Seca braba

Falta de água, saúde, queimadas: o impacto da forte estiagem em Curitiba e região

Represa do Passaúna com volume de água bem abaixo do normal. Foto: Lineu Filho / Tribuna do Paraná

Há vários dias os curitibanos têm se deparado com dias lindos, de céu azul, poucas nuvens, sol sempre presente. Apesar do cenário muito bonito para uma cidade conhecida por ser quase sempre cinza, a situação é preocupante. Há meses sem chuvas significativas, não só a região de Curitiba mas todo o Paraná passa por um dos períodos de estiagem mais severos das últimas décadas. A falta da chuva reflete no abastecimento da água, nas queimadas ambientais e até mesmo na nossa saúde.

Para explicar a real situação e o que nos espera para os próximos meses, a Tribuna conversou com especialistas. E apesar de as represas ainda terem reserva para os próximos quatro meses, o apelo é único: economize, economize, economize, pois se não houver consumo consciente, pode faltar água pra valer. Entenda toda a situação a seguir.

Quando a chuva pode voltar?

Uma das maiores estiagens das últimas décadas no Paraná pode demorar a passar. A seca, que foi se agravando a partir de março, estava fora das projeções feita para o período do ano pelo Instituto Tecnológico Simepar. “Nenhum modelo previu essa seca, Havia uma tendência de chuva abaixo da média, mas não uma situação como essa”, revela o meteorologista Lizandro Jacóbsen, do Simepar. 

LEIA MAIS – Não desperdice água! Com estiagem, pode faltar durante a pandemia

Segundo o especialista, a meteorologia só consegue prever com mais precisão os próximos 15 dias. Por esse motivo, não há como saber quanto tempo a estiagem deve durar. “O ideal agora seria a chegada de uma frente fria estacionária, para que chovesse direto cinco dias e recuperar os reservatórios, Mas é muito difícil isso acontecer”, explica o meteorologista. Como o outono e inverno são estações mais secas, a tendência é que a estiagem continue nos próximos meses.

Numa situação normal, as chuvas significativas devem acontecer somente com a chegada da primavera, ou seja, de setembro em diante. Seria preciso ao menos 200 mm de precipitação para aliviar a situação da seca nos reservatórios de Curitiba e região. É claro que uma quantidade assim de chuva não deve acontecer num único dia, mas numa média de 30 mm diários – ou seja, aproximadamente seis ou sete dias de chuvarada.

“Teremos que torcer por uma excepcionalidade, mas isso a gente não consegue prever. Se tivesse um El Niño ou La Niña atuando, poderia até arriscar”, salienta Jacobsen. Os dois fenômenos atmosféricos alteram o clima regional, mudando os padrões de vento e, em consequência, os regimes de chuva em regiões tropicais.

Qual a situação real dos reservatórios?

A situação da estiagem não vem de agora. De acordo com o gerente de processos de água da Sanepar, Celso Thomaz, chove abaixo da média desde meados de outubro de 2019. “O último verão, que é uma estação com chuvas mais regulares, choveu abaixo do normal. E nos últimos meses o volume de chuva foi abaixo do histórico, o que deixa a situação preocupante”, explica Thomaz. Por causa da falta de chuvas, aproximadamente 80 localidades do estado já sofrem com queda na produção pela falta d’água.

A situação é complicada no Paraná todo. Para tentar aliviar a situação, a Sanepar vem criando novas perfurações em poços no interior. Já no caso de Curitiba e região metropolitana, quatro barragens que servem para reservar a água das chuvas ajudam a garantir o abastecimento na estiagem. “Duas delas já estão em situação de alerta, o que é bastante assustador. Como é o caso da barragem do Passaúna e do Iraí, entre Pinhais e Piraquara”, avalia o gerente da Sanepar. 

Como alívio, a garantia de água para os próximos quatro a cinco meses vem de outros dois reservatórios em Piraquara. “Esses estão com bastante volume de água, o que ainda garante o consumo de Curitiba e região, isso com uso consciente”, alerta Thomaz. Embora as barragens possam resolver a situação de forma emergencial, o período é de uso controlado para evitar racionamentos drásticos.

Sistema de rodízio pode ajudar?

Para frear o um pouco o consumo, um sistema de rodízio de corte de água foi implantado no dia 17 de março e afeta principalmente a região sul de Curitiba e também os municípios de Fazenda Rio Grande, Pinhais, Araucária e São José dos Pinhais. 

As regiões que participam do rodízio não foram escolhidas ao acaso. O sistema integrado de abastecimento da Sanepar utiliza água das barragens, que continuam mantendo a regularidade na distribuição. A maior parte da população de Curitiba e região está conectada hidraulicamente a esse sistema integrado e, portanto não entra no rodízio. Mas existem regiões abastecidas diretamente pelo Rio Miringuava, que está com baixas reservas de água, e são essas as regiões mais afetadas com a estiagem.

