Aprovado na semana passada em primeira discussão, o projeto de lei que estabelece a identificação obrigatória da Câmara Municipal de Curitiba nos veículos oficiais da Casa foi retirado da pauta por 35 sessões, gerando intenso bate-boca entre vereadores na manhã desta segunda-feira (28). O adiamento da proposta, que tem o objetivo de facilitar a fiscalização do uso da frota, atendeu a requerimento da vereadora Julieta Reis (DEM) e ganhou adesão de toda a base do prefeito Rafael Greca (DEM) no Legislativo municipal. Na prática, a decisão deixa a votação final para a próxima legislatura.
Para pedir a retirada do projeto da pauta, Julieta argumentou que sua aprovação implicaria em aumento de custos no atual contrato de locação de veículos feito pela Câmara e, portanto, na necessidade de um aditamento contratual. O próprio texto diz, no entanto, que a identificação será obrigatória “a partir dos contratos de locação firmados após a promulgação desta lei”.
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“O projeto fala que os recursos necessários para os letreiros de identificação dos veículos a serviço dos vereadores serão previstos no contrato de locação. Para que isso seja aprovado, precisamos da manifestação da locadora, porque isso não está previsto no contrato”, disse. “Isso causa um aumento de despesa, com certeza, e há necessidade de um aditamento contratual com a anuência da empresa.”
Autora da iniciativa, Professora Josete (PT) ressaltou que o texto não prevê mudanças no contrato vigente. “Com todo respeito à vereadora Julieta Reis, nós tivemos todos os cuidados para que o projeto fosse apresentado, e que fosse garantido que todas as questões legais fossem cumpridas. Inclusive, a pedido da Comissão de Legislação, apresentamos um substitutivo, que foi acatado; o projeto por todas as comissões, e ele será valido a partir da renovação deste contrato ou da efetivação de um novo. Então não é neste momento que ele será colocado em vigência. Acho que se esse projeto for adiado, é um desgaste desnecessário para esta Casa. O que nós queremos com esse projeto é garantir transparência no uso dos carros.”
Julieta insistiu na tese de que a aprovação demandaria um aditivo contratual. “Não existe dúvida que nós vereadores primamos pela transparência, como também não existe dúvida que ninguém usa recurso público inadequadamente na Câmara Municipal. O projeto fala: ‘os recursos necessários para os letreiros serão previstos no contrato’. Isso não está previsto. Tem que fazer um aditamento contratual, porque não podemos fazer nada sem esse aditamento.”
Professor Euler (PSD) rebateu Julieta. “O projeto de lei da vereadora Professora Josete fala exclusivamente de contratos que serão firmados no futuro. E aí, no futuro, a empresa que quiser firmar contrato nessas condições, firme; as que não quiserem participar da licitação em virtude desse fato, que não participem. Mas é preciso deixar claro que não há motivo para o adiamento, visto que está explícito no projeto que não afeta nada nos contratos atuais, somente para contratos firmados após a promulgação desta lei.”
Apesar disso, dos 35 vereadores presentes, votaram contra o adiamento apenas oito: Cacá Pereira (Patriota), Herivelto Oliveira (Cidadania), Marcos Vieira (PDT), Maria Letícia (PV), Noemia Rocha (MDB), Professor Euler (PSD), Professor Silberto (MDB) e Professora Josete (PT).
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A decisão gerou um bate-boca entre parlamentares da base e da oposição. “Se havia alguma dúvida jurídica, isso você resolve em um dia. Não precisa de 35 sessões para resolver. Não precisa jogar para a outra legislatura”, lamentou Josete. “Me parece que as pessoas que votaram pelo adiamento são contrárias a um projeto que prevê transparência. Porque 35 sessões, me desculpe, vereadora Julieta, me parece uma piada.”
“A vereadora Josete fala como se ela fosse a mãe da moralidade e que nós fossemos imorais. Nós trabalhamos de acordo com a lei, usando bem o recurso público”, defendeu-se Julieta. “Agora, existem dúvidas em relação a esse contrato de locação. Precisa de uma manifestação da locadora, precisa de discussão e, no caso específico, de aditamento do contrato”, insistiu. “Não é que a gente é contra. Somos favoráveis, mas não exatamente neste momento.”
Outros vereadores criticaram a decisão de adiar a votação. “É importante que todos os 38 vereadores leitam os projetos, porque nesse projeto apresentado pela Professora Josete estava muito claro que a mudança em relação à frota iria acontecer no próximo contrato”, disse Maria Letícia (PV). “Perdemos a oportunidade de dar mais transparência”, afirmou Professor Silberto (MDB).
