As lágrimas nas redes sociais da chef Gabriela Carvalho, proprietária do Quintana Gastronomia, ecoam o lamento dos empresários do setor de alimentação fora do lar de Curitiba, afetados pelo novo decreto de quarentena que fecha lanchonetes e restaurantes da cidade pelos próximos 14 dias.
Pegos de surpresa com o decreto, os empreendedores afirmam que o movimento nos estabelecimentos já havia despencado de 70% a 80% nas primeiras semanas de distanciamento social há 100 dias, o que fez com que muitos fechassem as portas voluntariamente.
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Mais recentemente, a flexibilização fez o movimento começar a voltar gradativamente, em torno de 30%. No entanto, o novo fechamento deixou sem saída quem já tinha comprado insumos e recontratado os funcionários colocados nas medidas de proteção ao emprego do governo federal.
“Agora vem o decreto de fechamento que eu sou a favor, mas se ele realmente zelasse pela segurança e que tudo que pudesse ter sido feito tivesse sido feito. Foi colocado um fechamento das empresas sem nenhum apoio do governo. É frustrante demais”, desabafou Gabriela Carvalho no vídeo que alcançou mais de 35 mil visualizações nas redes sociais.
A falta de apoio apontada pela chef é engrossada por Nelson Goulart Junior, proprietário do Restaurante Ibérico e presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes do Paraná (Abrasel-PR). Para ele, faltou uma palavra de apoio do governador e do prefeito nessa imposição da quarentena.
“Nem no sentido de consideração, do tipo ‘olha, nós entendemos que isso vai causar mais dificuldades’, algo que mostre alguma empatia conosco. Não houve redução ou retardamento de pagamento de impostos, não recebemos nada, apenas que devemos fechar”, diz.
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A dificuldade para manter os estabelecimentos fechados é tamanha que o empresário Délio Canabrava resolveu “doar” o Bar CanaBenta, aberto há 14 anos na cidade. “Como não sabemos os efeitos desta medida do governo, decidimos passar para frente”, disse.
Pesadelo
É com essa palavra que a chef e empresária Yasmin Zippin Nasser, do restaurante árabe Nayme, se sente tendo que fechar. No começo da pandemia, em março, ela manteve o atendimento apenas na parte externa do estabelecimento e no delivery, com poucos clientes.
A queda no movimento foi de 80%, às vezes servindo apenas uma mesa no almoço e uma no jantar. No final de maio e começo de junho, ela diz que houve uma melhora no movimento, mas nada próximo de manter a estrutura de 32 colaboradores (parte acabou colocada nas medidas de proteção ao emprego do governo federal).
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Agora com a quarentena de 14 dias, Yasmin afirma que é desesperador. Para ela, os empresários estão vivendo um pesadelo. “A suspensão dos contratos de trabalho acabou, tenho oito garçons e não sei o que fazer com eles. Aí veio o governo com essa medida e nos causa uma perplexidade, porque eles tiveram 100 dias para fazer estoque de medicamentos, hospital de campanha, mas não fizeram nada. É uma piada o que estão fazendo com a gente”, afirma.
Ela conta que além de não conseguir pagar as contas e não ter nenhum auxílio financeiro dos vários programas de crédito anunciados pelo governo, ainda precisou contratar carros-pipa para abastecer de água o restaurante. A Sanepar precisou implantar um rodízio de abastecimento em Curitiba por causa da severa estiagem que se arrasta há mais de dois meses.
Para a empresária Janaína Santos, do Cosmos Gastrobar (fechado desde março), agora é hora de mostrar à comunidade que o setor foi o mais atingido pela pandemia e que não houve apoio para manter as operações.
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“Estou devendo R$ 120 mil no banco e sem qualquer perspectiva de pagar. O público não entende o que estamos passando, não entende que não tivemos apoio, que para muitos abrir é a última medida desesperada antes de falir”, afirma.
Ela é uma das coordenadoras do movimento Fechados pela Vida, que já pedia o fechamento por decreto do comércio desde o começo da pandemia, mas com a ajuda necessária para manter os compromissos em dia.
Janaína afirma que é preciso um planejamento para fechar e para abrir, e que faltou tanto para conter o vírus como para as empresas sobreviverem durante a pandemia. Para ela, a única medida que chegou foi a de suspensão dos salários por dois meses.
Descaso
Dono de duas operações e vindo de uma família tradicional do ramo, o empresário Beto Madalosso considera que a forma com que a quarentena foi decretada no Paraná não teve sem nenhuma sensibilidade pelo cenário dos empresários que já era difícil. Com a restrição mais severa, as próximas semanas poderão ser fatais para muitos empreendimentos.
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“É como se eu mandasse meus funcionários ficarem em casa e não falasse absolutamente nada sobre pagamento. Vocês ficam em casa agora, não podem mais trabalhar, e não fala nada se vão receber um dia ou não. É o que o governo fez, um descaso”, diz.
O empresário afirma que tinha retomado de 15% a 20% do faturamento normal no recém-inaugurado Carlo (antiga Forneria Copacabana) e 40% no Madá, readequando processos internos para minimizar prejuízos. Ele diz que a partir de julho começaria a zerar as contas, mas que agora não tem mais muito o que fazer.
“As contas feitas lá em março vão vencendo agora. Não tem como, muita gente vai quebrar”, afirma.
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