O Brasil está em luto. A tragédia que o Rio Grande do Sul está vivendo nos últimos dias, com os temporais que inundaram centenas de cidades, comoveu o país e o mundo. Várias ações tentam minimizar os impactos de uma região que chora pelas pessoas mortas e desaparecidas. Os paranaenses já sofreram com perdas e prejuízos, mas nada comparado ao irmãos gaúchos. E Curitiba, estaria preparada para uma chuva tão intensa?
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A resposta é não. Várias diferenças existem entre as capitais, mas precipitações acima de 300 milímetros como registradas em quatro dias em Porto Alegre – o que corresponde a dois meses de chuva – deixariam qualquer cidade com sérios problemas. Mas é preciso entender vários aspectos que envolvem a questão, inclusive de geografia e geologia, que podem prever os possíveis abalos sísmicos que acontecerão na Terra, mudanças climáticas, conhecimentos empregados na construção civil (represas, túneis e estradas) e tantas outras funcionalidades essenciais para o dia a dia, para responder essa pergunta.
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“Risco em Curitiba é maior, a cidade é considerada uma ilha”
O especialista Abdel Hach, com vasta experiência nacional e internacional em geologia e geotecnia (especialização no campo da Engenharia Civil que trata das propriedades dos solos), afirmou que Curitiba tem um risco altíssimo de inundação, maior que Porto Alegre, mesmo com a diferença de altitude: Curitiba tem 935 metros e Porto Alegre está a 10 metros acima do nível do mar.
“O risco em Curitiba é maior, pois a cidade é considerada uma ilha. Se tirar concreto e asfalto, a capital paranaense é cercada por rios. Precisamos de inovação nas drenagens urbanas, é só verificar quando chove acima de 70 milímetros, a região central com o Rio Ivo inunda. Os canais e galerias de outras partes da cidade não resistem com chuvas intensas”, disse Adbel.
Outra opinião é do Felipe Maia Ehmke, diretor de Mudanças Climáticas da Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Curitiba. Segundo ele, não se pode descartar que um dia, a capital paranaense venha a sofrer danos com uma grande chuva.
“Curitiba e outras cidades estão expostas aos efeitos das mudanças climáticas. A quantidade de chuvas que gerou esse transtorno foi muito grande, mas deve considerar uma outra condição geográfica, um outro contexto urbano. Já tivemos chuvas históricas, e a forma de desenvolvimento urbano e ambiental favoreceram que os impactos não fossem tão intensos”, comentou Felipe.
Parques são como esponjas
Em 2023, Curitiba teve o mês de outubro como o mais chuvoso depois de 26 anos. Durante 31 dias, a cidade registrou 559,8 mm, número que surpreende porque a média de chuvas em Curitiba para este mês é de 144 mm, segundo o Simepar. Em um dia de outubro, a precipitação acumulada foi 119,4 mm na Estação Meteorológica da Defesa Civil. Na ocasião, o Parque Barigui e Parque Tingui, ficaram alagados, e famílias de bairros como Caximba tiveram que ser resgatadas, árvores caíram e casas tiveram risco de queda em outros pontos da capital.
Na tentativa de evitar problemas com a chuva, a prefeitura de Curitiba criou a partir de 2003, os parques lineares ao lado de rios. Os parques lineares da capital são o Cajuru (bairro Cajuru), Mairi (na divisa da CIC e Fazendinha), Mané Garrincha (CIC) e Yberê (Campo de Santana).
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Essas áreas verdes ajudam a preservar as faixas de drenagem de rios e a prevenir enchentes. Além disso, os lagos dos parques São Lourenço, Bacacheri, Tingui e Atuba possuem a mesma função. Os dois principais rios da cidade, o Barigui e o Belém, passam dentro dos parques Tingui, Barigui (Rio Barigui) e São Lourenço (Rio Belém) e o Rio Atuba no parque de mesmo nome.
“É uma forma de esponja, que segura e retém grande parte da chuva. Hoje trabalhamos ao máximo para que utilize soluções baseadas na natureza e com intervenções eficientes na redução nos impactos das mudanças climáticas e efeitos nas inundações. As obras de macrodrenagem são necessárias, e faz parte dos projetos de Curitiba”, reforça o diretor da Secretaria Municipal do Meio Ambiente.
Mudanças climáticas e políticas públicas
Para o geólogo, essa estratégia curitibana é positiva, mas é preciso fazer mais pelo solo. “Os parques reduzem os impactos, mas o solo tem uma limitação de saturação. Eu sugiro que se repense a política urbana das cidades. É preciso ter mais seriedade com a questão da mudança climática, a natureza está indicando isso. As pessoas insistem no concreto, asfalto e piscinões, temos que fazer mudanças urgentes, mapear às áreas, limites de precipitação e utilizar uma drenagem sustentável. Hoje estamos tranquilos, é o momento ideal para rever o Plano Diretor e colocar os estudos geológicos como prioridade”, diz Abdel Hach.
Nesta quarta-feira (8), ocorre a 8ª reunião ordinária do fórum Curitiba sobre Mudanças Climáticas. Devido aos acontecimentos no Rio Grande do Sul, o assunto ganhou força e preocupação na sociedade de maneira geral. “Já estamos discutindo mudanças climáticas desde 2009 em Curitiba. O próprio fórum se reestruturou ao longo do tempo, estamos fazendo mais reuniões e adicionando mais membros. As ações e discussões são mais qualificativas, participativas e colaborativas no enfrentamento de ações”, completou o diretor de Mudanças Climáticas da Secretaria Municipal do Meio Ambiente.