Bomba relógio?

Risco iminente: motoristas de ônibus de Curitiba estão à beira do colapso

Foto: Átila Alberti/Tribuna do Paraná

Depois de eventos recentes envolvendo acidentes com motoristas de ônibus em Curitiba, é certeiro começar a questionar como anda e como é feito o acompanhamento da saúde mental dos cerca de 2,5 mil motoristas que circulam pela capital paranaense.

Em 30 de agosto, o motorista de um biarticulado perdeu o controle e destruiu uma plataforma de embarque no Terminal do Boa Vista, em Curitiba. O ônibus estava sem passageiros, mas duas pessoas que estavam na estrutura de embarque ficaram feridas. Mais recente que isso, no dia 9 de setembro, uma batida entre dois ônibus deixou mais de 40 pessoas feridas no Centro de Curitiba.

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Não se pode afirmar que os acidentes foram causados por algum tipo de excesso ou cansaço vivido por esses funcionários. Mas o fato é que ser motorista de ônibus é uma profissão que exige muito por vários motivos: a responsabilidade de transportar muitas pessoas; o estresse de aguentar um trânsito caótico por várias horas e todos os dias; a cobrança das empresas para que o tempo seja cumprido; o risco de sofrer um assalto a qualquer hora do dia; e até mesmo as reclamações dos passageiros sobre as mais diversas questões.

Em Curitiba, os motoristas têm uma jornada de trabalho exaustiva, que frequentemente ultrapassa o horário programado da escala. Aos finais de semana, muitos motoristas revelam trabalhar duas, até quatro horas a mais que o combinado.

Profissão desgastante

Apresentado em abril deste ano, um levantamento do Conselho Nacional de Saúde, que pertence ao Ministério da Saúde, mostra que entre 2006 e 2022 foram registradas quase 18 mil notificações por transtornos mentais relacionados ao trabalho no Brasil. Esse diagnóstico também aponta que motorista de ônibus está entre as profissões mais atingidas por agravos na saúde mental. Para resolver esse problema, o Conselho Nacional de Saúde aponta como estratégia mais políticas públicas sobre o tema e maior integração com os sindicatos.

Foto: Átila Alberti/Tribuna do Paraná

A falta de dados sobre a saúde mental dos motoristas prejudica o dimensionamento do problema na capital paranaense. O Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba (Setransp), por exemplo, não reúne dados sobre o afastamento de motoristas em casos de desgaste mental ou físico. Já a Urbanização de Curitiba S/A (Urbs), que também não possui dados, nem sempre é informada sobre os afastamentos. O Sindicato dos Motoristas e Cobradores de Ônibus de Curitiba e Região Metropolitana (Sindimoc) também não tem essas informações.

Crise no trabalho fez motorista ficar afastado

Motorista de ônibus há 15 anos em Curitiba, Carlos* conta que há mais ou menos quatro anos passou por uma crise no trabalho e precisou ficar afastado por um ano e três meses. Vivendo uma rotina extremamente cansativa e sem acompanhamento nenhum, ele chegou no limite e precisou de tratamento com um psiquiatra para se reestabelecer.

“Eu não conseguia dormir à noite. Eu chegava em casa estressado mesmo, era muita canseira. Não dormia, pensava em trabalhar e já começava a dar um desespero”, revela.

Com uma bagagem de 30 anos como motorista, já que antes trabalhava como caminhoneiro, Carlos lembra do dia em que percebeu que estava no limite, exausto. Era uma noite de domingo, alguns passageiros entraram com som alto, bebidas alcoólicas e começaram a gritar dizendo que não havia regras no ônibus. Sem suportar mais a situação, Carlos desligou o veículo e fingiu que era uma falha mecânica.

“Eu não aguentava mais, estava suando frio. Tinha um ônibus atrás, passei todos os passageiros para ele e fui recolher o meu. Guardei e ninguém me perguntou nada nem pelo horário que estava recolhendo. Deixei na garagem e fui embora”. No outro dia, na segunda-feira, ele procurou o sindicato para receber um amparo médico.

Carlos se consultou e recebeu um atestado com tempo indeterminado. Esperando receber apoio quando foi conversar com o médico da empresa, Carlos apenas foi questionado pelo médico do motivo de não ter procurado ajuda antes.

“Francamente, eu lembro que quando entrei era só um exame médico bem simples. Exame bem fraquinho. Você só vai descobrir que tem alguma coisa depois de alguns anos com os sinais”.

Imagem aérea mostra ambulâncias, motociclistas aglomerados e ônibus desviando
Acidente no bairro Boa Vista movimentou diversas viaturas do Corpo de Bombeiros. Foto: Colaboração.

Situações desgastantes e traumas

Ser motorista de ônibus exige atenção, cuidado e responsabilidade. Por ser um trabalho que exige muito, Carlos acredita que os motoristas deveriam receber acompanhamento psicológico frequente.

A falta de sensibilidade com a saúde mental dos profissionais tem provocado indignação. Carlos lembra de uma situação marcante em que viveu. Nesses 15 anos como motorista, ele sofreu três assaltos. Em um deles estava com uma cobradora que entrou em estado de choque no momento do roubo. Carlos diz que ela ficou tão assustada que congelou e não conseguia dar o dinheiro para o assaltante.

Depois que o criminoso foi embora, a cobradora continuou abalada e não recebeu nenhum apoio da empresa. “Eu liguei para a garagem muitas vezes para perguntar o que eu fazia com o ônibus cheio e a cobradora em estado de choque. Eles falaram para continuar tocando porque não tinha ninguém para substituir. No outro dia ela estava trabalhando novamente, mesmo com medo”, relembra Carlos. Ele disse que a cobradora não recebeu nenhum suporte ou acompanhamento depois de sofrer o trauma.

O que dizem os envolvidos

O Sindicato das Empresas de Ônibus de Curitiba (Setransp) assegurou que as empresas fazem ações para falar sobre a saúde mental dos funcionários. “As empresas fazem ações, por exemplo, no Maio Amarelo. Como é uma ação de valorização da vida, ela engloba a saúde dos motoristas. Além disso, as operadoras atuam fortemente no Outubro Rosa e no Novembro Azul, com atenção ao câncer de mama e de próstata. O tema da saúde também está presente na Sipat (Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho).”

O Setransp também alegou que as empresas contam com um profissional de saúde nas garagens “para que ele preste auxílio aos motoristas sempre que necessário e promova ações de conscientização voltadas ao tema.”

A Urbanização de Curitiba (Urbs) informou que questões sobre saúde mental e física dos motoristas de ônibus fazem parte da atuação do Setransp.

Para saber o número de afastamentos de motoristas, a Tribuna também procurou oito empresas de ônibus que prestam serviço para Curitiba: Transporte Coletivo Glória, Auto Viação Mercês, Auto Viação Santo Antônio, Auto Viação Redentor, Viação Cidade Sorriso, Viação Tamandaré, CCD Transporte Coletivo e Auto Viação São José.

Destas, apenas a Auto Viação Redentor revelou que teve oito afastamentos por causas diversas entre julho de 2022 e agosto de 2023.

*Carlos é um nome fictício para preservar a identidade do motorista.

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