A Prefeitura Municipal de Curitiba prorrogou até 30 de setembro o decreto municipal que suspende as aulas presenciais na rede municipal de educação (Centros Municipais de Educação Infantil – CMEIs – Centros de Educação Infantil – CEIs – e escolas municipais) por conta da pandemia de covid-19 que atinge a cidade.
Mas para a secretária municipal de Saúde, Márcia Huçulak, algumas escolas já poderiam estar funcionando. Em entrevista à Gazeta do Povo, Huçulak afirmou que, pelo menos algumas escolas e creches deveriam ter ficado abertas durante a pandemia para atender às crianças vulneráveis e aos pais e mães que seguiram trabalhando nos serviços essenciais.
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“Eu acho que a sociedade não fez uma discussão que é vital. Eu entendo que, para aquela mãe classe média, classe média alta, que está em home office, que tem em casa um bom computador, uma boa internet, se não quiser que não volte. Mas a gente trabalha muito com vulnerabilidade em saúde. E, quando penso na escola pública, é diferente. Para os pais poderem trabalhar, essas crianças estão sendo largadas na vizinhança, sabe Deus como. Às vezes era a única alimentação equilibrada que elas tinham. Tinham atividades lúdicas, tinham aprendizado. Sem à escola elas estão expostas ao abuso, à violência”, disse.
A secretária contou que, durante a montagem do plano de contingenciamento para o enfrentamento da pandemia, ouviu pedido dos hospitais e tentou, sem sucesso pautar a discussão sobre a manutenção do funcionamento de algumas creches e escolas, “para os filhos dos trabalhadores dos serviços de saúde, do pessoal da limpeza, da segurança da recepção, que não tinham com quem deixar seus filhos e precisavam ir trabalhar. Agora, essa demanda aumentou, com muito mais gente trabalhando fora de casa já. Como essas pessoas estão fazendo hoje? Quem quer e pode manter o filho estudando em casa, que mantenha, mas e essa mãe que não tem alternativa e que está sem voz na sociedade?”, questionou.
“Eu tentei colocar isso em pauta, de abrirmos algumas escolas, para casos específicos, para dar suporte para as mães que são arrimo de família, para crianças que não têm internet e computador para fazer estudo em casa, mas fui massacrada”, acrescentou.
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A secretária citou que em países da Europa, a educação foi um dos primeiros serviços a serem retomados e disse que, do ponto de vista epidemiológico, a volta às aulas para uma fração dos alunos, com rígidos protocolos, representaria pouco risco. “Do ponto de vista epidemiológico, essa discussão poderia ser feita, mas do ponto de vista de sociedade, nós falhamos em não fazê-la. Não houve uma discussão sensata, houve questão ideológica”, disse, atribuindo a maior resistência à volta às aulas aos profissionais de educação. É muito difícil, pois não está tendo conversa com as corporações. Isso me incomoda profundamente, mas a discussão com os professores não avança, não se pensa no papel social.”
“Parece que os laranjas somos nós”, diz professora
Professora de educação infantil na rede municipal e Diretora da Federação dos Sindicatos de Servidores Municipais do Paraná, Adriana Kalckmann critica a fala da secretária que, para ela responsabiliza os professores pela situação de vulnerabilidade a que as crianças estão expostas.
“Em um momento em que as bandeiras oscilam entre o laranja e amarelo, parece que os ‘laranjas’ somos nós. Temos sido colocados como responsáveis pelas crianças que não têm um lugar seguro para estar enquanto a maioria dos pais trabalha, temos sido responsabilizados pelo aumento da violência contra crianças e adolescentes e temos sendo culpabilizados pela demanda insana das aulas remotas”, diz.
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Ela cita que a preocupação da categoria é com a exposição ao vírus de professores e funcionários da escola e afirma que a educação infantil não pode ser tratada como assistencialismo. “É fato que muitas crianças estão perdendo as refeições longe da escola. Mas em algum momento as pessoas vão ter de entender que isto é uma questão de falta de politicas públicas. Desde 2004 a educação infantil deixou de pertencer à secretaria da criança. A educação não é assistencialismo, é direito”, conclui.
Procurada, a Secretaria Municipal de Educação respondeu que não comenta decisões ou posições da Secretaria de Saúde, mas reforçou que as aulas presenciais estão suspensas, pelo menos, até 30 de setembro.