O que leva uma pessoa a morar na rua? As respostas são diferentes e apontam o quanto este problema social tem ganhado cada vez mais complexidade. É uma situação séria, que exige atenção da sociedade e políticas públicas que possam de fato tratar dessa doença social.

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Em Curitiba, a prefeitura já desenvolve trabalhos voltados para esse grupo, como os acolhimentos da Fundação de Ação Social (FAS) e os mutirões de emprego. Entretanto, especialistas e envolvidos no tema acreditam que ainda é necessário investir em mais políticas públicas, que tragam dignidade para quem vive nas ruas.

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Coordenador nacional do Movimento Nacional da População em Situação de Rua do Paraná, Leonildo José Monteiro Filho, considera que a falta de moradia é o principal problema enfrentado hoje em Curitiba. Como solução para a questão, ele acredita que a população em situação de rua poderia pagar um aluguel mais baixo ou ser subsidiada por um programa para ocupar imóveis vazios no Centro da cidade. “Tem gente que está na rua e trabalha, então consegue pagar um pouco. Não precisam ser donos (do imóvel), o importante é morar, é o direito de morar”, afirma.

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“A gente tem uma polícia paliativa, mas a gente sabe que a situação só se vai resolver com moradia. A gente quer que a pessoa tenha uma chave, possa entrar em casa, porque assim ela vai acessar mais facilmente a saúde, a cultura e o emprego”, completa Monteiro.

Além da questão da moradia, o coordenador do movimento cita outras duas pautas principais: censo e geração de renda, ou seja, trabalho para a população em situação de rua.

“Essas são as três pautas principais que estamos lutando no Paraná. Porque se não estiverem nas ruas não vão sofrer violência gratuita. Quando a pessoa entra na casa dela, vai poder cozinhar, tomar um banho, chegar a hora que quiser”.

Sobre a questão da geração de renda, Monteiro sente falta de iniciativas da prefeitura que envolvam a população em situação de rua. “A Prefeitura de Curitiba deveria criar formas de terem renda, como jardinagem, limpeza, (atividades) em cozinha. Por que não contratam a população de rua?”, diz.

Outra preocupação do coordenador é com a documentação das pessoas. Para ele, ter uma Carteira de Identidade é de extrema importância para acessar direitos básicos, como educação, saúde e moradia.

Sugestões tramitam na Câmara

As pautas apontadas por Monteiro também foram levantadas pela Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da População em Situação de Rua (Pop Rua), formada por onze vereadores da Câmara Municipal de Curitiba (CMC).

Em uma reunião realizada em setembro em Curitiba com representantes do Governo Federal, foram definidos sete eixos prioritários de trabalho: realização de censo da população de rua; criação de casa de acolhimento para gestantes; definição de planos de trabalho, com prazo de execução, para a verba federal destinada à campanha Inverno Acolhedor; alimentação em via pública e restaurantes; política de drogas e saúde mental; abordagem, remoção e acolhimento; e moradia.

Coordenadora dos trabalhos da Pop Rua, a vereadora Maria Leticia (PV) reforça a necessidade de consolidar um programa de habitação. “A princípio a gente entendia isso como uma ação municipal, mas é muito mais federal por causa da questão de verba. Então a gente já está buscando verbas no Governo Federal para atender essas demandas na cidade de Curitiba”, declara.

Moradia, trabalho e saúde mental

Sociólogo, doutor em Ciências Sociais e professor dos cursos de Ciências Sociais e da Pós-Graduação em Direitos Humanos e Políticas Públicas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Cezar Bueno de Lima diz que é necessário que o município se preocupe mais com políticas públicas voltadas para pessoas em situação de rua.

“A gente sabe que a cidade sempre contou com um número significativo de pessoas em situação de rua. Mas até quando vamos permanecer negando direitos básicos a essas pessoas, como direito a moradia e ao trabalho. Depois da pandemia aumentou o número de pessoas em situação de rua e o Centro de Curitiba não é diferente”.

Ele cita que projetos de moradia, de preparo para o trabalho e cuidado com a saúde mental. Estas são algumas das opções de políticas que poderiam ser colocadas em prática.

“Até que ponto vamos priorizar mais asfalto e ruas asfaltadas? Quando vamos colocar a pessoa real, de sangue e osso no centro das políticas? A prefeitura antes de querer remover a população de rua, tem que oferecer condições básicas para que ela possa recuperar o direito digno de viver como qualquer outra pessoa”, declara o especialista.

Saúde da população em situação de rua de Curitiba

Além de todas as pautas levantadas, para a vereadora Maria Leticia, um dos motivos que exigem soluções urgentes é o adoecimento da população em situação de rua. “O que a gente sabe dizer pelo atendimento dos grupos sociais que estão organizados é que essas pessoas estão adoecendo. Elas estão mais doentes agora, pode ser porque estão em maior número. É um fator agravante e no meu olhar indica que precisamos desenvolver projetos com urgência”, relata.

Vivendo nas ruas de Curitiba há aproximadamente um ano, Diego, 36 anos, conta que quando fica doente é ajudado pelos próprios companheiros que estão com ele. Ele revela que em algumas situações solicitam o serviço da Fundação de Ação Social (FAS), mas as vezes pela demora preferem ir sozinhos ao posto de saúde.

O companheirismo e ajuda entre os que vivem na mesma situação também é confirmado por Maria, que as vezes passa dias morando nas ruas e as vezes retorna para casa. “Aqui é uma escola, todo dia você aprende uma coisa. Mas a gente é como uma família, um ajuda o outro, um defende o outro”.

