brasileiro um mundo de dinheiro. Seu papel tem sido de criticar, sem modificar, o Poder Executivo. Em dias como os atuais, em que há CPIs, investigações contra membros da Câmara e dos poderes Executivo e Judiciário, parece que pagamos aos parlamentares para que investiguem e denunciem, ficando para um plano esquecido o seu papel essencial de legislar.

Solução há. Uma delas já está para ser discutida no Supremo Tribunal Federal: a cassação dos mandatos assumidos por deputados que, depois de eleitos, trocaram de partidos e foram para as bases situacionistas. Se isso acontecer e estabelecer-se a fidelidade partidária, o Congresso ficará valorizado e deputados e senadores não precisarão mais beijar a mão de presidentes da República. Com eles trabalharão harmônica, mas independentemente, dentro de uma regra pétrea da democracia.

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