Entra janeiro e todo mundo já sabe: os boletos chegam e não tem como escapar. Como no Brasil quase tudo vira piada, pela internet, as gracinhas correm soltas. Ao invés de “Sorria! Você está sendo filmado”, uma placa diz: “Sorria! Seu Ipva está chegando”. Uma charge satiriza: “Depois do Outubro Rosa e do Novembro Azul, é a vez do Janeiro Vermelho”. E pros fãs do Chaves, quem dá o recado é seu Madruga: “Olha, eu sempre fui pobre. Mas esse mês eu tô de parabéns”. O problema é que fora das redes, o pagamento dos impostos nesse início de ano não tem nada de divertido. Ainda mais quando a conta vem mais alta que o esperado e a cobrança aparece “de surpresa”. É o que tem acontecido com muita gente em Curitiba e Região Metropolitana na hora de conferir o carnê do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), que agora traz discriminado separadamente o valor da Taxa de Coleta de Lixo (TCL).
Morador do bairro Sítio Cercado há 40 anos, o vendedor Carlos Augusto Gomes, 57, levou um susto ao abrir o boleto do IPTU essa semana. O valor cobrado, 873% mais alto, assusta quando colocado em números: de R$33,80 para R$ 295. Muita gente, no entanto, faz confusão e acha que o aumento foi no valor do imposto. O que acontece, na verdade é que a cobrança da taxa de lixo, a partir desse ano, passará a ser feita separadamente do IPTU. E quem pensa que está livre do pagamento devido à isenção do imposto predial, se engana. Todo o mundo terá de pagar. “É um absurdo. Sempre pagamos aquele valor e agora teremos esse gasto, muito maior, a mais”, reclama o vendedor.
Aprovado em setembro do ano passado, o projeto de lei que desvincula a TCL do IPTU, é parte do pacote de ajuste fiscal chamado “Plano de Recuperação de Curitiba”, enviado pelo prefeito Rafael Greca (PMN) à Câmara Municipal no fim de março passado. A medida foi homologada sob a justificativa de que a cobrança igualitária do tributo contribuiria para diminuir o déficit do município com o serviço. Com a nova forma de cobrança, o pagamento da taxa se torna obrigatório para todos, inclusive para aqueles que têm alguma isenção ou abatimento do IPTU – que antes limitava o valor da taxa de lixo.
De acordo com o diretor do Departamento de Rendas Imobiliárias da Secretaria Municipal de Finanças da Prefeitura, Sergio Luiz Primo, a desvinculação da cobrança aconteceu por conta da necessidade de arrecadação por parte de administração municipal de valores suficientes para o pagamento dos serviços, que incluem não apenas a coleta do lixo, mas toda a destinação dada aos resíduos. O gestor explica que os valores arrecadados durante o ano passado, por exemplo, não davam conta das despesas totais, e o valor faltante era desembolsado pela própria Prefeitura. “O tratamento do lixo não se resume somente à coleta, mas também ao transporte, destinação final, manutenção dos aterros, pagamento dos funcionários, enfim. O custo total do serviço chegou a R$ 200 milhões no ano passado. Em contrapartida foram arrecadados apenas R$120 milhões”, revela. Para suprir a defasagem de cerca de R$80 milhões, a própria administração municipal “completava” os valores. Mas agora, com a nova forma de cobrança, espera-se reduzir esse déficit, cobrando de forma igualitária dos contribuintes.
Polêmica, a medida afeta quase metade dos imóveis de Curitiba e as cerca de 100 mil unidades imobiliárias que não pagavam a taxa de lixo até o ano passado – como clubes, igrejas, associações e imóveis públicos, por exemplo – agora passam a arcar com a despesa. Fixados em R$ 275,40 para imóveis residenciais e R$ 471,60 para os não residenciais, os valores podem ser pagos à vista, com desconto de 4%, até o dia 9 de fevereiro, ou parcelados em 10 vezes, até novembro. Para quem já pagava a taxa integralmente, nada muda. Já para os chamados “imóveis simples” (até 70 metros quadrados com valor venal de até R$ 140.000,00), o valor poderá ser abatido em 50%, uma vez que são considerados “imóveis de baixa renda”.
Se para alguns a medida é considerada abusiva, pra outros a decisão é justa, uma vez que todos produzem lixo, independente do tamanho ou do valor do imóvel. Mesmo descontente com o valor da taxa, o advogado João Carlos Oliveira, morador do Bairro Alto, considera a medida razoável. “Não acho incorreto desvincular o valor da taxa de lixo, do IPTU. Todos os imóveis devem pagar, porém seria mais justo se o valor fosse cobrado proporcionalmente à quantidade de resíduos e à frequência das coletas, já que alguns bairros recebem mais visitas dos caminhões de lixo”, afirma.