O bairro em que fica um dos principais cartões-postais de Curitiba sofre com a violência. Moradores do Jardim Botânico afirmam que uma simples caminhada pelas ruas da região é motivo de muito medo. Furtos e assaltos são rotina de quem mora e trabalha no entorno do espaço de mesmo nome. Além de celulares e carteiras, os ladrões procuram objetos inusitados como granito das calçadas, hidrômetros, fios de telefone, cabos do sistema de para-raios e até hidrantes. O que chama a atenção é que a área mais perigosa do bairro é justamente o entorno da Avenida Omar Sabbag, endereço do Hospital da Polícia Militar, por onde circula um número significativo de policiais e viaturas.
Um supermercado na Rua Brasílio Itiberê já teve a maioria desses itens roubados. “Semana passada, uma pessoa chegou a subir no nosso telhado em plena luz do dia para furtar os cabos do para-raios”, conta o gerente Paulo Generali, 37 anos. O hidrante para conter um eventual incêndio também foi levado, assim como as mangueiras que seriam usadas pelo Corpo de Bombeiros em caso de uma ocorrência. “Elas ficam guardadas dentro do nosso estacionamento, mas, mesmo assim, foram roubadas. Acredito que seja por causa das pontas de cobre”, lamenta Generali, referindo-se ao metal que tem alto valor no mercado clandestino.
Os funcionários de uma empresa de equipamentos eletrônicos na Avenida Omar Sabbag até se acostumaram a ficar sem internet devido ao roubo dos fios de telefonia. “Só semana passada, foram dois casos. O primeiro na segunda-feira e o outro, na quinta. Mal deu tempo de a empresa religar a fiação, eles levaram tudo de novo”, comentou a empreendedora Carmem Lucia Pires, 40 anos. O maior problema, segundo ela, é que as notas fiscais são emitidas pela internet. “Aí a gente precisa pegar o e-mail do cliente para enviar depois. Mas fica difícil porque isso já virou rotina”, aponta.
De acordo com Carmen, até caminhadas curtas a pé são perigosas no Jardim Botânico. “Moro a apenas uma quadra do meu trabalho e já fui assaltada neste trecho”, lamenta. Na ocasião, o ladrão estava armado e chegou a levar até os óculos de grau dela. “Sem contar que já me roubaram chegando no Jardim Botânico [parque] e fizeram o mesmo com muitas pessoas que conheço. Moro há 23 anos no bairro e nunca foi assim”, reclama.
Para Carmen e outros moradores, o aumento de ocorrências cresceu junto com o número de desocupados espalhados pelas ruas. “A gente encontra muitos mendigos e pedintes aqui. E somos obrigados a sair com moedas. E se você é mulher, é até pior, porque se está dirigindo eles chegam a subir no carro para exigir moeda. É algo realmente absurdo”, enfatiza Carmem.
A moradora Edelena Martinelli, 59, concorda. “Sempre fiz caminhadas da Rua Brasílio Itiberê até o parque, mas não dá mais”. O medo, afirma ela, é em qualquer horário do dia. “Fui assaltada às 8h10 de manhã e, só por segurar forte minha bolsa, o ladrão apontou a arma para mim”, recorda.
Edelana acredita que muitas das ocorrências estão ligadas ao consumo de drogas. “Quando precisam de dinheiro, eles acabam praticando assaltos”, diz.
Com tal quadro de violência, moradores e comerciantes são obrigados a investir do próprio bolso em segurança. Proprietária de uma padaria na Rua Sant’Ana, Matilde Vieira Pinto, 50, decidiu contratar um vigia para afastar os mal-intencionadas e ainda instalou um sistema de monitoramento com acompanhamento 24 horas. “Nosso faturamento é baixo, pagamos um imposto caríssimo e ainda temos que gastar valores absurdos com segurança para tentar manter o que é nosso. Está difícil consertar as coisas neste país”, aponta Matilde.
Falta policiamento
Edelena registrou o Boletim de Ocorrência do assalto e torceu para que localizassem o bandido com seus documentos. “Só que não encontraram nada porque falta policiamento aqui. Se tivessem rondas ostensivas pelo menos de manhã e próximo das 18h, já ajudaria”, pontua.
Esse também é o pedido do representante comercial Luiz Francisco Vicente, 67, morador do bairro. “Se até o hidrômetro do prédio que moro foi roubado, desperdiçando quase 40 mil litros de água que ficaram jorrando na rua, tenho certeza de que alguma coisa está errada aqui”, afirma. Segundo Vicente, um policiamento efetivo na região garantiria mais segurança e auxiliaria os moradores na realização de atividades mais simples do dia a dia. “Temos medo até de ir na padaria”, afirmou. “Sem contar que nunca tem polícia quando a gente chama”, completa.
Vicente ainda ressalta que os moradores são vítimas de um esquema que envolve não só os consumidores de drogas, mas também de quem recepta a revende os produtos de roubados. “A polícia deveria ir para cima também de quem adquire esses produtos roubados. Se não, eles não roubariam”, reforça.
Em nota, a Polícia Militar (PM) informa que as equipes têm atuado no bairro e não deixam de atender as ocorrências. “Sempre que há um flagrante ou acionamento pelo 190, os policiais militares fazem atendimento e aplicam os procedimentos legais”, explica a corporação.
No entanto, a PM admite que está ciente das reclamações dos moradores. Por isso, intensificou o policiamento no bairro “com ações preventivas e repressivas para inibir a criminalidade por meio de patrulhamento com as equipes da Radiopatrulha, da Rondas Ostensivas Tático Móvel (ROTAM) e de outros grupos de policiamento”, completa a nota.
Moradores de rua
A Fundação de Ação Social (FAS), da prefeitura de Curitiba, afirma que diariamente uma equipe passa pelo bairro Jardim Botânico em busca de moradores de rua que precisam de atendimento. No entanto, não pode obrigar ninguém a se deslocar até os abrigos. O Jardim Botânico conta um Centro e Referência Especializado para População de Rua (Centro Pop), na Rua Engenheiro Rebouças, quase em frente ao Estádio Durival Britto.
Mesmo assim, a FAS solicita que a população informe a prefeitura pelo telefone 156 sempre que visualizar alguém em situação de rua. “Lembrando que são atendidas apenas situações de vulnerabilidade social. Casos envolvendo uso de entorpecentes ou outros atos ilícitos devem ser comunicados à Polícia Militar pelo 190”, informa a instituição.
De 1.º de janeiro de 2018 até 5 de março, a FAS registrou 20 pedidos na região por meio do canal de atendimento 156. No mesmo período de 2017, foram recebidas 15 solicitações.