Durante a pandemia da covid-19, em 2021, um grupo no WhatsApp com mulheres negras e mães de Curitiba foi formado. O objetivo era trocar ideias e conselhos sobre as fases das crianças, formando uma rede de apoio entre mulheres que muitas vezes estavam sozinhas.

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“Eu sempre gostei de conversar de assuntos de maternidade, eu participava de alguns grupos no Facebook e via muito julgamento. Isso me incomodava demais. Comecei a participar de um grupo no WhatsApp que era só sobre maternidade e para todas as mulheres, independente da idade, cor. E passei por algumas situações e senti a necessidade de fazer esse recorte. Conversando com algumas amigas, com outras mulheres que são mães e são negras, senti que elas também tinham essa necessidade de estarem mais próximas de outras mães negras”, explica Letícia Costa, idealizadora do Coletivo Mãe Pretas.

Letícia é mãe da Aurora, de 4 anos. Ela conta que começou com um pequeno grupo virtual, criado para ser um ambiente seguro de troca de experiências maternas, acabou ganhando força. Atualmente, 80 mulheres participam do grupo.

Em 2023, elas fizeram o primeiro encontro presencial e, desde então, o grupo abraçou mais ainda o objetivo de apoiar as mães negras. Nesse primeiro encontro aconteceram atividades para crianças e oficinas para capacitar as mulheres.

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Quem também ajuda a organizar o coletivo é a trancista Debora Caroline Pereira, também chamada de Deby. Proprietária de um salão especializado em cabelos afro e formada em Serviço Social, ela vê o grupo como uma oportunidade de capacitar as mulheres negras e valorizar a história delas.

Naomi, de 14 anos, Deby e Jamal, de 6 anos. Foto: Átila Alberti / Tribuna do Paraná.

Deby é mãe solo. Portanto, ela sabe os desafios de conciliar a rotina na criação de Naomi Pereira Moura da Rocha, 14 anos, e Jamal Prince Pereira Laurindo, 6 anos. Ativos no projeto, os dois sempre participam das atividades realizadas pelo Mães Pretas.

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“As meninas chegam aqui, a gente assiste documentário, clipe, informativo, dou um livrinho, tem uma caderneta. Não é só um espaço de beleza. A estética na verdade é a isca, nós estamos para informar e formar. Formar as pessoas de uma maneira mais ampla e organizada. Então nosso Mães Pretas vem pleitear esse espaço para ampliar isso. Queremos um exército de meninas maquiadoras, cabelereiras, trancistas, contadoras de histórias, professoras. Enfim, dá pra pegar tudo isso, fazer um bom trabalho coletivo, abraçar essas mães que precisam de um cuidado. A mãe é todo dia guerreira. Então nós vamos proporcionar os nossos dias de princesas capacitando nós mesmas”.

Coletivo voltado para mães negras vai receber sede em breve

Motivadas, Letícia, Deby e outras mulheres estão criando um espaço fixo do Mães Pretas. Nesse local, as mães poderão levar os filhos para fazerem atividades culturais e também terão a possibilidade de participar de oficinas para aprender atividades no ramo da estética, por exemplo. A expectativa de Deby e Letícia é que o espaço do coletivo abra as portas em breve.

“Um lugar seguro para mim e para a minha filha. Um espaço seguro onde a gente tem liberdade para sermos nós mesmas, um lugar de trocas e acolhimento. É um ambiente seguro pra gente”, diz Letícia.

“Hoje eu me sinto muito mais assistente social e trancista. Consegui manter tudo com o empreender e se eu fiz por mim eu faço pelas outras. Ao longo dos anos todas as pessoas que passaram pelo salão, não só com tranças, outras áreas, a gente conseguiu direcionar. Então agora o principal objetivo está se realizando. Que é a gente ter essa formação, esse atendimento às pessoas que tem vontade de aprender algo, uma profissão, que só querem uma orientação ou que tem uma boa ideia e precisam de caminhos. Que a gente consiga fazer isso para mais. Não só para mim. Quero para outras mães, para outras Deboras”, conclui Deby.

Miss Curitiba estampa beleza e poder do Black Power

Idealizadora do Mães Pretas e mãe da Aurora, Letícia também foi vencedora do Miss Curitiba Universo em 2017. Foi assim que ela conheceu o salão da Deby. Ao aceitar participar do concurso, após receber um convite, ela decidiu que se apresentaria com o cabelo natural.

“No final de 2016 eu passei pela transição capilar, deixei meu cabelo natural pela primeira vez na vida e procurei na internet um salão afro para eu cortar meu cabelo. Ia participar do concurso do Miss Curitiba e queria tirar as pontinhas do cabelo. Era o primeiro corte com meu cabelo completamente natural que eu ia fazer. Foi o primeiro contato com ela”, relembra.

Campeã em 2017, Letícia foi a primeira e única mulher negra a ganhar o título em Curitiba. Depois de vencer a etapa, ela comenta que a coordenação do concurso sugeriu que ela alisasse o cabelo para a etapa estadual. Mas ela recusou e afirma que foi “com meu cabelo natural, do jeito que eu queria”. Em 2024 ela também ganhou o Miss Beleza Paraná, seu primeiro título estadual.

Para Letícia, o Dia da Consciência Negra é um momento de olhar para o que foi conquistado, agradecer as mulheres que vieram antes dela e lutaram pelo espaço e encontrar nelas mais força para continuar.

“É sempre isso para mim, olhar o quanto a gente já caminhou, o quanto as mulheres que vieram antes de mim já caminharam, lutaram para que eu tivesse hoje aqui, nos lugares que estou ocupando, trabalhando como comunicadora, modelo, fazendo tudo o que eu quero fazer. É sempre um dia de reflexão. De olhar para trás e agradecer a luta, reconhecer as que vieram antes e fizeram muito para que hoje eu estivesse aqui com a minha filha, bem e com mais força ainda para seguir lutando”, diz a Miss Curitiba.

O trabalho e atividades do Coletivo Mães Pretas pode ser acompanhado pelo Instagram.