Do outro lado, parlamentares da base passaram a defender a decisão. “Eu sempre fui a favor de ser identificado [o carro], mas é o seguinte: eu acredito que não é este o momento. Por exemplo, por que não foi apresentado o projeto no ano passado ou no ano anterior? Antes das vésperas das eleições? Vamos aprovar sim, mas vamos aprovar no ano que vem”, disse Toninho da Farmácia (DEM).
O projeto em questão foi apresentado por Josete em dezembro de 2019 e recebeu um substitutivo geral em março de 2020 atendendo a recomendações da procuradoria jurídica da Casa.
Colpani (PSB), 1º secretário da Câmara, mostrou-se ofendido com as críticas em relação à falta de transparência da Casa. “A piada é dizer que nós vereadores, que as Mesas Executivas que passaram pela Câmara, não têm transparência. Quero lembrar a professora Josete que no ano passado, as contas da Câmara foram aprovadas sem nenhuma ressalva. E falar em falta de transparência, vindo do PT, com todo o respeito, é sim, Toninho da Farmácia, um projeto eleitoreiro.”
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Quem também se mostrou irritado foi o líder do prefeito no Legislativo, Pier Petruzziello (PTB). “Quero dizer que esse debate é pequeno, o projeto é medíocre, o momento é errado, e fico imaginando as pessoas lá fora vendo a gente debater um projeto como esse”, criticou. “Que importância, meu Deus do céu, que coisa espetacular, vai mudar a vida da sociedade!”, ironizou. “Esse projeto é ridículo. Esse projeto é medíocre. Vamos falar de coisas importâncias para a cidade, pelo amor de Deus! Que projeto ridículo em um momento ridículo. Vamos criar vergonha. E ainda vem gente se manifestando da importância, da transparência. Que que é isso?”
Dalton Borba (PDT), que é advogado e professor de direito constitucional, deu um parecer jurídico sobre a questão. “Sem entrar no mérito se o projeto fala sobre transparência ou não, se o projeto é ridículo ou não, se foi apresentado na hora certa ou não – até porque acho que, se o mandato de um vereador é de quatro anos, ele tem quatro anos para apresentar um projeto quando ele bem entender”, introduziu. “Esse projeto deixou muito claro que contratos em execução não serão mexidos. Então esses atos estão acobertados pelo ato jurídico perfeito. Que não só está protegido pela Lei de Introdução às Normas do Direto Brasileiro, como também lá no artigo 5º da Constituição, no inciso XXXV”.
“Se a maioria dos vereadores votou a favor do adiamento, que fique claro que essa votação não teve respaldo jurídico; foi decisão eminentemente política para afastar esse projeto”, disse Borba. “Não vejo isso como um projeto ridículo, não vejo que perdemos tempo discutindo, porque na semana passada, todos aqui se lembram bem, levamos muito mais tempo discutindo um projeto que dava nome de um logradouro público. Aí sim eu considero uma discussão bastante dispensável.”
A discussão prosseguiu. “Qual é o problema de um projeto ser votado às vésperas das eleições? Se a gente achar que tem algum problema, vamos ficar os próximos 45 dias sem trabalhar?”, questionou Euler. “Essa proposta de adiar por 35 é pedir o arquivamento, e acho que não tem nada demais um projeto que só mostra que a gente identifique os carros, que a população possa ver, acompanhar, já que é um carro que ela mesma paga pela locação”, disse Marcos Vieira (PDT).
“E eu posso ter N divergências, mas eu nunca chamei projeto de nenhum vereador de medíocre. Sempre tive o respeito em relação a isso”, defendeu-se Josete. “Lamento a leitura da base. É muito frágil, é muito pequena. Era melhor não fazer uma defesa. Começando pela vereadora Julieta Reis: com todo o respeito, vereadora, mas foi para massacrar um projeto de uma excelente vereadora no parlamento”, argumentou Noemia Rocha (MDB).
Bruno Pessuti (Podemos) pediu a palavra para destacar que o adiamento não implicará necessariamente no arquivamento do projeto com o fim da legislatura. “A gente tem a certeza de que a vereadora Professora Josete poderá ser reconduzida a um novo mandato. E aqueles vereadores que forem reconduzidos a um novo mandato, seus projetos não serão arquivados”, disse. “Se é para o próximo contrato, por que não adiar?”