A pandemia de covid-19 resultou em uma triste realidade para quem trabalha servindo aos outros. Os garçons de Curitiba deixaram a bandeja de lado e estão com medo. Possíveis demissões ou até mesmo mesmo a longa permanência em casa geram um sentimento de impotência ao profissional que carregava, com firmeza, o pedido do cliente para a mesa.
Durante duas semanas, entre final de maio e começo de junho, Curitiba voltou a restringir o acesso de clientes a restaurantes e lanchonetes durante a bandeira vermelha. Ao longo deste período restaurantes e lanchonetes puderam funcionar das 10 às 22 horas, em todos os dias da semana, apenas no atendimento nas modalidades delivery, drive thru e a retirada em balcão (take away), vedado o consumo no local.
O trabalho que antes de extrema importância, um contato direto entre o estabelecimento e seus clientes, acabou se tornando desnecessário para o patrão neste período de bandeira vermelha. Lembrando que atualmente Curitiba está em bandeira laranja de restrições à covid-19.
Os dados de demissões exclusivamente para a classe dos garçons não são exatos, pois, em vários casos, a pessoa trabalha de maneira informal ou mesmo por eventos. Alexsandro de Oliveira, 38 anos, mais conhecido como Sid, é garçom desde 2006. Experiência não lhe falta, mas com a chegada do coronavírus, o rendimento mensal teve uma queda acentuada. Antes da pandemia, chegava a fazer no mínimo 20 eventos por mês como freelancer – o que rendia em média R$ 2.500.
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Com a doença e a proibição de festas, a bandeja e o traje branco ficaram de lado. “Eu sempre tive muito trabalho, mas depois da pandemia virou tudo. Cheguei a ficar 8 meses em casa sem trabalho e o que ajudou foi o auxílio do governo federal (R$600). Com a bandeira vermelha ficou mais complicado, pois não tem nada. Tenho feito em média 3 eventos”, disse o simpático Sid, pai de 4 filhos.
O sindicato que representa a categoria (Sindehotéis) imagina que desde março de 2020 ao menos 40 mil pessoas foram impactadas em Curitiba e região metropolitana. José Ademir Petri, presidente do Sindehotéis, relata que em cada restaurante que fecha na cidade, uma média de 4 garçons perdem o emprego. “Estamos muito preocupados com o destino da profissão e alguns estão desistindo. Cada lugar que fecha, são menos 4. Com o delivery ganhando força a cada decreto municipal, o garçom perde espaço. A pessoa que está no caixa atende o telefone, faz o pedido e entrega a comida”, disse Petri.
Segundo o representante sindical, compõem estes números as pessoas do setor gastronômico e hoteleiro como profissionais da limpeza, cozinha, quartos, recepção e outros. Recentemente uma tradicional churrascaria de Curitiba decidiu fechar por quatro meses e ainda culpou a prefeitura por isso, sem contar as várias que acabaram tendo que fechar por causa da pandemia e a crise econômica na cidade.
Os Impactos
Um dos locais que mais acolhe os garçons em Curitiba é restaurante Madalosso, no bairro gastronômico de Santa Felicidade. Acostumado a ter um volume grande de clientes nos fins de semana com grandes eventos, o local chegava a ter 160 garçons em seus salões.
Glaucia Lima, responsável pela Gestão de Clima, Admissões/ Treinamento e Desenvolvido do Grupo Madalosso, ajustes foram realizados no quadro de funcionários para adequar na reestruturação da empresa. “Anteriormente tínhamos uma alta demanda de eventos e essa média de contratações da equipe de atendimento varia de acordo com o número de convidados. Para um evento de médio porte tínhamos uma média de 30 contratações. Aos domingos, trabalhávamos com uma média de 160 garçons, algo distante da nossa realidade durante a pandemia”, disse Glaucia.
O grupo Madalosso preferiu não informar a quantidade de garçons demitidos, mas reforçou que vários profissionais seguem mantidos no emprego em outras formas de atendimento ao público. “Entendemos que o momento era oportuno para criar e apostar em novas possibilidades de negócio dentro do nosso nicho, afim de garantir as oportunidades e renda de todos os nossos profissionais que atuam conosco, sendo garçons como também a nossa equipe da operação (cozinha) e administrativos. Tivemos o cinema drive in, temos o container-express, e trouxemos o salão para o estacionamento, onde os clientes são atendidos pelos garçons e assim conseguimos minimizar o impacto do nosso capital humano”, comentou Glaucia.
Patrões no prejuízo
Ao passar por lugares tradicionais de Curitiba no atendimento ao público, percebe-se um estranho movimento. Balcões vazios e pouco trabalho por parte dos bares/restaurantes. No Bar Triângulo e Bar Mignon, na Rua XV, as mesas estão recolhidas e sem chance de tomar um chopp visualizando o movimento frenético das pessoas. De acordo com os proprietários e gerentes dos estabelecimentos, não ocorreram demissões dos garçons, mas o cenário é de pouca perspectiva e péssimo rendimento financeiro.
Outro lugar que fica localizado no Centro de Curitiba que atravessa dificuldades é Restaurante Dançante Pantera Negra, popularmente chamado de Gato Preto. Um cartaz colocado na porta de entrada informa que os garçons estão passando necessidade e que as autoridades estão tirando a dignidade do povo.
Manoel Alves, proprietário do Maneko´s Bar,tradicional ponto de encontro na Alameda Cabral com 43 anos de vivência no ramo, relata que tem 10 funcionários, mas que tem utilizado somente quatro no sistema take away. “ Temos três garçons, mas não compensa ter todos aqui. Estão em casa, e enquanto isso, estamos com um prejuízo muito grande e não irei recuperar tão cedo. A despesa é grande, e é preciso relaxar as medidas para a gente voltar a trabalhar. Estamos abrindo para dar satisfação ao cliente, pois pode render no futuro e não chegamos a 15% recebido do valor comparado ao presencial”, avisou Maneko.