Até 18 de dezembro, apesar de todas as restrições relacionadas à pandemia, 130 adoções de crianças de adolescentes haviam sido concretizadas na capital – número acima das 113 ocorridas em 2019, quando o número já tinha sido recorde. Além disso, até esta data, havia 45 crianças e adolescentes em estágio de convivência com aqueles que, ao que tudo indica, serão seus futuros pais (a taxa de sucesso do estágio é próxima dos 100%).
Também foram realizadas em 2020 75 reintegrações familiares – quando crianças e adolescentes voltam à família de origem, sendo monitoradas pela rede de proteção para garantia de seu bem-estar. Com isso, o total de meninas e meninos vivendo em acolhimento institucional em Curitiba, que era de 330 em de 6 de julho, caiu para 265.
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O juiz Fábio Ribeiro Brandão, da Vara da Infância e da Juventude e de Adoção da capital, atribui o bom desempenho, mesmo em um ano tão conturbado, a três fatores principais: ao fato de os processos na área da infância serem todos eletrônicos no Paraná; ao engajamento dos profissionais (incluindo não apenas integrantes do Judiciário, do Ministério Público do Paraná e da Defensoria Pública, mas todos que atuam em órgãos da rede de proteção, como, por exemplo, os conselhos tutelares); e algumas alterações nos processos que acabaram por acelerar as adoções. “Um exemplo é o estágio de convivência, período em que a criança ou adolescente fica com quem vai adotá-lo para a formação do vínculo. Com muita gente trabalhando em casa e tendo mais tempo para ficar junto da criança, o estágio tornou-se mais intenso e, com isso, foi possível ser mais curto
O promotor de Justiça Francisco Zanicotti, da 2ª Promotoria de Justiça da Criança e do Adolescente de Curitiba, credita os resultados aos investimentos feitos para estruturar a área. “Enquanto o Ministério Público do Paraná se esforça para cumprir o princípio da prioridade absoluta para a infância, mantendo recursos para ter três promotores de Justiça com equipes completas em atuação em Curitiba, o Poder Judiciário equipa a Vara da Infância da capital com um núcleo psicossocial muito robusto, com profissionais de alta qualificação e um cartório atendido com extrema dedicação e com perspectivas de crescimento em número de servidores.
Aliado a isso, temos a Defensoria Pública atuando com afinco. É claro que a vocação e as características pessoais de alguns atores do processo também fizeram diferença, mas creio que se pode afirmar que os resultados perdurarão de forma impessoal”, comenta o promotor. Além dele, atuam nos processos de adoção em Curitiba as promotoras Cristina Corso Ruaro e Fernanda Nagl Garcez, da 1ª e da 3ª Promotorias de Justiça da Criança e do Adolescente da capital.
Comprometimento e dedicação
Além dos investimentos, Zanicotti destaca como determinantes desse desempenho o comprometimento e a dedicação, durante o regime de trabalho remoto, dos profissionais do MPPR, do Judiciário e de todos os órgãos que fazem parte da rede de proteção. “A pandemia não impediu que conseguíssemos concretizar as adoções porque corremos para nos adaptar às restrições.
Já em março, as Promotorias de Justiça da Criança e do Adolescente de Curitiba expediram recomendação administrativa aos dez Conselhos Tutelares da cidade, criando regras que possibilitaram a manutenção dos atendimentos sem prejuízo da segurança. As audiências foram também retomadas rapidamente de forma virtual, com todos se esforçando para que fossem realizadas. O comissariado fez os contatos com as partes e seus advogados para viabilizar a participação nas audiências com a utilização dos próprios celulares. As unidades de acolhimento também tiveram que se adaptar para possibilitar as aproximações de maneira que não comprometesse o distanciamento social, mas foram bem-sucedidas nisso também.”
O magistrado Fábio Brandão concorda que o trabalho a distância foi um fator que impactou os resultados. Embora tenha se declarado antes um crítico do home-office, acabou admitindo que o modelo adotado trouxe vantagens. “Creio que muitas pessoas trabalharam mais em casa. O tempo gasto com os deslocamentos de casa para o fórum, que pra mim era cerca de uma hora, passou a ser aplicado no trabalho”, exemplifica.
A servidora Marilda Scalon Rodrigues, que há dez anos atua na área da infância no Ministério Público do Paraná, também considera que conseguiu produzir mais trabalhando em casa. “Eu moro em São José dos Pinhais e vou para o MP, em Curitiba, de ônibus. Gasto de três a quatro horas por dia no transporte coletivo, e pude aplicar esse tempo no trabalho, o que contribuiu para agilizar os processos nos quais atuei”, relata. Além disso, ela diz que as pessoas, de modo geral, ficaram mais disponíveis para o trabalho. “Antes, quando eu precisava resolver algo com o Tribunal de Justiça, tinha que esperar até o meio-dia, quando o expediente começa. Agora que estamos nos comunicando por meios digitais, esse contato é mais rápido, pois, quando há situações urgentes, posso enviar uma mensagem e em pouco tempo tenho um retorno.”
Três irmãos que ganharam nova família
Mas não são apenas os números que atestam os bons resultados de 2020. Desse período de pandemia, a equipe que atua nas adoções em Curitiba vai guardar nas suas mentes também as histórias de cada uma das crianças e adolescentes que, enfim, conseguiram uma nova família. Uma delas envolve três irmãos de 4, 9 e 12 anos.
No Brasil, não houve interessados em adotar o grupo, mas uma família da Itália se dispôs a conhecer as crianças e acabou por adotá-las, apesar de todas as dificuldades inerentes a um processo de adoção internacional e ao ano de pandemia, com muitas dificuldades para se viajar de um país para outro. “Eles vieram pra cá num momento extremamente delicado da pandemia. Mas, como queriam muito adotar as crianças, venceram as dificuldades, e hoje já estão todos juntos na Itália. É algo que sempre ficará na nossa memória”, declara o juiz Fábio Brandão.