Sempre tão preocupado com os empregos brasileiros, que escasseiam, o governo do presidente Lula da Silva acaba de tomar uma medida que vem em oposição a esse discurso. E a tomou sem o necessário debate que deve envolver uma decisão como essa, pelas conseqüências que deflagra. Falo da queda gradual do imposto sobre exportações de couro wet blue – que não conta com agregação de valor e é comercializado em estado praticamente bruto. Ao tomá-la, o governo retrocede ao colonialismo, em vez de preparar o País para o desenvolvimento.
Vigente desde 2000, após muita luta do setor coureiro/calçadista, que representa sete mil indústrias brasileiras onde trabalham mais de 500 mil pessoas, a taxação de 9% sobre o blue exportado buscou reequilibrar as condições de competitividade dos produtos acabados brasileiros com a concorrência internacional, já que, com ela, o importador deixava de ter preferência tarifária na aquisição do produto bruto. Segundo maior produtor de couros no mundo, em célere direção à primeira colocação, o Brasil, com a taxação então vigente preservava sua economia, porque seus principais compradores – China, Itália, Portugal, Espanha e Cingapura – são, igualmente, seus maiores concorrentes e não faz sentido fornece-lhes matéria-prima para que, manufaturada, passe a disputar mercados com calçados e artefatos brasileiros.
O wet blue é um processo de conservação de couros em primeiro estágio industrial, ligeiramente curtido, que pouca mão-de-obra exige, e sem maiores especializações. Já a sua transformação pela indústria requer tecnologias mais sofisticadas e profissionais preparados. Observe-se que, ao exportar o couro semibruto, o Brasil deixa em seu território os rejeitos do processamento industrial inicial, impondo portando um custo ecológico, enquanto gera no exterior os empregos que tanto fazem falta aqui, contradição que se completa com o aparelhamento de seus concorrentes. Não há agregação de valor nem de tecnologia quando se vende para fora do País o couro sob essa forma, a um preço médio de US$ 30,00 a peça, contra os US$ 90,00/peça que passa a valer depois do acabamento definitivo.
O que justifica a medida ora tomada pelo governo – que vai reduzindo gradualmente esse imposto, até extingui-lo completamente em 2006? É estranho, muito estranho, que as autoridades brasileiras tenham optado por esse caminho que sonega empregos de seus cidadãos. E mais estranho, ainda, que a medida surja na calada da noite, em silêncio, sem consultar as entidades representativas dos setores ligados ao assunto.
Frente a isso tudo, é lícito perguntar: será que o presidente Lula da Silva tem conhecimento das conseqüências econômicas e sociais da medida que seu governo acaba de tomar?
Amadeu Pedrosa Fernandes é presidente do Centro das Indústrias de Curtume do Brasil.
