Fim da mamata?

Fim da contribuição sindical pode acabar com sindicatos “fantasmas”

Muitos sindicatos de “gaveta” podem “morrer” caso não consigam convencer trabalhadores a custeá-los voluntariamente. Foto: Arquivo

A reforma trabalhista – aprovada na Câmara dos Deputados no final de abril e que aguarda votação no Senado, onde passou pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) na terça-feira passada – pode acabar com a contribuição sindical obrigatória. Ou seja, o trabalhador só deverá custear o sindicato que o representa se quiser.

Com isto, muitos sindicatos de “gaveta”, abertos apenas para embolsar a contribuição dos trabalhadores e engordar os patrimônios pessoais de seus dirigentes, podem “morrer” caso não consigam convencer sua categoria de trabalhadores a custeá-los voluntariamente.

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Professora de direito do trabalho da Universidade Positivo, Alessandra Boskozic é a favor de tirar a obrigatoriedade da contribuição. Os sindicatos de fachada terão que trabalhar para tornar a instituição atrativa à categoria e fazer os trabalhadores se interessarem em pagar a taxa associativa (voluntária).

“Se o trabalhador quiser, filia-se e paga”, diz Regina, presidente da CUT Paraná. Foto: Albari Rosa
“Se o trabalhador quiser, filia-se e paga”, diz Regina, presidente da CUT Paraná. Foto: Albari Rosa

“Hoje, o que vemos, são muitos sindicatos acomodados porque o dinheiro está garantido na lei, vem fácil, sem nenhum esforço”, diz ela, que acredita que as entidades terão que criar bons serviços e atuar forte nas negociações coletivas salariais e por melhores condições de trabalho. Hoje, a contribuição corresponde a um dia de trabalho e é descontada uma vez por ano, na folha de março.

Contribuição voluntária

Regina Cruz, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no Paraná, apoia o fim da contribuição sindical obrigatória. “Desde a fundação da CUT, em 1983, somos contra esse imposto. Se o trabalhador quiser, filia-se e paga”, diz. Ela lamenta os sindicatos de “gaveta”.

“A CUT não concorda com isso. Defendemos entidades que vão pra rua batalhar pelos direitos do trabalhador. Com o fim da contribuição obrigatória, será a morte dos sindicatos fantasmas”, diz ela, mostrando como bom exemplo a APP-Sindicato, que é a entidade que representa os trabalhadores em educação pública do Estado. “Ela tem uma base de 150 mil trabalhadores, dos quais 70 mil são voluntariamente filiados à APP”, exemplifica.

Contribuição espontânea

- “Fazemos um trabalho na base, convencendo cada trabalhador”, diz Marlei. Foto: Arquivo
“Fazemos um trabalho na base, convencendo cada trabalhador”, diz Marlei. Foto: Arquivo

Marlei Fernandes, diretora da APP-Sindicato, explica que em 70 anos de existência a entidade nunca recebeu o imposto obrigatório. “Temos uma lei estadual que desobriga os servidores estaduais a pagar a contribuição sindical. Portanto, não vivemos da taxa obrigatória. E sim daquilo que é dado pelos associados, pois fazemos um trabalho na nossa base, convencendo cada trabalhador a ajudar no sustento de sua identidade. Por isso, estamos muito tranquilos com este ponto da reforma trabalhista”, diz.

Muitos sindicalistas não recebem jetons por serem diretores de sindicatos, pois vários fazem acordos com as empresas do ramo para que o funcionário, licenciado para exercer a atividade sindical, continue recebendo o salário da empresa.

Serviços prejudicados

Paulo Rossi, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) no Paraná, é contra o fim da contribuição obrigatória. Mas, se isto for aprovado no Congresso Nacional e sancionado como lei pelo presidente da República, ele defende que a regra passe por uma transição de cinco anos, para que os sindicatos encontrem outras formas de custeio.

Ele lamenta que a atual arrecadação obrigatória do imposto sindical contribua para a existência de sindicatos “fantasmas”, meramente arrecadatórios, e rechaça veementemente isto. No entanto, explica que uma parte deste valor arrecadado vai para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Parte do valor arrecadado com a controbuição sindical obrigatória vai para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Foto: Arquivo
Parte do valor arrecadado com a contribuição sindical obrigatória vai para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Foto: Arquivo

Dos R$ 3,5 bilhões arrecadados ano passado, diz o sindicalista, R$ 500 milhões foram para o MTE. Parte vai para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que custeia programas sociais (seguro-desemprego, abono salarial, financiamento de ações para o desenvolvimento econômico e geração de trabalho, emprego e renda), e outro tanto é enviado às Superintendências Regionais do Trabalho.

O dinheiro banca a estrutura administrativa das superintendências e alguns serviços, como por exemplo, a emissão de carteiras de trabalho. “Sem esse dinheiro, os serviços ficarão prejudicados. O governo anda reclamando que não tem dinheiro pra nada, então onde o relator desta reforma trabalhista vai achar dinheiro pra bancar estes serviços ao povo? As pessoas vão ficar sem carteira de trabalho, vão deixar de procurar empregos formais e a economia vai sentir isto”, analisa o sindicalista.

Infografia Tribuna
Infografia Tribuna

Unicidade ou pluralidade?

Existem dois regimes sindicais no mundo: o de pluralidade e o de unicidade. Nos países mais desenvolvidos, diz a professora Alessandra Boskozic, o regime é o de pluralidade, ou seja, há vários sindicatos que podem representar uma mesma categoria. E os trabalhadores e patrões têm a liberdade de criar quantos sindicatos acharem necessários e escolher qual deles os representará.

Já na unicidade sindical, que é o que determina a legislação brasileira, uma categoria profissional só pode ser representada por apenas um sindicato. Não podem, por exemplo, existir dois ou três sindicatos de taxistas numa mesma base territorial.

Segundo Luiz Fernando Busnardo, chefe da seção de relações do trabalho, da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Paraná (SRTE PR), a base territorial mínima é um município. Ou seja, pode existir, por exemplo, um sindicato de cozinheiros em Curitiba, outro em São José dos Pinhais, outro em Araucária (ou um só da Grande Curitiba), outro em Londrina, em Foz do Iguaçu e quantos a categoria achar necessário. Pode até existir um único sindicato de cozinheiros no Brasil todo. O que não pode é existir dois sindicatos de cozinheiros na mesma cidade.

“Essa unicidade é a grande vilã de termos sindicatos tão inertes. Por lei, o dinheiro deles está garantido mesmo. Se houver mais do que um sindicato representando uma mesma categoria, eles terão que arregaçar as mangas para convencer os trabalhadores a filiarem-se a ele”, analisa a professora Alessandra Boskozic.

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