Transporte

Exigir placa da cidade para Uber e aplicativos similares é ilegal, dizem especialistas

Foto: Arquivo

Regra que deve encarecer o preço do Uber em 20% e aumentar o tempo de espera em 30%, a exigência do prefeito Rafael Greca (PMN) de que os veículos do aplicativo sejam emplacados em Curitiba é ilegal − o mesmo também está previsto, por exemplo, em São Paulo e em discussão em Porto Alegre. Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, a medida não tem previsão na legislação, caracteriza uma forma indireta de arrecadação via IPVA e fere o princípio da livre concorrência. Os advogados ainda apontam uma série de outros pontos questionáveis no decreto em vigor há cerca de um mês na capital paranaense.

Segundo o texto que regulamentou o serviço de transporte individual de passageiros por meio de aplicativos em Curitiba, como Uber e Cabify, veículos emplacados fora da capital estão proibidos de prestar o serviço na cidade. No entanto, para o advogado Bernardo Strobel Guimarães, doutor em Direito do Estado, a exigência não está prevista na legislação e jamais poderia ter sido feita por meio de decreto. “O único ente que poderia entrar nessa seara seria o Legislativo federal”, afirma.

Mais problemas em relação ao emplacamento são apontados pelos advogados Luciano Elias Reis, presidente da Comissão de Gestão Pública da OAB do Paraná, e Emerson Gabardo, professor de Direito Administrativo da UFPR. Ambos avaliam que a medida tem fins exclusivamente de arrecadação, na medida em que metade do IPVA recolhido de cada veículo vai para os cofres do município onde ele foi emplacado − esse objetivo foi admitido pelo próprio secretário de Finanças da capital, Vitor Puppi. Logo, o decreto de Greca envolveria a chamada forma indireta ou oblíqua de arrecadação.

Da mesma forma, eles entendem que a exigência da placa de Curitiba vai contra a livre concorrência de mercado. “Em um ambiente urbano cada vez mais conturbado − principalmente em regiões metropolitanas −, tal limitação é um abuso”, argumenta Gabardo. “Na prática, também é interessante especular como vão se comportar as empresas locadoras de veículos, que poderão ser prejudicadas com a exigência.”

Lei e não decreto

Para os especialistas, o Decreto 1.302/17 ainda tem pelo menos dois problemas graves. O primeiro deles diz respeito ao “preço público” que deverá ser pago à prefeitura de Curitiba pela “exploração intensiva do viário urbano”, de acordo com a distância percorrida em cada viagem. Segundo os três advogados, a cobrança só poderia ter sido criada por meio de lei, que, portanto, deveria passar pela Câmara de Vereadores.

“Os decretos se prestam à fiel execução de lei. Mas a alegação de que este decreto teria fundamento na Lei Federal 12.587/12 [de Política Nacional de Mobilidade Urbana] não faz sentido, pois, na realidade, a competência tem que ser exercida por lei municipal, e depois por decreto. O Decreto 1.312/17, todavia, é um regulamento autônomo e, na minha visão, ilegal”, avalia Gabardo.

Guimarães aponta ainda que o “preço público” está associado à fiscalização exercida pelo município sobre a prestação do serviço, como o pagamento que é feito na emissão de um alvará por exemplo. Portanto, não haveria como fazer a cobrança por quilômetro rodado. “Se o Uber vai rodar 1 quilômetro ou 150 quilômetros, a fiscalização é a mesma. No fundo, a prefeitura quer captar uma parte da riqueza gerada por esse tipo de serviço. Mas o município não pode criar o imposto que quiser, tem de haver uma previsibilidade na Constituição.”

Violação da privacidade

Por fim, os especialistas criticam a necessidade de que o poder público tenha acesso às informações de data e horário do início e do fim do trajeto; tempo total e distância da viagem; e valor pago e discriminação do cálculo.

“Isso não ferirá o direito constitucional da privacidade, da intimidade, da liberdade de ir e vir e da imagem das pessoas? Será que o vazamento de uma informação de viagem não pode desencadear em problemas pessoais ou profissionais a alguém? Será que não é possível que essa informação vaze? Será que isso não pode, inclusive, gerar problemas futuros de segurança dos usuários?”, questiona Reis.

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