Em meio à possibilidade de unir operações com a Gol, a Azul tem feito ajustes na frota e na oferta de assentos para melhorar a eficiência e preparar o terreno para os próximos passos da fusão. Isso tem refletido no fechamento de algumas bases que não estão com desempenho satisfatório. Só em 10 de março, a companhia vai deixar de voar para 15 cidades de nove estados brasileiros, todas do interior.
Em todos esses casos, a empresa alegou “aumento de custos operacionais causados pela crise global na cadeia de suprimentos, a alta do dólar e a disponibilidade de frota”. O diretor-executivo da Azul, John Rodgerson, falou recentemente ao G1 que não continuaria a voar “onde estou perdendo dinheiro.”
A principal métrica usada pela companhia para definir a suspensão desses destinos é o load factor, também conhecido como taxa de aproveitamento, que é calculado pela divisão dos assentos ocupados por passageiros pagantes pelo total de assentos oferecidos. Cada empresa tem seu limite.
Na média, em 2024, a Azul voou com 80,5% de load factor. Já na Azul Conecta, a empresa sub-regional da companhia, que opera aviões menores, a taxa foi de 51,9%. Abaixo, as cidades que deixarão de receber voos da Azul e a taxa de aproveitamento de cada uma em 2024, de acordo com dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac):
- Barreirinhas (MA) – 14,6% (Azul Conecta)
- Cabo Frio (RJ) – 73,2%
- Campos (RJ) – 59,5%
- Correia Pinto (SC) – 70,6%
- Cratéus (CE) – 21,9% (Azul Conecta)
- Iguatú (CE) – 11,6% (Azul Conecta)
- Jaguaruna (SC) – 76%
- Mossoró (RN) – 77,8%
- Parnaíba (PI) – 82,3%
- Ponta Grossa (PR) – 59,1%
- Rio Verde (GO) – 77,2%
- São Benedito (CE) – 21,3% (Azul Conecta)
- São Raimundo Nonato (PI) – 46,4%
- Sobral (CE) – 12,2% (Azul Conecta)
- Três Lagoas (MS) – 67,7%
Suspensão no Paraná abre discussão entre prefeitura e governo estadual
Entre as cidades atendidas pela Azul, Ponta Grossa (PR) tem o segundo pior desempenho — excetuando os destinos operados pela Azul Conecta. O anúncio da suspensão dos voos surpreendeu a cidade e mesmo o governo do estado, que oferece redução do ICMS sobre o querosene de aviação (QAV) nas bases operadas pela companhia no Paraná.
Apesar da surpresa, os dados de load factor vinham se deteriorando na cidade paranaense. Em 2021, a cidade teve o melhor desempenho (80,4%) e desde então veio caindo: 72,4% em 2022; 69,7% em 2023; e 59,1% em 2024. Ao longo do ano passado, a situação foi piorando, com taxas mensais inferiores a 50% no segundo semestre:
- Janeiro – 71,3%
- Fevereiro – 53,1%
- Março – 68,4%
- Abril – 56,3%
- Maio – 61%
- Junho – 61,6%
- Julho – 64,9%
- Agosto – 56,3%
- Setembro – 47,9%
- Outubro – 56,3%
- Novembro – 48,5%
- Dezembro – 57%
“A situação, nesse momento, é bastante crítica. Tentamos incessantemente segurar a suspensão de Ponta Grossa, mas, infelizmente, nosso time de malha não teve mais saída”. Foi dessa forma que a Azul justificou ao governo do estado a suspensão dos voos em Ponta Grossa.
Apesar da decisão de cunho comercial da companhia aérea, a suspensão de voos em Ponta Grossa abriu um embate entre prefeitura e governo do Paraná. Enquanto o município falou em falta de apoio estadual, o Palácio Iguaçu disse que a cidade conta com subsídio para a aviação e que deveria melhorar a infraestrutura do aeroporto Sant’Ana.
“A Azul não cancelou os voos por questões técnicas do aeroporto. Tentaram culpar a prefeitura com informações distorcidas”, declarou a secretária de Indústria, Comércio e Qualificação Profissional de Ponta Grossa, Faynara Merege.
“Infelizmente a política tem contaminado um debate que deveria ser estritamente técnico. Alguns tentam se promover sobre um problema que não enfrentaram antes”, acrescentou. Ela ainda afirmou não ter sido oficialmente convocada para uma reunião na Secretaria de Infraestrutura e Logística estadual para tratar sobre o assunto.
