Anos atrás, consumir morango vinha sempre com um misto de sensações: o prazer em saborear a fruta e o receio de contaminação com resíduos de agrotóxicos. Isso porque era praticamente impossível produzir sem o uso de altas doses de defensivos químicos, já que o morango é uma das frutas mais suscetíveis a pragas e doenças.

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Nos últimos anos, porém, essa realidade mudou na região metropolitana de Curitiba. Um grupo de agricultores praticamente eliminou os agrotóxicos, o que foi possível devido a algumas técnicas de cultivo: ambiente protegido (estufa ou canteiros cobertos), plantio elevado (em bancadas), sistema semi-hidropônico (em substrato, com solução nutritiva) e o controle biológico de pragas.

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“O resultado foram plantas saudáveis e mais preparadas para ataques de pragas e doenças, o que permitiu diminuir e, em alguns casos, eliminar completamente o uso de químicos foliares, mesmo em sistemas não orgânicos”, explica Luís Gustavo Lorga, técnico do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR), que atende os produtores da região.

Plantas estão mais saudáveis e mais preparadas para ataques de pragas e doença, dizem especialistas. Foto: Ari Dias/AEN

Outra mudança importante foi a possibilidade de produzir quase o ano inteiro, com pequenas pausas fisiológicas. “Saímos do cultivo de variedades de dia curto, que produzem de setembro a dezembro, e optamos pelas variedades de dia neutro, que produzem quase o ano todo”, informa Lorga. Segundo ele, isso trouxe uma oferta mais constante de morango e permitiu ao agricultor um escalonamento mensal do seu rendimento.

Mulheres lideram a produção na RMC

Na região metropolitana de Curitiba, são as mulheres que estão à frente da produção de morangos, em sua maioria. E, para elas, o cultivo da fruta tem proporcionado um movimento inverso ao êxodo rural: a opção de trocar a cidade pelo campo. Foi o que aconteceu com Rosana Gabardo Pallu. Ela trabalhava como confeiteira na cidade de Mandirituba, mas o que queria mesmo era morar na área rural.

Há dois anos e meio conseguiu comprar um pequeno sítio e se mudou. Optou pelo cultivo de morango como fonte de renda. A experiência deu certo. Começou com 10 mil mudas e a produção da primeira safra foi vendida para grandes redes de supermercados do Paraná e Santa Catarina e para a merenda escolar de Mandirituba. “Não foi suficiente para atender toda a demanda”, diz.

Rosana trocou o trabalho de confeiteira na cidade para cultivar morangos no campo. Foto: Ari Dias/AEN

Rosana decidiu, então, reinvestir tudo o que ganhou com o moranguinho. Instalou mais uma estufa com mais 10 mil pés. O negócio deu tão certo que no começo desse ano o marido dela, José Marcos, que trabalhava como metalúrgico numa indústria, deixou o emprego e passou a trabalhar também na plantação da fruta. “Hoje vivemos do morango, moramos no campo, onde queríamos, somos os nossos próprios patrões, fazemos o nosso horário e estamos perto de nossa família”, diz Rosana, satisfeita.

Cátia Maria Adão de Oliveira cultiva 8 mil pés no município de Fazenda Rio Grande e colhe em torno de 800 quilos de morango por mês. “Faço o controle biológico de insetos, sem necessitar recorrer aos produtos químicos, na maioria das vezes”, conta. Ela diz também que produz o ano inteiro. “No inverno diminui um pouco a produção, mas não chega a parar”, afirma.

A agricultora também fez o caminho inverso, da cidade para o campo. Trabalhava como caixa numa loja de roupas na cidade e há quatro anos foi para o meio rural. “Minha vida melhorou muito”, diz. Ela conta que gosta de ter o próprio negócio e não ter que sair da região onde mora. Cátia também está ampliando o número de estufas para produzir mais.

Há cinco anos, a engenheira agrônoma Andrea Lefcovich cultiva morangos orgânicos com a marca ‘Delícias da Terra’, em Mandirituba.  Ela conta que estudou agronomia com o propósito de morar no sítio e plantar. “Vendo minha produção para o setor de orgânicos do Mercado Municipal de Curitiba, para alguns empórios e clientes particulares, sob encomenda”, revela. A produção não é suficiente para atender toda a demanda.

Andrea conta que a opção pelo cultivo orgânico foi por sempre acreditar ser possível uma agricultura mais natural. “O cultivo de orgânicos dá mais trabalho, exige atenção e mais horas à disposição. Mas, o valor de venda compensa”, informa a agrônoma. Ela vende o quilo de morangos a cerca de R$ 30, o dobro do valor pago pelo convencional.

Alto custo, mudas importadas e embalagens são entraves na produção

O extensionista do IDR, Luís Gustavo Lorga, diz que há ainda desafios a vencer na cultura do morango. “O custo do material usado na instalação das estufas já era alto e subiu muito na pandemia”, observa. Além disso, segundo ele, há uma dependência por mudas importadas e ainda faltam embalagens adequadas que mantenham o padrão e garantam a durabilidade da fruta.

Cultivo em estufas e sobre bancadas garantem plantas mais resistentes e produção o ano todo. Foto: Ari Dias/AEN

Instalar uma estufa para 10 mil mudas custava cerca de R$ 35 mil há dois anos, mas esse ano já está em torno de R$ 50 mil. Nessa área, é possível colher cerca de 600 quilos por mês no verão e, aproximadamente, 400 quilos por mês nos períodos menos quentes do ano.

O extensionista do IDR estima que o retorno do investimento vem em dois anos e que o lucro líquido para uma área com cultivo de 10 mil plantas fica em torno de R$ 5 mil mensais.

Em relação às embalagens, Lorga diz que as indústrias do setor ainda não desenvolveram um produto adequado à necessidade dos produtores. Sobre a dependência externa das mudas, o IDR-Paraná coordena um projeto que tem como objetivo o desenvolvimento de mudas nacionais da fruta.

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