“O Hospital Evangélico, que já cuidou da saúde de tantos paranaenses, hoje é uma instituição doente que precisa da mobilização da sociedade na busca da possível cura de sua situação financeira e administrativa”. A afirmação da desembargadora Marlene T. Fuverki Suguimatsu traduziu o propósito da audiência pública realizada nesta terça-feira, 13 de dezembro, na sede do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, em Curitiba.
Foram convidadas mais de 80 instituições ligadas direta ou indiretamente ao Hospital e à Faculdade Evangélica, incluindo representantes da União, Ministério Público, Governo do Estado, Prefeitura de Curitiba, Conselho Regional de Medicina, igrejas mantenedoras, sindicatos e associações de profissionais e acadêmicos, entre outras entidades e pessoas físicas que se apresentaram voluntariamente. Mais de 50 pessoas falaram ao microfone, expressando suas ideias, críticas e sugestões em cinco minutos de exposição para cada participante.
“Todas as contribuições aqui apresentadas serão encaminhadas para o processo de intervenção judicial”, afirmou a desembargadora Marlene T. Fuverki Suguimatsu, ao explicar que a audiência foi motivada “pela necessidade de esclarecer a comunidade da real finalidade da intervenção da Justiça do Trabalho, decretada a pedido do Ministério Público do Trabalho após reiterados descumprimentos de obrigações trabalhistas por parte da Sociedade Evangélica Beneficente, mantenedora do Hospital e da Faculdade”. A Justiça do Trabalho, no entanto, ressaltou a magistrada, não busca resolver apenas a questão trabalhista, mas tenta encontrar solução para a própria continuidade do Hospital e da Faculdade, que têm papel fundamental na garantia do direito à saúde dos paranaenses.
O interventor do Hospital, Carlos Alberto Motta, disse que a situação financeira da instituição é de insolvência, com R$ 350 milhões em dívidas. O quadro se agravou com o retorno dos pagamentos aos bancos credores, que retêm todo mês, na fonte, 23% dos repasses do Sistema Único de Saúde. A cobrança dessas dívidas, suspensa pelos últimos 12 meses, levou o hospital a cancelar atendimentos emergenciais e consultas. “O Hospital chegou a esta situação por má gestão e também devido ao subfinanciamento do sistema público e filantrópico de saúde. São necessários aportes adicionais de R$ 3 milhões por mês para que o Evangélico possa funcionar próximo de sua capacidade”, disse o interventor. Dos mais de 400 leitos do Hospital, somente 150 estão ocupados atualmente.
A interventora da Faculdade Evangélica do Paraná, Carmen Austrália Paredes M. Ribas, relatou que a instituição ainda tem dívidas significativas (R$ 7 milhões somente em aluguel atrasado do edifício-sede), mas conseguiu equilibrar as contas, colocar os salários em dia e formar parcerias para equipar salas de aula e laboratórios.
Médicos, estudantes de Medicina e funcionários, tanto do Hospital como da Faculdade, apontaram que a intervenção decretada pela 9ª Vara do Trabalho de Curitiba evitou o fechamento do Hospital e da Faculdade. Para o médico cardiologista Luiz Fernando Kubrusly, “a intervenção foi como uma operação em que 50% dos problemas foram resolvidos, mas os outros 50% serão resolvidos no pós-operatório, o que pode levar mais tempo do que se imagina”.
Representantes da Sociedade Evangélica Beneficente fizeram “mea culpa” pelos anos anteriores à intervenção, admitindo que houve gestão pouco eficiente na utilização dos recursos. No entanto, afirmaram que a SEB criou um novo estatuto que prevê composição tripartite do Conselho Diretor, cabendo às igrejas apenas um terço dos assentos, com o restante sendo preenchido por técnicos e representantes da sociedade.
Alvaro Quintas, diretor-geral da Área de Saúde do Grupo Marista (controlador dos Hospitais Cajuru, Marcelino Champagnat e Santa Casa de Misericórdia de Curitiba), apontou que 80% a 90% dos atendimentos realizados pelo Sistema Único de Saúde são feitos em um dos cinco grandes hospitais filantrópicos – Pequeno Príncipe, Erasto Gaertner, Cajuru, Santa Casa e Evangélico. A dívida dos hospitais filantrópicos no Brasil atinge a marca de R$ 21 bilhões. “Fecha-se um hospital por semana neste país, em média. Então, este modelo de financiamento tem que acabar. Nos últimos cinco, os custos avançam 72% e as receitas somente 6%”, afirmou.
Após agradecer aos participantes da audiência, a desembargadora Marlene T. Fuverki Suguimatsu lamentou a ausência de representantes do Município de Curitiba, do Governo do Estado e dos bancos credores particulares – três atores importantes na busca de uma solução para a continuidade do Hospital. A Caixa Econômica Federal foi a única instituição bancária representada. O juiz responsável pelo processo de intervenção, Eduardo Milléo Baracat, afirmou que a situação da Faculdade Evangélica tende a se resolver de forma mais célere, enquanto a solução para o Hospital deve ocorrer a longo prazo.
Intervenção
O Hospital Evangélico de Curitiba é o maior hospital filantrópico do Paraná. Tanto o Hospital como a Faculdade Evangélica são ligados à Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba. A intervenção da Justiça do Trabalho no Hospital e na Faculdade, a pedido do Ministério Público, ocorreu no final de 2014, em meio a uma grave crise administrativa e financeira – evidenciada pelo atraso de salários, não recolhimento de impostos e obrigações trabalhistas, além da inadimplência com dezenas de fornecedores. O balanço anual do Hospital, divulgado no primeiro semestre, apontou dívidas de R$ 346 milhões.