Síndrome da acumulação compulsiva

Acumuladores: saiba como ajudar quem tem o transtorno e lidar com entulhos na vizinhança

Lixo em casa de acumulador
Entulhos e lixo encontrados no quintal de uma residência de Curitiba. Foto: Gerson klaina/Tribuna do Paraná

síndrome da acumulação compulsiva é uma transtorno mental conhecido por fazer a pessoa ter uma enorme dificuldade de se desfazer de objetos. Pode ser qualquer coisa, desde livros, revistas, brinquedos, garrafas pet e, em alguns casos, até animais domésticos. A síndrome faz parte do Manual de Diagnóstico e Estatística de Desordens Mentais (DSM-5) desde 2013.

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Em alguns casos – principalmente os que acabam chegando na mídia – o que se vê são imagens de casas ou terrenos completamente tomados por entulhos e até lixo. Para quem tem a doença, além do sofrimento psicológico há também o risco de acidentes, como incêndios e quedas. E também de doenças relacionadas à falta de limpeza por causa dos acúmulos.

Recentemente, a Tribuna noticiou casos de pessoas, em Curitiba, que possivelmente são acumuladores e que foram denunciados por vizinhos incomodados com a enorme quantidade de entulho armazenado. Mas será que as denúncias são melhor forma de lidar com a doença?

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O que leva a pessoa a ser acumuladora

Segundo a psicóloga e coordenadora do curso de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), professora Fabiana Thiele Escudero, há que se compreender que essa pessoa não tem culpa, precisa de acolhimento e está em sofrimento. Por característica deste transtorno, explica a psicóloga, os acumuladores não estão preocupados necessariamente com a organização, demonstram algum tipo de sofrimento e se colocam em risco ao acumular objetos diversos em cômodos da casa.

“O transtorno de acumulação pode ser desencadeado por diversos motivos, inclusive um trauma, como a morte de um ente querido ou pode começar lentamente e ir se agravando ao longo do tempo”, aponta a coordenadora.  

Há também, segundo os estudos a respeito da acumulação compulsiva, outros detalhes que são observados além de acumular objetos. A pessoa pode apresentar dificuldade para tomar decisões, também há uma busca pelo perfeccionismo e procrastinação de afazeres.

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“Não há uma causa única para a doença. Há o fator genético, mas a interferência externa também conta. O Transtorno tem início insidioso, ou seja, ele esta lá, mas começa a causar problemas mais para frente na vida. Porque é aí que a coisa toma proporção enorme, eu diria depois dos 30 anos”, explica a Fabiana Escudero.

Políticas públicas

A Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba (SMS) informa que o primeiro passo para ajudar um acumulador é entrar em contato com o serviço 156 da prefeitura, contando a situação. “Em alguns casos, é possível que não se trate de um acumulador, mas sim de catadores que realizam a reserva dos seus materiais recicláveis para uma venda futura. Essa avaliação inicial é fundamental, pois, se for isso, a prefeitura pedirá a limpeza do local ao proprietário”, explica André Luís Pasdiora, coordenador de Vigilância em Saúde Ambiental da SMS.

Porém, se o caso for verificado como sendo de um acumulador, o atendimento entra pela Rede de Atenção Psicossocial de Curitiba, numa linha de cuidado específico. “São casos muito particulares. Não há uma receita de bolo para resolver, até porquê, pode não ser a síndrome da acumulação, mas sim uma outra doença mental que está levando a pessoa a esse comportamento”, diz Pasdiora.

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Segundo a prefeitura, há todo um trabalho integrado e interdisciplinar, desde o apoio da Fundação de Ação Social, Secretaria do Meio Ambiente no caso de animais de estimação, até a entrada no sistema de saúde pelos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Nem mesmo o acesso à residência da pessoa, para uma eventual limpeza, é permitido sem uma ordem judicial. “O acolhimento e a criação de vínculo com alguém nessas condições ocorre de forma gradual, até que ela compreenda a situação em que vive e siga para um tratamento”, detalha Pasdiora.

O coordenador ainda destaca a importância da compreensão da sociedade em relação ao tema. “Essas pessoas perdem os vínculos sociais. Geralmente, pela sua condição, elas se afastam da família e amigos e ficam sozinhas. Não sabem que estão fazendo algum mal para si mesmas ou para o outro. Embora existam reclamações da vizinhança para o descarte desses objetos, não funcionará como solução simplesmente jogar tudo fora. Isso causará um sofrimento maior e, certamente, a pessoa voltará a acumular tudo de novo”, destaca.

