Esmail Pinto dos Santos há quatro anos extraía palmito ilegalmente no litoral do Paraná. Além disso, destruía a floresta da região e cultivava gengibre na área. Hoje, está arrependido do que fez. "Era para a sobrevivência. Não tinha consciência do que estava fazendo. Eu desmatava e ainda dava risada da árvore caindo", afirma. Mas depois de tantas atitudes erradas, Esmail está podendo recompensar tudo à natureza. Ele é guarda-parque da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), organização não governamental (ong) paranaense que controla três reservas ecológicas no litoral: Morro da Mina, Cachoeira e Itaqui. As duas primeiras estão localizadas em Antonina e a última perto de Guaraqueçaba.
Esmail acredita que, assim como ele, muita gente parte para o extrativismo irracional por não ter opção de trabalho. "Às vezes estão fazendo porque não têm emprego em outra coisa. Ninguém vai deixar os filhos com fome", explica. Atualmente, Esmail ajuda nos trabalhos de restauração da Mata Atlântica em áreas degradadas. Este caso mostra que, quando se trata de crimes ambientais, é possível a recuperação do infrator.
O arrependimento também surgiu na vida de Amantino Ferreira Pinheiro, auxiliar de reserva da SPVS, responsável por colher as sementes de árvores para a produção de mudas de espécies nativas. Por vinte anos, trabalhou em uma indústria que extraía palmito de forma ilegal em uma área perto de Morretes. Ele ajudava a fabricar o palmito em conserva. "A empresa foi multada e os donos tiveram que parar com tudo. Perdi o emprego e fiquei fazendo bicos até conseguir este trabalho, há cinco anos. Tudo é bem diferente porque hoje faço coisas boas e cuido da natureza", comenta Amantino.
O encarregado da Reserva do Itaqui, Marcos Andrioli de Souza, esclarece que existe uma tradição na comunidade litorânea quanto à exploração dos recursos naturais de forma irracional. A pessoa que começa nesse tipo de atividade se sente influenciada pela ação de amigos e familiares, que estão no "negócio" há anos. "Por isso estamos fazendo um trabalho de conscientização com a comunidade. É um trabalho a longo prazo, que precisa buscar alternativas de renda para a população."
O responsável pela Reserva Morro da Mina, Eros Amaral, conta que muitas pessoas da comunidade partem para o extrativismo inconsciente para ter uma forma de sustento. Hoje, com 70 postos de trabalho, a SPVS é a terceira maior empregadora de Antonina, perdendo apenas para a Prefeitura e o porto. A região tem um baixíssimo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). "Estamos mostrando que a conservação da natureza é uma boa alternativa de geração de emprego e renda. Se tiver oportunidade, a pessoa tem potencial de crescimento", declara. Ele defende a capacitação continuada, tanto para os funcionários locais da reserva quanto à comunidade em geral, para que a conservação da natureza seja a principal prioridade. "No futuro, a nossa intenção é que eles sejam multiplicadores da conscientização ambiental. Serão modelos para a mudança de atitude de vizinhos, amigos e parentes", observa Amaral.
Absorção de carbono por árvores em estudo
Áreas degradadas viram pastos
Criação de abelhas é uma das alternativas de renda
Uma das alternativas de renda que a SPVS está começando a desenvolver é a criação de abelhas jataí – espécie sem ferrão, em extinção no litoral do Paraná -, para a produção de mel. O alimento, segundo os funcionários da ong, tem propriedades medicinais para o aparelho respiratório. O projete prevê a implantação de meliponários (viveiros de abelhas) nas reservas Cachoeira, Morro da Mina e Itaqui. Outras espécies sem ferrão também estão sendo pesquisadas para o mesmo fim.
O responsável pela Reserva Morro da Mina, Eros Amaral, conta que "não será a salvação da lavoura", mas a criação vai ajudar a incrementar a renda da população local. O objetivo da entidade é fazer do litoral um pólo de renda e diminuir a carência da população, tudo por meio do uso racional da natureza. "Estamos procurando fazer os modelos e existe a demanda de conhecimento. Por isso, queremos firmar parcerias, como associações de apicultores", aponta. O mel utilizado atualmente na região é proveniente de outras regiões do Paraná e do País.
Alguns modelos de viveiros já foram construídos e as iscas para atrair as abelhas estão sendo pesquisadas. As abelhas são de porte muito pequeno, quase confundidas com outros insetos e bem diferentes das encontradas no meio urbano. A espécie jataí é uma das responsáveis pela polinização das florestas do litoral.
A criação das abelhas também vai ajudar na preservação da espécie. O projeto está sendo executado em duas fases. Na primeira, que começou em junho, funcionários de todas as reservas da SPVS passam por cursos de capacitação para a identificação das espécies de abelhas, conservação das ameaçadas de extinção, criação, coleta e a própria produção de mel. A segunda etapa atingirá as comunidades perto das reservas.
Banana
Amaral lembra que outra alternativa de renda que já está sendo colocada em prática é a produção de bananas orgânicas, em parceria com a Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento, Empresa Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) e municípios. "Consiste em transformar a propriedade em parâmetros ambientalmente corretos, sem a utilização de agrotóxicos. Já apoiamos 140 produtores, que receberam a certificação de propriedade com a qualidade de produto orgânico", relata. A banana já é muito cultivada no litoral, em função do clima e solo propícios. (JC)
Um dos objetivos da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) é a restauração da cobertura original de áreas degradadas, principalmente para a abertura de pastos. Elas estão sendo recuperadas com o plantio de mudas de espécies da região. Todo o trabalho é realizado por meio de um sofisticado Sistema de Informações Geográficas (SIG), que monitora e orienta os profissionais envolvidos.
