A obra de recuperação do Teatro do Paiol, que alterou as características originais do prédio, um antigo paiol de pólvora que foi transformado em espaço cultural em 1971, vem despertando muita polêmica e discussão sobre a preservação do patrimônio público. Entre os mais indignados com a nova “cara” do Paiol está o arquiteto Abrão Assad, responsável pelo projeto original do teatro, na primeira gestão de Jaime Lerner como prefeito de Curitiba. A novidade do caso é que, segundo Assad, é possível reverter a obra que descaracterizou o prédio histórico.
Assad conta que a obra foi a primeira de uma série de intervenções realizadas pela equipe de arquitetos e urbanistas encabeçada pelo então prefeito, que ao longo das décadas seguintes transformou Curitiba em um berço de soluções inovadoras replicadas por diversas outras cidades ao redor do planeta.
Até por esse caráter histórico, o arquiteto considera um grande erro essa intervenção que classifica como “grotesca” na fachada do prédio.
“O primeiro erro que eles cometeram foi não ter chamado o arquiteto responsável, que sou eu, pelo projeto original do teatro, que foi a primeira obra emblemática da primeira gestão do Jaime Lerner na prefeitura. Foi uma obra exemplar de reciclagem de um espaço e um marco para a cidade. Eu só soube dessa reforma porque fui procurado por alunos da UTFPR, que me convidaram para participar de uma live e contaram o que estava sendo feito”, conta Assad.
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Ao tomar conhecimento das alterações executadas na estrutura do Paiol, que descaracterizaram o que o arquiteto denomina como a “essência da construção”, Assad procurou os responsáveis pela condução das obras de revitalização, no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC) e na Fundação Cultural de Curitiba (FCC), para questionar o trabalho realizado.
“Vamos reverter esses enganos. Já conversei com o pessoal do IPPUC e da Fundação Cultural e nos próximos dias vamos definir a melhor forma de recuperar a identidade do Paiol. Eles reconheceram o engano dessa intervenção e estão dispostos a resgatar a essência do espaço. Na semana que vem eu vou fazer alguns testes lá para analisarmos o que poderá ser feito a partir de agora”, explica Assad, esperançoso em resgatar aquilo que ele considera o mais essencial do Paiol, que são as marcas do tempo.
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Foi exatamente essa intervenção na fachada do teatro o que mais desagradou o autor do projeto original do espaço, que rebate os argumentos de que a preservação da estrutura do Paiol só seria possível com a cobertura de argamassa que foi feita sobre o antigo reboco, conforme disse à Tribuna Leandro Nicoletti Gilioli, arquiteto responsável pela execução do projeto de restauro.
Reforma grotesca no Paiol
“Foi uma surpresa muito grande, especialmente pela forma grotesca com que os responsáveis pela obra descaracterizaram o Paiol, que perdeu o essencial, que era a pátina do tempo que marcava suas paredes. Lógico que quem fez o trabalho vai se defender falando que essa intervenção era necessária por questões estruturais e coisas do gênero, mas isso aí é bobagem. Existem várias maneiras de preservar a estrutura sem alterar as características do reboco original. Infelizmente o Paiol foi ‘envelopado’, mas vamos encontrar uma solução”, complementa Assad.
O arquiteto divulgou uma carta aberta à comunidade, em que resgata um pouco da história do Teatro do Paiol e propõe uma “cirurgia reparadora” para resgatar a fachada adulterada.
Confira a carta na íntegra:
Prezados! Sou autor do projeto de reciclagem do Teatro do Paiol (1971), contratado pelo IPPUC – primeira obra realizada na primeira gestão do prefeito Jaime Lerner.
Semana passada, professores e alunos da UTFPR me convidaram para participar de uma Live; assunto: “Restauro” do Teatro do Paiol – Estudo do Caso.
Soube então que o teatro passava por uma reforma.
Surpreso com a notícia e perplexo por não ter sido previamente chamado, consultado ou sequer informado pelos órgãos da prefeitura responsáveis pela preservação do nosso acervo, fui imediatamente verificar in loco a ocorrência.
Muito mais surpreso, indignado e desolado fiquei ao constatar o andamento de um desconcertante trabalho de reforma totalmente equivocado! – uma desastrosa, grotesca e irresponsável descaracterização da obra original.
Para entender o ocorrido, solicitei uma reunião com os órgãos responsáveis, que igualmente consternados admitiram a gravidade deste sinistro acontecimento.
Diante de tal embaraço, de forma proativa, propus uma solução remediável para o problema – uma espécie de “cirurgia reparadora” de emergência – ressignificando na essência a fisionomia original da edificação.
O Paiol desde sua origem passou por diversas adversidades, todas elas superadas. Infelizmente, quis o destino submetê-lo a mais uma.
Grave é o problema, porém mais grave ainda será se nada for feito.
Salve o Paiol.
Curitiba, dezembro de 2022.
Abrão Assad Arquiteto