Acumuladores em Curitiba

Em 2014, cerca de um ano depois do transtorno da acumulação compulsiva entrar na descrição do DSM-5, a prefeitura de Curitiba e a UFPR realizaram um trabalho multidisciplinar de pesquisa para saber o número de pessoas atingidas pela doença na capital. Na época, eram cerca de 200 acumuladores, guardando não só objetos, mas também, animais domésticos.

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Atualmente, conforme a prefeitura, o levantamento não é mais realizado porque o serviço de atendimento à população vulnerável já está incorporado pela administração pública. Na época, foi um projeto inicial por conta da revisão do DSM-5.

Também chegou a circular na Câmara Municipal de Curitiba (CMC) uma proposta de lei da ex-vereadora Katia Dittrich que implementaria a “Política Municipal de Atenção às Pessoas Portadoras do Transtorno de Acumulação Compulsivo”. Segundo a CMC, o projeto foi arquivado com o fim do mandato da vereadora, conforme determina a lei.

Como a doença se desenvolve

A síndrome da acumulação compulsiva tem muita relação com o fator do estresse externo. Como sintoma, além de juntar objetos com ou sem valor real, a pessoa também vai se isolando do convívio social, principalmente pelas críticas. “Quem sofre de transtorno de acumulação necessita de apoio e tratamento, como terapia e medicação. De preferência, antes que se chegue a um ponto extremo de acumulação. Se algum vizinho notar esse comportamento, o mais indicado é avisar familiares, amigos ou pessoas próximas para que procurem ajuda profissional. Sozinhos, é muito difícil que os familiares consigam dar o suporte que a pessoa precisa”, ressalta a Fabiana Escudero.

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Ela aponta que, dificilmente, o doente vai procurar por um tratamento. “É preciso muito carinho, acolhimento e paciência para que a pessoa siga em frente. O que se tem percebido é que, sem tratamento os sintomas podem persistir por toda a vida, mas existem diversas estratégias de tratamento, que em geral incluem a psicoterapia e a terapia medicamentosa. O psicólogo irá busca uma mudança de comportamento junto ao paciente, para que ele perceba como está agindo e possa melhorar”, completa.

Ainda conforme a Fabiana Escudero, nunca se deve confrontar a pessoa, simplesmente fazer uma limpeza da casa, jogando tudo fora, pois não vai resolver. “A pessoa tem dificuldade de se livrar de objetos. Guarda garrafas pet porque pode precisar delas algum dia, acumula revistas velhas. Ela acha que está fazendo algo necessário e que faz sentido para ela, mas na verdade está se prejudicando”, destaca.

Ela também aponta que é preciso diferenciar a acumulação compulsiva do colecionismo e da acumulação como resultado do transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). “O colecionador de carrinhos, de figurinhas, de guitarras, costuma organizar estes objetos em forma de coleção. Ele tem vida social, amigos, profissão. E, principalmente, não demonstra sofrimento”, ressalta a psicóloga.

A diferença pode ser sutil para um diagnóstico, mas é preciso que o profissional siga o protocolo de saúde para determinar se o caso é de transtorno de acúmulo descartando outras doenças e causas. “No caso do TOC, o paciente sente a necessidade de guardar um objeto por medo de que algo aconteça. Um acidente, uma morte, caso ele não cuide daquilo”, diz a Fabiana Escudero.

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A psicóloga ainda explica que problemas mentais também estão relacionados com os casos de acumulação. Por isso, o cuidado com o diagnóstico. Demência cerebral, esquizofrenia, são doenças que podem provocar este comportamento. “São situações diferentes. Nesses casos, a pessoa ainda tem o agravante do descuido com a higiene. Diferente da pessoa que sofre do transtorno de acúmulo, é comum que se veja restos de comida pela casa, lixo. Mas se você fala que vai limpar e jogar tudo fora, a pessoa não liga, ela não tem um apreço por aquilo. Ao contrário do acumulador compulsivo, que, esse sim, se importa com os seus objetos e sofre com um possível descarte”, detalha.

A Fabiana diz que, quase sempre, é quando se chega ao ponto extremo de acumulação que o caso acaba indo parar nas autoridades e na mídia. “É comum que isso ocorra. Outras pessoas notam um acúmulo extremo de um vizinho e acabam chamando a polícia ou a prefeitura. São as manchetes que vemos no jornal. Tem se notado que é difícil haver uma compreensão da sociedade, quando se chega nesse ponto”, explica.

Por outro lado, para finalizar os apontamentos, a pessoa que apresenta sinais de acumulação compulsiva nem sempre chega no extremo. Também não há diferenciação de classe social, ou seja, a condição financeira não é fator de corte para a doença desencadear. O transtorno de acumulação não está associado a sexo e nem classe social, podendo acometer qualquer tipo de população.

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