A decisão do PMDB de romper com o governo é boa para a administração Lula no curto prazo. A opinião é do cientista político Fernando Abrucio, professor da PUC-SP e FGV-SP. Na cisão do partido em dois blocos ("o PMDB congressual" e "o PMDB partido"), o cientista disse que a "jóia da coroa", que são os votos do partido no Congresso, está com o governo Lula. E, apesar da decisão da convenção, ele acredita que a base parlamentar não mudará de lado. Ao contrário, Abrucio descartou qualquer possibilidade de punição.
"Votar com o governo é um posicionamento nesta briga interna do partido", disse o cientista. Nesse sentido, ele não acredita que os parlamentares do PMDB venham a tentar barganhar com o governo Lula para a aprovação futura de projetos. Abrucio imagina que o oposto deve ocorrer. "O PMDB congressual precisa continuar votando com o governo, porque brigou com o PMDB partido, para ficar com o governo", disse. Se negar apoio ao governo, estará reforçando a proposta de rompimento do "PMDB partido".
Nesse sentido, segundo Abrucio, a cisão do PMDB é benéfica ao governo de imediato, mas ruim no longo prazo. "O PMDB congressual para ter força nesta briga precisa mostrar a que veio", avaliou, prevendo maior aproximação com o PT. Se o desempenho do governo em 2005 não corresponder às expectativas, essa parte do PMDB poderá engrossar a oposição na disputa presidencial de 2006, o que fragilizaria a aliança política em torno da reeleição de Lula na próxima eleição.
"O resultado não foi bom para os dois lados do partido", acrescentou. Se o "PMDB partido" insistir com o rompimento, os parlamentares poderão buscar uma coligação com o PT, para manterem as presidências das mesas da Câmara dos Deputados e do Senado, o que tornará o partido ainda mais governista em 2005. Uma vez que a repercussão da decisão da convenção é negativa, Abrucio vê espaço para reviravolta.
Ao lado da contestação judicial à convenção, o cientista político destacou as declarações do ex-presidente José Sarney como "paradigmáticas", quando ele atribuiu ao presidente do PMDB Michel Temer, o racha oficial do partido. "Se a ala mais pragmática do partido pretendia, com tudo isso, aumentar o cacife, caiu em uma armadilha e perdeu."
Futuro
Abrucio acredita que, se o PMDB quiser ser um grande partido no cenário político nacional, terá de diminuir de tamanho, e especialmente, reduzir sua heterogeneidade. "A situação atual é insuportável", disse. Segundo ele, o racha do PMDB, tornado público com a convenção deste fim de semana, mostra "a agonia em praça pública" de um partido que começou com a candidatura de Ulysses Guimarães na eleição presidencial de 89. Naquela eleição, apesar de ter candidato próprio, o partido rachou e trabalhou contra Ulysses.
Sem mudanças profundas, Abrucio acredita que o PMDB viverá a mesma situação em 2006, se insistir em lançar um candidato próprio. "Será outro a ser ‘cristianizado’", disse, usando a expressão que nasceu da candidatura fracassada à Presidência pelo PSD em 1950 do mineiro Cristiano Machado, que foi oficiosamente abandonado por seus correligionários. Abrucio foi além e afirmou que, se Anthony Garotinho for o candidato do PMDB, o efeito será semelhante à candidatura de Paulo Maluf no Colégio Eleitoral, que elegeu Tancredo Neves em 84. "A destruição do partido", resumiu.
Hoje, de acordo com Abrucio, os interesses regionais do PMDB, representados por seus líderes, impede que o partido tenha unidade nacional. Ele criticou a idéia de recriar o velho MDB, que deu origem ao PMDB, porque, sem o expurgo de interesses contraditórios, seria uma troca de siglas sem importância.