Cotado para ministro da Educação, Renato Feder, secretário estadual da pasta no Paraná, tem como principal cartão de visita para o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), com quem se reúne nesta terça-feira (23), a visão liberal de mercado, o empreendedorismo, o apoio de aliados do presidente, e a experiência no setor de educação – cuja gestão virou um desafio ainda maior em meio aos obstáculos trazidos pelo coronavírus. A pandemia parece ser, inclusive, o ponto mais relevante em que ele destoa do governo federal.
No Paraná, que adotou várias restrições de atividades por causa da Covid-19, Feder trabalhou com a suspensão das aulas presenciais – substituídas por estudos on-line, e defende a gravidade da pandemia. Foi o que ele declarou em 2 de abril, em uma webconferência, a primeira após a suspensão das aulas.
“A primeira coisa que eu queria falar é sobre a situação do coronavírus em especial. É uma calamidade pública, eu tive na minha família. Meu irmão pegou, meu pai pegou e minha mãe pegou. Sendo que meu pai e minha mãe são do grupo de risco. Então é uma situação muito muito complexa, que eu senti na pele. O mundo foi contaminado por esta nuvem negra, uma situação horrível que demanda de todos nós muita responsabilidade e muita serenidade e decisões muito complexas que mexem no nosso coração”, afirmou.
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O quanto esse pequeno detalhe vai pesar na corrida pelo cargo é uma incógnita. Jair Bolsonaro, crítico ferrenho do isolamento social decretado por governadores e prefeitos, receberá o gestor paulista em Brasília para a conversa que pode definir o substituto de Abraham Weintraub – ele deixou o Ministério da Educação (MEC) no sábado (20), após voar para os Estados Unidos com a indicação de ocupar uma diretoria no Banco Mundial.
Feder soma muitos pontos com empresários, militares e políticos alinhados a Bolsonaro. Aos 41 anos e com carreira no setor privado, o secretário estadual tem um perfil empreendedor e liberal. Em seu currículo consta que ele é administrador, mestre em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), e tem experiência como docente na Educação de Jovens e Adultos, bem como na direção de uma escola em São Paulo. Também assessorou a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, enquanto comandava com o amigo e sócio Alexandre Ostrowiecki a empresa de tecnologia Multilaser, que atingiu faturamento acima de R$ 2 bilhões em 2017.
A dupla parece ter mão para projetos com grandes cifras: criou o Ranking dos Políticos, que desde 2010 elenca notas a parlamentares, de acordo com sua performance – quanto mais liberal, mais destaque. Hoje a página no Facebook do Ranking dos Políticos acumula 2 milhões de seguidores. Segundo reportagem da Folha de S. Paulo em agosto de 2018, Feder se engajou no projeto ao sentir dificuldade em escolher um candidato a deputado federal. Atualmente, as cinco primeiras posições no Ranking são ocupadas por integrantes do Novo, partido que está rachado entre aliados e oposicionistas a Jair Bolsonaro.
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Mas é em outro partido, no Republicanos, que Feder tem padrinhos políticos que ajudaram a pavimentar o encontro com Bolsonaro. É nessa sigla que estão os filhos do presidente Flavio, senador, e Carlos, vereador no Rio de Janeiro. No Paraná, o Republicanos é comandando por Valdemar Bernardo Jorge, secretário estadual do Planejamento e amigo do secretário da Educação. No fim de maio, Valdemar fez uma live no Instagram com Feder para debater a educação do futuro.
Pelas informações extraoficiais, a ala militar aderiu ao nome de Feder por ser um técnico, o que poderia ajudar a compor um ministério de “notáveis” com capacidade de execução, distanciado-se de conflitos e embates com a sociedade civil organizada e outros Poderes.
A Secretaria Estadual da Educação e do Esporte (Seed) não confirmou informações sobre o encontro com Bolsonaro. Entretanto, em sua página no Facebook, Feder fez ontem uma atualização da foto do perfil, com a mensagem “juntos pela educação”. Segundo fontes próximas, ele estaria inclinado a assumir o MEC, com a anuência do governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) – apesar das medidas de isolamento social no estado, ele sempre tentou manter o clima de cordialidade com o presidente da República, do qual é um importante aliado.
Agilidade de empresário
A experiência como executivo de empresa de tecnologia deu a Feder um senso de urgência que nem sempre é visto na gestão pública. Em 2 de abril a Seed já anunciava a preparação de um sistema de Educação a Distância para atender aos alunos da rede estadual. Mas muitos foram pegos de surpresa quando as aulas começaram, já na segunda-feira seguinte, em 6 de abril, por meio de aplicativo de celular e transmissão via canal de televisão aberta.
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O início foi tumultuado mas, posteriormente Feder defendeu a iniciativa, dizendo que era melhor lançar o programa e ir ajustando ao longo do tempo. Uma grande dificuldade foi relatada por famílias mais vulneráveis, que não tinham como acessar conteúdo via celular, nem sinal digital na televisão para captar o canal, e preferiam pegar material impresso mas não estavam conseguindo. Após a divulgação desses casos, a Seed aprimorou a busca ativa de alunos que não estavam acompanhando as aulas e realizou pesquisas com pais e alunos sobre possibilidades de melhorias.
Legado
Em março de 2019, a revista Nova Escola entrevistou Feder, dentro de uma série sobre todos os secretários estaduais. Para a questão sobre o grande desafio da Seed, Feder respondeu: “O grande desafio é o professor se sentir valorizado e apoiado na hora de dar aula. Eu entendo que a Educação passa por muitos pontos, mas o principal momento de aprendizagem é a aula – começa no minuto 1 e termina no minuto 50, e aquela interação pode ser produtiva, gostosa, de aprendizado, de troca, ou pode ser bagunçada, desinteressante, com alguns alunos aprendendo e outros não. E quando o professor entra para dar aula, o ambiente é muito desafiador. Então a gente tem que ajudar o professor em dar uma boa aula”.
A relação com os professores, entretanto, tem sido um pouco tumultuada pelas dificuldades impostas pela pandemia: alguns professores não se sentiam preparados para dar aulas on-line. A Seed, porém, celebra os altos números de adesão de professores e alunos ao aplicativo Aula Paraná: são 100% dos professores e 99% dos estudantes, segundo informações publicadas nesta segunda-feira (22). Outra conquista foi o recorde de inscritos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2020: 53.180 alunos da rede estadual, contra 38 mil em 2019, segundo a Seed.
Na entrevista à Nova Escola, Feder também deixou claro seu viés liberal, ao propor mais parcerias entre rede pública e privada, como por exemplo para formação continuada de docentes. Ele se disse contra a prática de pagamento de bônus a professores e defendeu mais promoções como forma de valorizar os docentes. Também pretendia engajar mais alunos e professores de forma a propiciar aulas mais atrativas, reduzindo a evasão, principalmente no ensino médio. À revista ele destacou também a importância do diretor de escola – se não houvesse impeditivo financeiro, ele disse sonhar com diretores “ganhando muito bem”, pois “se o diretor não estiver a fim, nada acontece”.