A morte do agente de cadeia Eliel Schimerski Santos, em Colombo, durante fuga de presos, domingo, gerou grande crise entre a Polícia Civil e o sistema penitenciário. Num jogo de empurra, policiais civis querem que o governador Beto Richa tire urgentemente os presos de delegacias e resolva definitivamente o problema de policiais tomando conta de cadeias. Caso contrário, entram em greve. Do outro lado, os agentes penitenciários são contra o recebimento de 1.300 presos das delegacias para os presídios, conforme anunciou anteontem o governador, e também prometem paralisar as atividades caso isto aconteça. Eles alegam que não há mais espaço nos presídios, nem agentes penitenciários suficientes para cuidar de tanta gente.
O presidente do Sindicato das Classes Policiais Civis (Sinclapol), André Gutierrez, disse que os policiais vão paralisar hoje, por 24 horas, as atividades em todas as delegacias do Paraná. Com exceção do atendimento a homicídios, quase nenhum outro serviço deve funcionar. Pessoas que quiserem registrar boletim de ocorrência devem fazê-lo pela internet (www.delegaciaeletronica.pr.gov.br) ou voltar no próximo dia.
Policiais militares que fizerem prisões em flagrante serão atendidos pela equipe de plantão. “Mas os policiais vão só fazer o flagrante, botar os presos de volta na viatura da PM e mandar os policiais entregarem lá na Seju (Secretaria de Justiça). O sangue do Eliel e do Gogola (investigador morto ano passado em Campo Largo) está escorrendo nos dedos da Maria Tereza (secretária de Justiça). Isso é uma falácia que eles criaram (esvaziamento das delegacias) e que resolvam então”, desafiou Gutierrez.
Às 18h30 de amanhã a categoria vai se reunir em assembléia para analisar a proposta que o governo vai divulgar, sobre como pretende resolver o problema de presos em delegacias, e decidir se entra em greve.
Agentes
O vice-presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários (Sindarspen), Antony Johnson, está mobilizando os agentes para manifestação em frente ao Complexo Penitenciário de Piraquara, a partir das 8h de amanhã. Eles são contra o anúncio do governador Beto Richa de antecipar o projeto de esvaziamento das delegacias, transferindo de uma só vez 1.300 homens para três presídios em Piraquara. Segundo Johnson, a superlotação nestas cadeias (a PCE, por exemplo, deve passar de 2 mil detentos) resultará na precarização dos serviços e na insatisfação dos presos, que podem se rebelar e atentar contra a vida dos agentes.
Só quem fica sabe o que passa
Depois que a delegacia fecha as portas ao público e o setor administrativo vai embora, a noite é bastante longa e sofrida para quem fica de plantão, cuidando dos presos. “Ficamos 100% do tempo tensos, com os nervos à flor da pele”, disse um investigador da região metropolitana, que não quis ter o nome divulgado. Ele conta que, durante a noite, fica somente ele e um agente de cadeia tomando conta de 81 presos.
A tensão não acaba com o plantão. “Em casa, quando estou dormindo, sonho que estou na delegacia. Qualquer sirene que ouço perto da minha casa me acorda e penso que estou no meio de uma ocorrência (rebelião). Minha ex-mulher já sonhou diversas vezes que eu morria. Já sonhei várias vezes que era baleado”, relatou o policial.
Apesar do medo da profissão, tem receio de mudar para emprego mais tranquilo, mas não conseguir ter o mesmo salário para sustentar os filhos.
Despreparo
O investigador conta que o agente de cadeia, que não tem porte de arma e qualquer preparo para o serviço, precisa estar o tempo todo escoltado pelo policial para distribuir as refeições, recolher os restos das comidas e os lixos e fazer movimentações de presos.
“Se algum preso consegue escapar para o corredor numa hora destas, a única opção que eu tenho é reagir. Lá em Colombo, por exemplo, se, o policial não reage, todo mundo lá dentro tinha morrido. Trabalhei com o Eliel. Ele estava no último semestre de Direito. Sonhava em deixar o serviço de agente e advogar”, lamentou o policial.
Sons e fúria
Os barulhos que vêm da carceragem durante a madrugada são de assustar. O investigador conta que os presos batem nas paredes a noite toda e nem sempre é possível saber se estão quebrando alguma coisa.
Eles também passam madrugadas cantando pagode ou fazendo cultos fictícios, para abafar quebradeira, escavação ou as grades sendo serradas. “Na cadeia, eles passam 24 horas pensando em fugir. Nós ficamos 24 horas em total prevenção. Se eu errar, pago com a vida”, lamentou o investigador.
Para ele, se tirarem os 81 presos que estão na carceragem da delegacia, nos dias seguintes, outros 80 ocupam as celas.