VIU ESSA? – Motoboys relatam medo do coronavírus enquanto mantêm viva a economia de Curitiba

“Olhando para o futuro, se continuar nessa estiagem vamos ter que apertar o sistema de rodízio”, alerta o gerente Celso Thomaz. O rodízio mais apertado, segundo o gerente da Sanepar, pode garantir com que a água dos reservatórios acabe antes do tempo.

Nesse racionamento todo, instituições de saúde não serão afetadas. “A Sanepar tem cadastrado todas as instituições de saúde. E caso seja necessário, caminhões pipas próprios podem atender os hospitais para que eles não sejam desabastecidos”, salienta.

Existe risco do sistema entrar em colapso?

Quando se fala em colapso é porque a empresa de abastecimento não tem mais domínio da situação. “Não esperamos chegar nessa situação e não contamos com o pior. Nesse momento, estamos em alerta amarelo, que não é brincadeira”, comenta o especialista da Sanepar. Para Thomaz, a situação limite seria a implantação de um rodízio mais severo. “Seria o caso de uso da água só para higiene pessoal e sanitários”, alerta.

Para evitar qualquer possibilidade de falta de água, a orientação da Sanepar é para o racionamento e uso consciente. “A importância da conscientização não é só um pedido simples para não desperdiçar, o que já é normal. Estamos falando de racionalizar seu consumo. Desde um banho mais rápido, a torneira fechada para escovar os dentes e fazer a barba, todas essas pequenas economias significam bastante se você pensar em toda a população”, salienta. Para o especialista, andar de carro sujo esses dias é demonstração de cidadania. 

Qual o impacto do coronavírus na crise de água?

O momento atual é de estiagem, mas de pandemia do coronavírus também. Para evitar a disseminação do coronavírus, medidas de profilaxia como higienizar bem as mãos com água e sabão e também constantes limpezas domésticas podem ter impactado no consumo de água no Paraná.

Mas, por enquanto, a resposta ainda é uma incógnita. “Ainda não conseguimos medir se houve aumento significativo. Em março, quando as medidas de isolamento social iniciaram, não houve diferenças em relação ao ano anterior”, explica Thomaz. Informações do mês de abril só devem sair na primeira quinzena de maio. 

VEJA TAMBÉM – Máscaras são vistas jogadas nas ruas de Curitiba: como fazer o descarte correto

Existe também a possibilidade de diminuição no consumo, há que houve fechamento parcial de setores da indústria e comércio. “Pode ser que no geral haja uma redução no consumo, com aumento no consumo residencial e diminuição das áreas industriais e comerciais”, aponta.

A falta de chuva tem relação com queimadas florestais?

A falta de chuva colabora para as queimadas, já que a vegetação fica mais seca. O período do outono e inverno normalmente registram mais incêndios florestais justamente por serem em meses mais secos. Com a estiagem mais forte esse ano, a situação preocupa ainda mais.

Sábado (25), o Corpo de Bombeiros teve trabalho para controlar um incêndio justamente na Represa do Iraí, em Quatro Barras, que abastece 30% de Curitiba e região e que está 60% abaixo do volume normal. Em março, a corporação registrou 1.590 incêndios florestais, praticamente o triplo do mesmo mês de 2019. As cidades que mais tiveram queimadas em março foram Londrina (99 ocorrências), Curitiba (87) e Ponta Grossa (80). Em caso de queimadas, os Bombeiros podem ser acionados pelo número 193.

O tempo seco pode agravar crises alérgicas respiratórias?

Com a chegada do outono, dois fatores intensificam as crises de alergia respiratória: tempo seco e amplitude térmica. A falta de chuvas deixa a atmosfera mais seca, levando muita gente a coçar mais o nariz e espirrar com mais frequência, o que pode até aumentar a possibilidade de contaminação de coronavírus.

“As vias aéreas ficam mais ressecadas, com mais crosta e também mais secreção. Com isso, o nariz tem mais dificuldade de filtrar a sujeira e o pó”, explica o médico otorrinolaringologista Rogério Hamershimdt, do Hospital de Clínicas de Curitiba.

Para amenizar a situação, a melhor recomendação é a caseira: lavar o nariz com soro fisiológico duas vezes ao dia. “O soro pode descer na garganta, não tem problema nenhum. Também é importante tomar bastante água, deixar a casa bem aberta, bem varrida”, orienta o médico. O uso de umidificador de ambiente também pode ajudar, desde que a água esteja bem limpa. “Vai ajudar a hidratar as vias aéreas”, explica.

Os sintomas de alergia muitas vezes se confundem com resfriado e até com coronavírus. Por esse motivo, é preciso estar atento. Quadros leves de rinite e resfriados podem ser tratados com anti térmico e antialérgico em casa. Em caso de falta de ar, a indicação é procurar atendimento em uma unidade de saúde.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna