Uma sentença do juiz Roberto Arriada Lorea, da 2ª Vara de Família e Sucessões e Família de Porto Alegre, abre caminho para o reconhecimento do casamento de pessoas do mesmo sexo no Brasil. A decisão, tomada na segunda-feira (14), reconheceu o pedido de dissolução de união estável de um casal homossexual gaúcho, algo que já ocorre eventualmente nos tribunais. O ineditismo ficou por conta da argumentação, na qual o juiz diz que, além da união estável, o casamento é um instituto passível de ser acessado por todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual.
A união estável de homossexuais já é reconhecida pela Justiça a partir de casos em que teve de deferir demandas por benefícios previdenciários e partilha de bens. No caso do Rio Grande do Sul, os cartórios estão obrigados a aceitar o registro de união estável desde fevereiro do ano passado. E assim como reconhecem o início, tanto cartórios quanto juízes já tiveram de registrar ou deferir solicitações de dissolução.
A argumentação de Lorea respondeu ao parecer do Ministério Público, que havia opinado pela extinção da ação movida pela casal advertindo que não haveria embasamento legal para fundamentar o deferimento e que o reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo poderia se traduzir no reconhecimento do direito ao casamento, o que implicaria em reflexos "preocupantes" no mundo dos fatos.
O juiz lembrou que da leitura do Artigo 226 da Constituição Federal "não decorre a conclusão ‘somente entre homens e mulheres’, ao contrário, não veda a proteção jurídica das relações estáveis entre pessoas do mesmo sexo". Destaca, ainda, que o Artigo 3º da Constituição preconiza o princípio da igualdade, ao qual os homossexuais também têm direito.
Como entende que não há impedimento legal para o casamento entre homossexuais, Lorea acredita que só pelo senso comum equivocado de que a união seria proibida é que não se tem notícia de algum par que tenha tentado registrá-la formalmente. "Não está dito em lugar nenhum que os homossexuais não pode casar e não podem adotar uma criança", ressalta o juiz, admitindo que há um vazio, da jurisprudência.
"O caminho mais rápido para isso é provocar o Judiciário", sugere, ciente de que sua argumentação pode estar abrindo uma polêmica num País em que as diferentes confissões religiosas, contrárias à novidade, têm grande influência sobre a opinião pública.
O secretário-geral da organização não governamental Nuances Grupo Pela Livre Expressão Sexual, Célio Golin, considerou a decisão de Lorea como uma conquista. "Isso dá legitimidade política para os homossexuais e abre espaço para o Estado e a sociedade reconhecerem direitos em vez de marginalizar pessoas por sua opção sexual", avalia.