O responsável pela Reserva Morro da Mina, Eros Amaral, conta que algumas áreas que foram destruídas não poderiam ter passado por esse processo, como as encostas de morros com mais de 45 graus de inclinação. Nestes e em outros locais, a restauração florestal está sendo aplicada. O serviço começa com geração de imagens de satélite, que identificam as áreas degradadas. Elas são cruzadas com informações sobre o tipo de solo, topografia, declividade e vegetação. A partir disso, se estabelecem polígonos, ou seja, áreas com características semelhantes. "Conseguimos analisar como era a paisagem original e o processo para a restauração", conta.
Após essas constatações, os técnicos da SPVS definem que tipo de espécie será plantada, em qual época, com quais métodos e a periodicidade de manutenção. "A pastagem cresce mais que a muda. Assim, é preciso manutenção em cada plantio. Até atingir a altura que a árvore consegue vencer o pasto, há manutenções em 4 ou 5 vezes de monitoramento. A muda passa a competir de igual para igual com o pasto", afirma Amaral. Todo o trabalho é feito sem nenhum tipo de química. O esforço é maior e requer um grande contingente de mão-de-obra, mas os resultados são bem melhores. A recuperação também ajuda no combate à erosão.
O planejamento na produção de mudas acontece após definidos todos os critérios e necessidades para o trabalho de restauração. A meta é plantar mais de um milhão de mudas em 1,5 mil hectares distribuídos nas três reservas até 2009. O reflorestamento começou em 1996 e, até agosto deste ano, já haviam sido plantadas aproximadamente 350 mil árvores nativas da região.
O primeiro passo para este processo é a coleta de sementes. Muitas vezes, o serviço necessita de técnicas de rapel para atingir a copa das árvores. A produção de mudas começou com 36 espécies nativas diferentes, mas depois de alguns estudos sobre crescimento, são utilizadas 24 espécies em média, dependendo do ano. Entre os principais tipos, estão: pixiricão, pixiriquinho, guapuruvu, bocuva, guamirim, tapiá, baguaçu, aleluia, pau de tamanco e maricá. Depois de coletadas, elas são limpas e, conforme a espécie, podem ser armazenadas em geladeira até cinco anos. "Mas algumas já precisam ser plantadas assim que se colhe", afirma o auxiliar da reserva Luiz Carlos Bertholdi Pinheiro.
O passo seguinte é a colocação da semente em tubetes. Algumas espécies com 100% de germinação já vão direto para esta forma. Outras, no entanto, são plantadas em sementeiras (um tanque com areia). As que conseguem germinar são repicadas, ou seja, retiradas da sementeira e postas nos tubetes. Na terceira etapa, as mudas são colocadas em uma estufa por, no máximo, 30 dias. Depois, ficam distribuídas em quatro seções. Aos poucos, a quantidade de água para a irrigação é diminuída para que a planta seja adaptada para as condições no meio da floresta. "Se não fizer isso, a planta acaba morrendo por não se acostumar com o clima", indica Bertholdi. No último setor, quando as mudas já estão prontas para o plantio, elas atingem cerca de 22 centímetros. Com essa altura, as chances de crescerem na floresta é bem maior. Da estufa até a última etapa, há a demora de três meses, em média. Atualmente, estão sendo cultivadas 100 mil mudas no viveiro da Reserva Morro da Mina. A meta é produzir 300 mil mudas nas três reservas da SPVS por ano. "Por isso necessitamos cultivar espécies que crescem muito rápido", comenta Bertholdi.
As plantas são colocadas em grades com capacidade para 1.131 mudas para o transporte. Com um caminhão pequeno, é possível fazer a locomoção sem problemas. O único inconveniente é o vento. "Precisa ir muito devagar ou cobrir com uma lona, senão as mudas queimam, como se tivessem sofrido com a geada", informa o auxiliar. (JC)
O aquecimento global é uma das preocupações mundiais na questão sobre o meio ambiente. Muitos estudos ainda estão sendo realizados neste segmento, principalmente quanto ao seqüestro de carbono das árvores. Os créditos de carbono serão moedas de comércio entre os países para o cumprimento das metas de redução dos níveis de gás carbônico, conforme determina o Protocolo de Kyoto.
A coordenadora de monitoramento de carbono da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS), Marília Borgo, explica que a entidade está realizando o estudo do crescimento das árvores da região para verificar o quanto absorvem de carbono. "Cinqüenta por cento do peso da árvore é referente a carbono absorvido", observa. A medida inicial é para ver o quanto as espécies nativas estão crescendo, o que também ajudará no repasse de informações para a restauração das florestas. A quantidade de carbono absorvida será detectada a longo prazo.
A ong já instalou diversas parcelas (áreas delimitadas com espécies e tamanhos diferentes com identificações) nas três reservas para o estudo do crescimento. As parcelas serão medidas durante 40 anos, com intervalos de cinco. Dentro dessas amostragens, poderá se verificar quanto há de biomassa na árvore. Os resultados são inseridos em uma equação matemática, que resulta em quantas unidades de carbono serão absorvidas pela planta. O estoque depende da vegetação, mas os primeiros índices mostram que se pode alcançar entre 25 e 50 toneladas de carbono por hectare inicialmente. Em certos casos, a quantidade varia entre 160 e 300 toneladas por hectare. (JC)