“O município tem que querer ser ajudado. Não é na força. É preciso entender que se trata de uma decisão de mercado”, rebateu o secretário estadual de Infraestrutura e Logística, Sandro Alex. “Ponta Grossa está com o subsídio ativo. Todos os municípios têm esse termo de redução do ICMS. A obrigação do estado está lá”, completou.
As diferenças dos dois lados, aliás, não são novas. Em novembro do ano passado, a prefeita reeleita Elizabeth Schmidt (União) cobrou recursos do governo de Ratinho Junior (PSD) para Ponta Grossa. A resposta do Palácio Iguaçu foi de que esses recursos nunca haviam sido solicitados.
“Tentamos incessantemente segurar a suspensão de Ponta Grossa, mas, infelizmente, nosso time de malha não teve mais saída.” Azul, em comunicado ao governo do Paraná
Ampliação do aeroporto de Ponta Grossa volta à pauta
A suspensão dos voos em Ponta Grossa reacendeu a necessidade de obras no aeroporto da cidade. Em 2022, a prefeitura realizou uma licitação para reformar e ampliar o terminal de passageiros, mas o assunto foi judicializado e as intervenções não foram feitas até hoje, apesar dos R$ 33 milhões do Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac) estarem garantidos. A prefeitura informou que as obras devem começar em breve, mas ainda sem uma data específica.
Mesmo assim, a necessidade da ampliação do aeroporto como um todo voltou à pauta. Com uma pista de 1.430 metros de comprimento e 30 metros de largura, o equipamento não tem capacidade para receber aviões maiores que os ATR 72, usados pela Azul, com capacidade para 72 passageiros. A ampliação da pista, porém, esbarra em algumas questões técnicas, como a alteração de traçado da linha férrea que passa ao lado do sítio aeroportuário.
Para discutir a possibilidade de ampliação, a Associação Comercial e Industrial de Ponta Grossa (ACIPG) firmou uma parceria com o governo estadual para a elaboração de estudos e projetos sobre o aeroporto. Estiveram presentes da reunião a presidente da associação, Giorgia Bochenek; o secretário estadual Sandro e o irmão dele, deputado estadual e ex-prefeito de Ponta Grossa, Marcelo Rangel (PSD) e hoje vice-líder do governador Ratinho Junior na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep).
A prefeitura de Ponta Grossa não participou da reunião, mas a secretária Faynara Merege afirmou que está “avaliando o documento” e que a prefeitura “está em parceria no que for necessário para tomar as decisões acerca do aeroporto.”

Saída da Azul acende alerta em outras cidades do Paraná
A suspensão de voos da Azul em Ponta Grossa vai reduzir para sete o número de cidades atendidas no Paraná. Ao mesmo tempo, a companhia vai ampliar a presença em Guarapuava a partir do mesmo 10 de março, com voos para Curitiba — hoje a cidade tem conexões diretas para Campinas.
O desempenho das cidades paranaenses, exceto Ponta Grossa, foi superior a 70% de taxa de aproveitamento em 2024, o que não significa que estão garantidas na malha de rotas da Azul — das 15 cidades que deixarão de receber voos da companhia, cinco apresentaram load factor superior a 70% no ano passado.
Abaixo, a taxa de aproveitamento dos voos da Azul no Paraná em 2024, segundo a Anac:
- Foz do Iguaçu – 83%
- Cascavel – 79,4%
- Maringá – 79,3%
- Curitiba – 78,3%
- Londrina – 78,3%
- Guarapuava – 72,1%
- Pato Branco – 71,3%
- Ponta Grossa – 59,1%
A principal aposta do governo do Paraná para não perder mais cidades é o termo assinado com a Azul que prevê a redução de ICMS sobre o querosene de aviação. “O governo entende como investimento. Nós reduzimos a arrecadação do ICMS, mas há um ganho no setor produtivo, de serviços, de turismo. É relevante o retorno”, comenta Sandro Alex.
É o subsídio também que sustenta os voos da sub-regional Azul Conecta no estado. Operados com aviões Cessna Grand Caravan 208, para nove passageiros, esses voos chegam a outras quatro cidades paranaenses: Guaíra, Telêmaco Borba, Umuarama e União da Vitória.
O programa Voe Paraná, feito em parceria com a Azul, começou em janeiro de 2022. No início, 11 cidades eram servidas, mas a companhia aérea ajustou a oferta devido ao baixo rendimento nos aeroportos de Cianorte, Arapongas, Campo Mourão, Apucarana, Francisco Beltrão, Cornélio Procópio e Paranavaí.
“O Voe Paraná está ativo, mas sabemos que para operar esse modelo é preciso subsídio. É assim que funciona”, complementa Sandro Alex.
Leia o conteúdo original na Gazeta do Povo.