Sobre todos os eixos que devem ser trabalhados na capital, Maria Leticia conclui: “Nós estamos começando a estruturar nosso projeto agora na Frente Parlamentar. E eu acho que é isso, trabalhar e trabalhar mais porque não existe outra forma de resolver esse problema. É muito grave”.

Políticas públicas que já existem em Curitiba

A Prefeitura de Curitiba informa que tem uma Rede de Proteção Social que desenvolve ações de forma integrada para atender pessoas em situação de rua, idosos e crianças em vulnerabilidade, famílias de baixa renda e quem perdeu emprego. O trabalho envolve Fundação de Ação Social (FAS) e secretarias municipais de Segurança Alimentar e Nutricional (SMSAN), Saúde, Defesa Social e Meio Ambiente,

“Desde 2019, já foram distribuídas gratuitamente mais de 1 milhão de refeições a quem está em risco social através do programa Mesa Solidária. E mais de 1 mil pessoas são atendidas diariamente em hotéis sociais, Centros POPs e outros espaços de acolhimento da Prefeitura”, diz nota.

Confira algumas das ações voltadas para pessoas em situação de rua que acontecem na cidade:

  • Mesa Solidária: Lançado em 2019, o programa serve refeições gratuitas à população em situação de vulnerabilidade. Existem quatro pontos que realizam a atividade: Escola de Segurança Alimentar Patrícia Casillo (Jardim Botânico), Restaurante Popular da Praça Rui Barbosa (Centro), Mesa Solidária Luz dos Pinhais, atrás da Catedral (Centro) e Escola de Segurança Alimentar Dom Bosco (Campo do Santana). Diariamente são servidas 1.100 refeições gratuitas.
  • Acolhimento: Curitiba conta com cinco hotéis sociais, uma república e 24 unidades de acolhimento (próprias e parceiras), além de três Centros POPs (atendimento durante o dia) que recebem pessoas em situação de risco social. Juntas, as unidades de acolhimento somam 1.561 vagas que contam com dormitórios, banheiros, sala de TV e refeitório. Em algumas há acesso a wi-fi e bibliotecas. Os serviços gratuitos reúnem ações desenvolvidas pela FAS e a Secretaria Municipal de Defesa Social e Trânsito.
  • Banco de Alimentos: A Prefeitura instituiu, em 2020, o Banco de Alimentos de Curitiba que destinou, em três anos, 837 toneladas de alimentos que poderiam terminar no lixo por não terem valor comercial para asilos, casas de apoio a crianças carentes e dependentes químicos e instituições parceiras do Mesa Solidária. O Banco de Alimentos de Curitiba recebe as chamadas “xepas” de feiras, Sacolões da Família, Mercado Municipal e Mercado Regional Cajuru. Além disso, quebras e produtos próximos do fim do prazo de validade nos Armazéns da Família e doações da iniciativa privada também vão para o Banco de Alimentos.
  • Abordagem Social: Durante as abordagens sociais, equipes da FAS orientam sobre os riscos de se permanecer nas ruas. Quem não aceita ser encaminhado para acolhimento em uma das unidades, recebe orientações sobre serviços oferecidos e outros benefícios da Rede de Proteção Social da Prefeitura.
  • CRAS: Os 39 Centros de Referência de Assistência Social (Cras) da FAS são equipamentos de acesso à assistência social do município, oferecendo atendimento de proteção social básica, orientações e inclusão no Cadastro Único, que dá acesso a benefícios para a população em vulnerabilidade social.
  • CREAS: Os dez Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) são equipamentos da FAS que atendem pessoas que se encontram em risco social, sofreram violências e que têm vínculos familiares fragilizados ou já rompidos.
  • Anjos da Guarda: Em 2020, a FAS implantou ainda o programa Anjos da Guarda, para combate ao trabalho infantil e às violências contra crianças e adolescentes. As equipes fazem abordagens sociais que envolveram violação de direitos contra crianças e adolescentes, na região central da cidade.
  • Cadastro Único: Desde 2017, a FAS trabalha para ampliar a inclusão de pessoas em situação de vulnerabilidade social no Cadastro Único (CadÚnico), sistema do governo federal que dá acesso a benefícios sociais. O cadastro pode ser feito nas unidades do Cras, Creas e Centros POP.
  • Em busca de trabalho: Para quem precisa requerer o seguro-desemprego ou está em busca de uma vaga de trabalho, a FAS oferece as unidades do Sistema Nacional de Emprego (SINE) nas Ruas da Cidadania da Prefeitura. A população também pode acessar o Programa Liceu de Ofícios e Inovação que mensalmente oferece cursos gratuitos de desenvolvimento pessoal e qualificação profissional.
  • Consultório na Rua: Projeto da Secretaria Municipal de Saúde que percorre os bairros da cidade levando atendimento de saúde a quem vive em situação de rua. Por mês, o programa atende cerca de 500 pessoas. O serviço é desenvolvido por quatro equipes, compostas por enfermeira, auxiliar de enfermagem, dentista, auxiliar de saúde bucal, médico, psicólogo ou terapeuta ocupacional e assistente social.

Série Invisíveis

A reportagem da Tribuna do Paraná dedicou uma série de reportagens especiais para falar de um tema que tem preocupado todos os curitibanos: o aumento da população de rua na cidade. Confira também as outras reportagens da série:

>> Vícios, fome, abandono: depoimentos de quem mora nas ruas de Curitiba

>> Falta de dados mascara problema urgente em Curitiba; sabe qual é?

>> Cracolândia em Curitiba? Situação de rua expõe riscos e traz medo coletivo

O que??

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